Aceder e publicar o conteúdo que se quer na Internet, sem preocupações de ter autoridades governamentais à espreita, tornou-se mais difícil pelo sétimo ano consecutivo. Há novas leis que autorizam a monitorização do conteúdo e dezenas de países que utilizam “exércitos de influenciadores” para vigiar o debate público e espalhar a versão oficial dos respectivos governos nas redes sociais.
A informação surge no relatório de 2017 da Freedom House, citado pelo Público, uma organização não governamental com sede em Washington, EUA, que avalia anualmente o estado da Internet. A China volta a ganhar o título de “país com a pior liberdade online”, pelo terceiro ano consecutivo, acima de países como o Irão e a Síria. Os ziganwu (jovens voluntários do Partido Comunista Chinês) são uma das estratégias chinesa para transformar “os teclados em armas” e “defender a pátria online”.
Este ano, porém, despontaram intervenientes de mais nacionalidades. “Foram encontrados comentadores pró-governamentais em 30 dos 65 países que analisámos neste estudo”, lê-se no relatório da ONG. São mais sete do que em 2016. “Nesses países, há relatos credíveis de que o Governo emprega pessoas, ou paga a empreiteiros para manipular discussões online sem anunciar a natureza do conteúdo.”
As conclusões são baseadas no trabalho de mais de 80 investigadores em todo o mundo, que avaliaram o estado da Internet nos países em estudo com base em observação, novas leis, notícias publicadas e entrevistas realizadas entre 1 de Junho de 2016 e 31 de Maio de 2017. Os países foram escolhidos como “uma amostra representativa dos diferentes tipos de sociedade e ambientes”. Cabo Verde não entra no documento, aliás, dentro da CPLP só o Brasil e Angola são referenciados e ambos os países são considerados “em parte livres”.
Os objectivos dos novos “exércitos de influenciadores” ou “paramilitares digitais” são criar a ideia de que existe mais apoio aos governos e afastar as conversas online de temas controversos. “[Isto] põe em causa a capacidade de os cidadãos escolherem os seus líderes baseando-se em notícias factuais e debates genuínos”, criticam os investigadores. Embora alguns governos – como a Rússia – tenham tentado utilizar esta estratégia para influenciar as eleições de outros países, na maioria dos casos o objectivo é controlar o “poder no interior das fronteiras”.
A influência governamental online, porém, vai muito além destes “exércitos”. Dos 65 países avaliados pela Freedom House, apenas sete (Austrália, Canadá, Colômbia, Estónia, Islândia, Japão e África do Sul) não registaram um aumento das restrições online. “Os governos em todo o mundo têm aumentado dramaticamente os seus esforços para manipular a comunicação nas redes sociais”, lê-se nas conclusões do relatório. “Os regimes da Rússia e da China foram pioneiros neste tipo de estratégias furtivas que se têm tornado globais.” Para os investigadores, é uma ameaça “à noção da Internet como uma tecnologia libertadora.”
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 835 de 29 de Novembro de 2017.