A RFI notícia que foram centenas de cidadãos argentinos a tomar parte no acto de renegar a religião católica como resposta à decisão do senado, há cerca de duas semanas, de manter a lei que penaliza a prática de Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG). A apostasia colectiva teve lugar na capital argentina, Buenos Aires, e os manifestantes tinham também, como objectivo exigir o cumprimento da constituição do país que declara a Argentina um Estado laico.
A apostasia foi feita através do preenchimento de um formulário exigindo a exclusão do individuo da Igreja Católica, com cópia da fotografia do Bilhete de Identidade e outra do documento que atesta o baptismo da pessoa pela Igreja, entregue depois aos organizadores do acto, a Coalizão Argentina por um Estado Laico (CAEL).
"O resultado da votação gerou muita revolta. A apostasia é um gesto político forte, uma manifestação de nossa oposição à ingerência permanente da Igreja nos debates da sociedade", disse Julieta Arosteguy, integrante da Cael, à RFI.
"Faz dez anos que lutamos pela separação da Igreja e do Estado. Mas é a primeira vez que eu vejo tantas pessoas prontas a renunciar coletivamente à fé católica", cita aquele órgão um dos membros da Coalizão, César Rosenstein, que se manifestou surpreendido com a adesão que a iniciativa teve.
A Cael encaminhará os pedidos de apostasia à conferência episcopal de Buenos Aires na sexta-feira, dia 24. Rosenstein explica o que após esse acto de renúncia a Igreja não poderá mais manter nas suas estatísticas esses cidadãos como católicos, sendo obrigada a modificar os registos paroquiais, assinalando os requerentes como apóstatas, embora muitos preferissem simplesmente que os nomes fossem retirados dos registos.
"Baptizaram-me quando eu era bebê. Eu não tinha evidentemente a possibilidade de me opor. Fiz todos os meus estudos em uma escola católica e não me reconheço nesses ensinos que considero nefastos. Recuso-me a fazer parte desta instituição e, sobretudo, recuso que a Igreja aja em meu nome!", manifestou uma das renunciantes que participava do acto.
Fiéis valem dinheiro
Conforme a RFI, a Igreja Católica argentina afirma possuir 90% de fiéis quando pesquisas independentes mostram que são na verdade 76% da população do país. Pela grande quantidade de seguidores registada, a Igreja recebe subsídio anual do Estado no valor de 176 milhões de pesos (à volta de 567.800.000 ECV)
O país natal do papa Francisco, identifica-se Estado laico mesmo quando traz na sua Constituição um artigo que diz que o governo “apoia o culto católico apostólico romano”. A mesma Constituição estabelece como uma possibilidade de aborto apenas os casos de gravidezes resultantes de violações sexuais ou que periguem a saúde da mulher. Ainda assim um milhão de argentinas, por ano, recorrem ao aborto ilegal o que resulta em muitas mortes de mulheres que tentam por fim a gravidezes indesejadas.
Há cerca de duas semanas os senadores do país, maioritariamente homens, votaram contra – por 38 votos vs. 31 – a legalização da IVG dentro do intervalo de tempo medicamente aceitável o que provocou a revolta de milhares de activistas.