A coisa é verdadeiramente delirante, mas tem adeptos de peso na atmosfera intelectual nacional. De Aquilino Varela a Manuel Faustino, sendo este último, refira-se, o actual responsável da Casa Civil da Presidência da República, desta República democrática, preceitua a Constituição de 1992, ancorada na dignidade da pessoa humana e nos valores da justiça e liberdade.
Por aí, fica inteiramente demonstrado o arcaísmo da nossa cultura política e a imensa perigosidade de certas figuras, que na verdade nunca fizeram o necessário “up-grade”, antes mantendo, no fundo da alma, a velha canga revolucionária e o seu potencial destrutivo e liberticida, como é por demais evidente.
Aquando da vinda de Francisco Louçã, o radical trotskista do Bloco de Esquerda, em Novembro de 2017, fiz-lhes ver que o comunismo marxista não tem nada de positivo e que é, apenas, e muito pelo contrário, uma utopia totalitária assassina, responsável por mais de 100 milhões de mortos – em tempos de paz – no século XX, condenando, de permeio, nações inteiras à mais terrível miséria e ditadura política.
Alguns fantoches ainda torceram o nariz, mas foram incapazes de contestar/derrubar os meus argumentos, lastreados em prova irrefutável.
O padrão é universal e não comporta, de resto, nenhuma excepção. Foi e continua a ser assim em todo o lado: União Soviética, Albânia, Cuba de Fidel Castro, Vietname, Chile de Allende, China de Mao Tsé-Tung, Venezuela de Chavez e Maduro, Coreia do Norte, Etiópia de Mengistu, etc., etc..
O comunismo é, pois, bem vista a História, uma grave doença de alma, inimigo inconteste da humanidade e do progresso dos povos. Nunca deu certo…em parte alguma.
Contudo, a “inteligência” pátria insiste, calorosamente, no seu renascimento. E investe, aliás, muitos recursos neste sentido.
Agora, depois do fracasso de Novembro passado, planeiam organizar mais uma conferência, com três convidados especiais: Manuel Faustino, Odair Varela e Garcia Pereira, ex-militante do MRPP.
O objectivo, dizem, é celebrar o nascimento de Karl Marx. Os 200 anos de Marx, esse apóstolo do bem, no dia 5 de Maio de 2018.
Como a esperteza humana não tem limites, a malta inventou agora um novo guião, catita e mui interessante: o comunismo é bom, por natureza; Marx é um grande pensador; o azar é que, de vez em quando, surge um Estaline (ou outro ditadorzeco qualquer, caramba!) só para estragar a bela festa ideológica, e lá comete uns “atropelos” sem necessidade, uns deslizes, os quais, no entanto, é bom que se diga, não mancham, jamais, a “grandeza” do ideal utópico. Com a sua “bondade” cintilante.
Parece anedota, mas é esse, lamento muito, o fio condutor do dr Manuel Faustino e companhia limitada. Essa gente acredita, ainda, nessa narrativa alarve e desajeitada. Pensam dessa forma.
Diz o chefe da Casa Civil da PR o seguinte, acerca da revolução bolchevique de 1917: “Por um lado, porque permitiu que se tivesse colocado na ordem do dia questões centrais que afectam a humanidade desde sempre, como a questão da justiça social, a questão da função do Estado, a forma como se admite ser possível organizar a sociedade. É a revolução em si, que trouxe à luz do dia essas preocupações. Foi possível lutar por determinados ideais, que num contexto diferente continuam vivos, como a utopia da igualdade de oportunidades, a utopia de um Estado que, de facto, possa defender os mais fracos e dar voz aos que têm mais dificuldades” (sic).
Incrível. Trata-se de um festival de mentiras e incorrecções históricas. A Rússia comunista não trouxe nenhuma igualdade de oportunidades nem introduziu, tampouco, a “questão social” no universo moral. Pelo contrário (e leia-se, sobre isto, Alexandre Soljenitsyne ou, entre tantas outras obras científicas de valor, o monumental O Livro Negro do Comunismo, editado por Stéphane Courtois et al.), a revolução russa produziu muita miséria, fome em massa, matança indiscriminada de opositores, atraso social, medo, terror, polícia política, ditadura cruel, tribunais revolucionários e arbitrários (lembremo-nos dos célebres “julgamentos de Moscovo”, essa pantomima incomparável), tendo, ainda, a suprema habilidade de reintroduzir o trabalho escravo em pleno século XX!
A utopia, como um rio de águas impuras, desaguou numa triste distopia.
Temos de dizer isto em voz alta e claramente: essa gente, sob a capa de um “humanismo criminoso” (A. Comte-Sponville), defende a filosofia do genocídio e do extermínio das liberdades. O que constitui um terrível ataque ao próprio Estado de direito e à sua fundante axiologia, como é evidente.
Defendem, pois, uma coisa nojenta, desumana, grotesca, monstruosa e desprezível. Ninguém, no seu perfeito juízo, ousa defender Hitler e o nazismo, mas o pessoal acha que é giro glorificar o comunismo marxista, que é, historicamente, muito pior.
A utopia marxista é criminosa desde o início, e é isso que as cabecinhas pensantes têm de compreender.
O marxismo parte de uma noção errada da Natureza Humana (vd., por ex., a magnífica encíclica de João Paulo II, Centésimo Ano, de 1991), desprezando, por completo, a Moral, a Justiça e o Direito. É por isso, e não por mero ou fortuito “acaso”, que produz sempre o Terror, a desorganização social e política e os pelotões de fuzilamento.
Atenção. Não existe um marxismo “bom” no início e um outro mau…no fim. Isso é pura charlatanice. Truculência verbal.
Karl Marx foi, de resto, uma criatura horrível, praticava cultos satânicos, falsificava dados documentais e detestava a liberdade individual (no entanto, quando foi escorraçado do continente europeu, procurou refúgio no país mais livre e “burguês” de então, a Inglaterra, onde escreveu, tranquilamente, boa parte da sua obra).
O marxismo é uma unidade; incindível. Num artigo memorável e de leitura absolutamente obrigatória (Devotos de um vigarista, in http://www.olavodecarvalho.org/devotos-de-um-vigar...), o filósofo Olavo de Carvalho explica-nos a vacuidade dessa gente e a sua, apesar de tudo, imensa ignorância:
“A Folha de S. Paulo perguntou a quatro dos seus mais típicos mentores por que é ainda importante ler Karl Marx. Nenhum deles deu a resposta certa: porque ninguém pode ignorar, sem grave risco, as idéias que mataram mais seres humanos do que todos os terremotos, furacões, epidemias e desastres aéreos do último século, mais duas guerras mundiais. Infringindo a regra elementar do próprio Karl Marx, de que a verdadeira substância de uma idéia é a sua prática e não a sua mera formulação conceitual, três deles mostraram enxergar o marxismo como pura teoria, separada da ação que exerceu no mundo, e incorreram assim no delito de ‘formalismo burguês’, o mais abominável para um cérebro marxista. Eu não tomaria aulas de marxismo com esses sujeitos nem se eles me pagassem”.
No dia 5 de Maio próximo, os três mosqueteiros do marxismo de província, contorcendo deliciosamente, vão tentar, na livraria Pedro Cardoso, vender essa velharia ridícula a uma plateia desinformada e crédula nas capacidades milagrosas e “benéficas” do marxismo no séc. XXI.
“Porca miséria”, diria o notável guru totalitário dessa gente!
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 833 de 04 de Abril de 2018.