Multas por pagar, videojogos preferidos, afirmações sobre o governo, são algumas das questões que vão influenciar a pontuação dos cidadãos, num sistema de classificação que o governo está a criar. A pontuação, avança o jornal Público, vai influenciar desde o acesso ao emprego, até à visibilidade dos perfis em aplicações de encontro. Grande parte dos dados pessoais avaliados são aqueles que os cidadãos entregam às aplicações móveis.
A nota vai subindo ou descendo conforme o comportamento e a classificação, explica o jornal português, é consultável a qualquer momento no telemóvel.
Além do emprego (a nota determina se é contratado por uma empresa) e presença nos sites, essa pontuação estipula se pode pedir um empréstimo, ou ainda se pode viajar em primeira classe num comboio. “Se for um bom cidadão, terá a vida facilitada. Se se portar mal, transformar-se-á num pária”, resume o Público.
Parece um cenário de ficção científica ao estilo Big Brother, mas a China está de desde 2014 a desenvolver este “sistema de crédito social”, conforme designado pelo Conselho de Estado chinês. Até 2020, está previsto que estejam agregados vários sistemas de classificação de cidadãos que já existem a nível regional, bem como os rankings de crédito financeiro.
Dados que os cidadãos cederam voluntariamente, nos últimos anos, a aplicações móveis análogas às ferramentas do Google e afins são a principal base do sistema.
Os dados bancários, as dívidas e os hábitos de consumo de utilizadores de aplicações como a Alipay (também disponível em Cabo Verde) são variáveis de sistemas de medição de reputação como o Zhima Credit, que classificam a fiabilidade de uma pessoa de 350 a 950 pontos. Mas o tempo gasto em videojogos também conta. Se gastar demasiado, perde pontos. Pelo contrário, se comprar fraldas – que é visto como um indício de responsabilidade, ganha.
De acordo com a Wired, citada pelo Público, empresas como a Alibaba (dona do Alipay) e a Tencent negam oficialmente que estejam a ceder estes seus dados ao Governo chinês. No entanto, Pequim tem tentado exercer um controlo cada vez maior sobre o sector tecnológico privado do país e há um historial de colaboração dessas empresas com o Estado no desenvolvimento de ferramentas de controlo político. Além disso, há magnatas da área que têm assento em órgãos consultivos e de regulação que se encontram sob a direcção do Partido Comunista, como a Sociedade Chinesa para a Internet.
Há, entretanto, já várias histórias de cidadãos que provam de pontos de contacto entre o Estado e os actuais sistemas privados de reputação. Cidadãos que, ou por terem falado mal do governo, ou por terem cometido alguma infracção ou crime – ou até por alguém na sua família o ter feito, acabam na “lista negra” e vêm a sua vida dificultada em várias dimensões sociais e económicas.
O Público cita Rachel Botsman, autora de um livro recentemente publicado sobre os sistemas chineses de classificação social, para quem o que está em causa é um mecanismo omnipresente de autoritarismo, que não só castiga como dissuade a maioria dos cidadãos de fazerem ou expressarem algo desfavorável a um regime. E é também um alerta sobre os riscos que se correm ao entregar voluntariamente dados pessoais a serviços privados: “Estamos a aproximar-nos do sistema chinês, mesmo que não o saibamos”, diz Botsman.