A problemática da migração clandestina no contexto da União Europeia e suas implicações humanitárias

PorExpresso das Ilhas,1 jun 2015 15:53

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Definição. Migração inter­nacional é um fenómeno global que afeta cerca de 150 milhões de pessoas. Os fluxos, as con­sequências e a complexidade aumentam de dia para dia. Hoje, todos os países são ao mesmo tempo de origem, receção e trânsito de migrantes interna­cionais. Os padrões tradicionais são constantemente alterados pelos novos fluxos causados por mudanças nas condições económicas, demográficas, po­líticas e sociais. Se repararmos bem, veremos que a alteração do perfil dos migrantes interna­cionais modifica as economias e as sociedades na origem e no destino.

Imigração clandestina ou ilegal. A imigração clandestina ou ilegal é aquela que se refere à migração para além das fron­teiras nacionais com violação de leis de imigração do país de des­tino. Assim sendo, um migrante ilegal é tanto um estrangeiro que atravessou ilegalmente uma fronteira política por terra, ar ou mar, quanto um estrangeiro que tenha entrado legalmente num país, mas permaneceu além da data autorizada pelo visto. Como se sabe, a imigração clandestina tem implicações na economia, bem-estar social, educação, saúde e realização dos direitos humanos. Entre as causas da migração ilegal estão a guerra civil e a repressão de natureza religiosa e étnica.

Assistência humanitá­ria. Outro conceito pertinente no âmbito da celebração do Dia de África é o de ajuda ou assistência humanitária. Um e outro termo distinguem-se da ajuda para o desenvolvimento (APD), que se preocupa com os fatores de natureza socioeco­nómica para a transformação da sociedade. O objetivo social da ajuda humanitária é salvar vidas, aliviar o sofrimento, de­fendendo a dignidade humana. As consequências humanitárias das tentativas desesperadas de atravessar o Mediterrâneo (um muro deitado, na expressão de Cristóvão Buarque) são graves e se nada acontecer de imediato, prevê-se que o número de mor­tes possa atingir os três mil ao longo de 2015.

Valorizar o diálogo e a ação conjunta. Mas que fazem de grande e conjuntamente a União Africana e a União Euro­peia? Reúnem-se, analisam os elementos da crise financeira e do desemprego, criam me­canismos de diálogo. Faltam a identificação das causas do desequilíbrio estrutural e um plano de ação consistente e de longo prazo. O desastre do Mediterrâneo exige análise global e decisão urgente. Global porque a decisão política deverá envolver vários protagonistas: A União Africana e a União Europeia, cada um dos Estados africanos, do Médio Oriente e europeus, a ONU, os EUA, a Turquia, etc.

Quadro da Cooperação África - Europa. Com o cons­tante aumento da mobilidade, a crescente complexidade do fenómeno migratório e o seu impacto na vida das nações, estranha-se que as migrações ainda não sejam uma prioridade das organizações internacio­nais, nem da chamada Estra­tégia Comum da Cooperação África- Europa (JAES), criada em Lisboa, 2007, nem sequer do Acordo de Cotonou (ACP-EU). Quer os governos queiram, quer não, os migrantes internacio­nais tendem a procurar as zonas de atração (EUA, UE e Japão) e a deixar para trás as zonas de rejeição (América Latina, África, Médio Oriente e Ásia). É de notar que cerca de 60% dos migrantes internacionais deslocam-se entre os países do hemisfério sul.

A questão de fundo é política, ética e económica. Ir ao fundo da questão quer dizer que tanto a UA quanto a UE terão de aceitar que uma solução duradoura implicará a Economia e a Ética. No aspeto económico, há que ter em conta que a força do trabalho procura sempre o capital e vice-versa até um ponto de equilíbrio favorável aos migrantes, aos membros da EU e às famílias dos países de origem. Por outro lado, a corrupção, a violência, a perseguição e a miséria são o resultado da cumplicidade ne­gativa entre políticos de ambas as margens do “muro deitado”.

Será possível alcançar a transparência? A resposta é sim se houver cumplicidade positiva entre partidos, movi­mentos sociais e pessoas dispos­tos a lutar por valores e causas associadas à participação, liber­dade e justiça. Por outro lado, a ação contra os traficantes é um desafio à prova do fogo da honestidade. Sim, sei que isto parece ingenuidade, mas acre­dito na simplicidade contra a arrogância e no diálogo para construir a paz e a energia para o desenvolvimento.

As intervenções milita­res têm de ser submetidas à liderança política. Qual­quer análise depois dos factos confirma que as decisões e as intervenções militares na So­mália, no Iraque, na Líbia, na Síria e outros países não deram os resultados esperados, prova­velmente porque faltaram a con­fiança e o diálogo necessários. A assistência humanitária, o combate eficaz aos traficantes e a revisão da estratégia da coope­ração entre a África e a Europa exigem mudança de atitudes. É neste ponto é que perguntamos o que Cabo Verde poderá fazer? A eficácia do “Estado funcional” não é aquela do tempo da guer­ra fria, mas a credibilidade e a humildade ainda compensam. Neste sentido, se reforçarmos, com convicção, o cumprimento dos compromissos nacionais e internacionais, o nosso país continuará a desempenhar um papel positivo. É verdade que Cabo Verde tem relações de cooperação e platónicas com a União Europeia. A cooperação ganha corpo e financiamento no quadro geral do Acordo de Co­tonou e luta por uma estrutura de apoio em Bruxelas e por um orçamento plurianual. Por isso, essas relações são especiais e esperam ambiente mais favorá­vel e mantêm o sonho com dias melhores.

O proposto sistema de quotas de imigrantes legais vingará? Será que o sistema de quotas nacionais vai permitir a revisão das políticas de imigra­ção e tornar mais eficaz o con­trolo das fronteiras europeias? Não é evidente que conseguirá a aprovação unânime, mas é um objetivo pelo qual valerá a pena batalhar, mesmo oferecendo contrapartidas razoáveis aos membros da UE mais reticen­tes. Todavia, uma política de quotas não chega. Haverá que rever toda a relação assimétrica entre as duas regiões, incluindo as migrações no primeiro plano.

Homenagem aos naufra­gados. Com coragem política para vencer a descrença e os obs­táculos mais ou menos inconfes­sáveis, a África e a Europa têm na crise profunda que as assola a oportunidade para reverem e melhorarem as suas relações de longo prazo. Esse esforço utiliza­rá, com certeza, as memórias dos naufragados transformadas em ponte de dois sentidos ao serviço da Humanidade.

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Autoria:Expresso das Ilhas,1 jun 2015 15:53

Editado porExpresso das Ilhas  em  31 dez 1969 23:00

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