Deixemos o Conselho de Administração dos TACV trabalhar na serenidade

PorVictor Fidalgo,23 ago 2021 7:45

Economista e acionista dos TACV
Economista e acionista dos TACV

​No passado dia 12 do corrente, após 3 tentativas falhadas, os acionistas dos TACV finalmente puderam reunir-se e eleger os novos órgãos sociais, o que augura uma nova etapa na vida da empresa, com vista a prepará-la para cumprir a sua missão que é ser um dos agentes da conetividade internacional de Cabo Verde.

A primeira premissa para que os acionistas dos TACV pudessem reunir-se em Assembleia Geral, foi sem dúvida a saída “forçada” da Loftleidir. O Governo, repito, fez muito bem, numa decisão corajosa e patriótica, em resgatar as ações que tinham sido vendidas à Loftleidir, em Março de 2019.

A segunda premissa que facilitou tanto a realização da AG como as decisões tomadas, foi o espírito de responsabilidade e abertura ao diálogo mostrado pelo governo que apesar de deter 90% das ações, quis implicar os acionistas privados na construção consensual das propostas levadas à AG e votadas por unanimidade.

A terceira premissa, foi a capacidade dos acionistas de resistir a pressões de todo o tipo e definir critérios sólidos na escolha dos membros dos órgãos sociais, particularmente do Conselho de Administração. Não será exagero dizer que havia mais de 30 candidatos, a todos os postos, reais ou fictícios. Necessários ou inúteis.

Portanto, com base nas premissas atrás enumeradas, foram eleitos os órgãos sociais, aos quais auguramos os melhores sucessos. Infelizmente nem toda a gente partilha desta esperança positiva. Alguns lançaram e continuam a lançar previsões negativas para não dizer desastrosas, visando particularmente a Presidente do Conselho de Administração, com o argumento da sua falta de experiência na indústria de aviação. A pergunta que ponho é: quando os TACV tiveram um PCA com essa suposta experiência, logo do início? Talvez nunca ou apenas uma vez. Lembramos aos críticos que não se trata de uma gestão pessoalizada mais sim colectiva, onde o PCA é um primus inter pares, independentemente dos poderes específicos que os estatutos lhe atribuem. O importante é que a equipa tenha todas as valências necessárias e neste caso, os acionistas tiveram o cuidado necessário.

Vejamos o quadro abaixo com o histórico dos PCA dos TACV:

HISTÓRICO DOS PCA’s DOS TACV
PERÍODO NOMES FORMAÇÃO EXPERIÊNCIA NA AVIAÇÃO
1991-2000 Alfredo Carvalho Gestão de empresas Nenhuma
2000-2001 Adalberto Silva Economista Nenhuma
2001-2003 João Ramos Engenheiro Civil Nenhuma
2003-2006 João Higino Economista Nenhuma
2006-2008 Gilles Filiatreault Gestor Sim
2008-2012 António Neves Economista Nenhuma
2012-2016 João Pereira da Silva Engenheiro Agrónomo Nenhuma
2016-2019 José Luis Sá Nogueira Economista Nenhuma
2019-2021 Bjorgolfur Johannsson Gestor Sim
2021- Sara Pires Gestora Nenhuma

Da leitura do quadro vemos que durante os anos 90, sendo os TACV apenas uma empresa, tinha como Director Geral, o Dr. Alfredo Carvalho que revolucionou a empresa e a lançou, com determinação, no mercado internacional, com foco nos nichos da comunidade e do turismo. Infelizmente, ingerência política inadequada e inapropriada, levou-o a abandonar o cargo, em 2000. Com a transformação dos TACV em Sociedade Anónima, tivemos como primeiro PCA o Dr. Adalberto Silva, no período 2000-2001. Não teve tempo para mostrar trabalho. Com a mudança do Governo, após as eleições de 14 de Janeiro de 2001, o Eng. Civil João Ramos foi nomeado PCA. Em 2003, foi substituído pelo Dr. João Higino do Rosário que exerceu as funções durante 3 anos, tendo desenvolvido alguns esforços para relançar a empresa. Entretanto, em 2006, no quadro de um projecto do Banco Mundial, veio aparentemente um gestor que não conseguiu continuar e menos ainda melhorar o trabalho da equipa precedente, e teve que ser dispensado antes do tempo previsto. A partir dessa altura, as nomeações passaram a ser fundamentalmente políticas, até 2019, quando a empresa foi entregue à gestão dos islandeses. De notar que desde Setembro de 2017, os islandeses estavam a prestar assistência técnica aos TACV na gestão, o que levou a perdas astronómicas. Por isso, é de toda a justiça que demos à Dra Sara Pires e a sua equipa, o tempo necessário, para com tranquilidade e serenidade encontrarem os caminhos de refundação dos TACV:

E não poderia deixar passar esta oportunidade sem partilhar com os leitores a minha visão sobre o futuro dos TACV.

Em que bases se deve proceder a reforma para o renascimento dos TACV? Enquanto companhia aérea e um dos agentes da conetividade internacional de Cabo Verde, a sua principal missão é assegurar o transporte de passageiros, suas bagagens e cargas, de Cabo Verde para o mundo e vice-versa. Assim, há que, com coragem e objectividade, definir os 4 principais pilares de uma companhia aérea:

O primeiro pilar é o Departamento Comercial que identifica o mercado. É o estudo do mercado e a sua monitorização permanente pelos técnicos comerciais, subsidiados pelos do marketing e imagem que identificam o mercado (locais onde há passageiros e carga), os mobilizam para utilizarem os serviços da companhia e procuram “encher” os aviões nos percursos, ponto a ponto, entre os aeroportos de Cabo Verde e os outros, devidamente identificados. Ainda é o sector comercial que quantifica o mercado existente (quantos passageiros) e as rotações/frequências mais adequadas e competitivas a operar. Aqui também se definem as previsões de receitas operacionais.

O segundo pilar é o Departamento da engenharia & Operações de voos. São os técnicos deste departamento que, em função do mercado existente (quantidade de passageiros e carga, distância entre os aeroportos) devem identificar e definir os melhores aviões que devem ser utilizados nas linhas a explorar e monitorizar toda a estratégia das operações de voo. O Departamento Técnico/Operacional tem um papel crucial na definição dos tipos de aparelhos e na optimização e previsões dos custos das operações.

O terceiro pilar é o Departamento Financeiro. Este tem a tarefa de confrontar os dados das receitas e das despesas e dar a resposta se a equação bate certo ou não. É uma responsabilidade muito grande, porque só o resultado da confrontação entre os dados das receitas e das despesas pode permitir decidir se a operação é viável ou não. Portanto mais que se limitar ao simples registo das receitas e despesas, o Departamento Financeiro, tal como um juiz, define se a operação pode e deve ser feita.

O quarto pilar seria o Departamento dos recursos humanos que, em função das actividades operacionais e em estreita articulação com os 3 pilartes anteriores, vai definir tanto a estrutura do pessoal, o seu tamanho, remuneração e critérios de avaliação de desempenho.

Sabendo que os TACV não devem ser nem um “centro de emprego” nem tão pouco uma “FAIMO de Luxo” (frente de alta intensidade de mão-de-obra), para regressar às operações, a empresa tem que ser redimensionada, de acordo com o mercado a ser explorado. Nem o sindicato nem tão pouco o governo pode decidir ou especular quantos trabalhadores são necessários para a retoma das operações, quando isso for possível. Serão os 3 pilares atrás mencionados a definir as necessidades em pessoal e o 4º pilar executará a estratégia de recursos humanos, sempre em estreita articulação com os departamentos de produção ou controle da mesma.

Assim e só assim os TACV poderão renascer, para trazer alegria aos caboverdianos que os querem ver a voar e aliviar os bolsos dos passageiros que actualmente estão submetidos a um monopólio avassalador e ruinoso. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1029 de 18 de Agosto de 2021. 

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Autoria:Victor Fidalgo,23 ago 2021 7:45

Editado porSara Almeida  em  23 ago 2021 7:45

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