Como bem ressalvou Casimiro Teixeira, o ano de 2013 foi marcado por “um pouquinho de mau, um pouquinho de bom”. Entretanto, foi um ano marcado pelo julgamento do caso Lancha Voadora com a condenação dos principais cabecilhas do tráfico de droga que culminou com a apreensão de mais de uma tonelada e meia de cocaína e do mediático caso Zé Catana, o serial killer que matou, esquartejou, comeu e vendeu a carne da sua vítima. A detenção de dois agentes da Polícia Nacional na Guiné-Bissau, depois de terem acompanhado uma ex-condenada, também marcou a actualidade.
Os vários crimes de assassinato em Cabo Verde nos últimos anos quer seja com arma branca ou de fogo, começam a ser visto com “naturalidade” pela sociedade, mas a 13 de Junho de 2013, o país foi surpreendido com um crime macabro que nunca antes fora registado na história do arquipélago e desta forma, Zezinho Catana, o suposto autor de quatro homicídios “com impressão digital de um psicopata” devido ao nível de malvadez que utilizou para matar as suas vítimas, entrou na lista das autoridades policiais como o primeiro serial killer cabo-verdiano.
Na altura, Zé Catana confessou à Polícia Judiciária que assassinou e esquartejou um colega de quarto, José Pires, mais conhecido por Djó Pedreiro, natural da ilha de Santo Antão. O presumível homicida revelou ainda que terá vendido a carne da vítima “tanto fresco como salgada” como se fosse carne de carneiro e porco, nos arredores de Terra Branca, Santaninha e Quartel de Escola, levando assim os praienses a comerem carne humana.
Há menos de um mês, a análise do DNA comprovou que as ossadas encontradas são realmente de José Pires, e o Tribunal da Comarca da Praia ordenou que os restos mortais do malogrado fossem entregues aos familiares, que insistem em dar um funeral digno a Djó Pedreiro.
Aquando do acontecimento já não se falava em outra coisa, a não ser na morte de José Pires e nas pessoas que, possivelmente, comeram a carne humana.
A Zé Catana foi traçado o perfil de um psicopata, que age de forma fria e letal, com uma ficha manchada nas ilhas de Santo Antão e São Vicente.
Em 1980, chegou a ser acusado de tentar matar um indivíduo, na ilha de Santo Antão. O homem levou 75 pontos, mas conseguiu escapar da morte.
Três meses depois, cometeu um assassinato também na ilha de Santo Antão, onde teria esmagado a cabeça da vítima com uma pedra de 15 quilos. Na prisão, durante uma licença de final de semana, terá violado uma idosa de 94 anos.
Catana recusa colaborar com a PJ
Nesta lista de criminalidade praticada pelo serial killer, veio ainda ajuntar-se mais três casos, a de Maria de Alice e Amâncio que desapareceram sem deixar rastos e Maria de Chandim encontrada morta dentro de sua casa, todos os casos, cujas investigações continuam sob a alçada de PJ em São Vicente.
No interrogatório da PJ na Praia, Zezinho Catana confessou que assassinou Alice em Julho de 2012, explicando que “apenas” a despedaçou e enterrou nas imediações de Fernando Pó, mas que não comercializou a sua carne e que no mês seguinte matara Maria Chandim.
Zezinho Catana que se encontrava preso na Cadeia Central da Praia, foi transferido para Cadeira de Ribeirinha em São Vicente para provar a autoria dos crimes confesso.
O homicida que na cidade da Praia foi flexível em colaborar com a PJ, “dá uma de durão” em São Vicente e complica as investigações sobre onde terá depositado os restos mortais de Alice e Amâncio. Após vários interrogatórios Catana recusa em mostrar onde terá enterrado as ossadas dessas vítimas.
Brevemente, o serial killer será transferido para a cidade da Praia, onde vai aguardar o julgamento do caso.
“Salvo por uma unha negra”
Enquanto a população lamentava o crime macabro ocorrido no país, chegava a inesperada notícia de que dois agentes da Polícia Nacional afectos aos Serviços de Emigração e Fronteira que se deslocaram à Guiné-bissau numa missão de escolta de uma ex-presidiária, a cidadã guineense Enide Gama, a quem foi aplicada a pena acessória de expulsão, estavam detidos naquele território.
Este episódio criou um clima tenso entre os dois países, e gerou enorme ansiedade no seio dos familiares e da nação crioula, que não parava de clamar pela justiça, com as autoridades guineenses a manterem um braço de ferro com o governo cabo-verdiano, ao acusar os dois agentes de espionagem e crime contra a Segurança Interna e Externa do Estado, avançando com um processo-crime contra os dois junto do Tribunal Militar Regional.
Não sendo possível provar os factos que lhes eram imputados, o processo foi remetido para o Ministério Público, onde foi arquivado provisoriamente.
Os dias se passavam, o nosso ministério da Administração Interna admitia“eventuais falhas” na comunicação com as autoridades de Bissau no processo do repatriamento da referida cidadã guineense, enquanto outras entidades nacionais mexiam os cordelinhos para uma rápida libertação dos agentes, afinal não se tratava de um processo fácil e muito menos de um país onde a justiça e a paz fala mais alto.
Após duas semanas de angústia e preocupação, finalmente Júlio Centeio Gomes e Mário Varela Brito pisaram o solo da terra mãe.
Após terem deixado o território guineense, o Chefe de Estado Maior das Forças daquele país acusou Cabo Verde de ter assassinado a cidadã guineense Enide da Gama, realçando que “os agentes cabo-verdianos deviam ser levados à justiça para serem julgados mas, mais uma vez, deixámos escapar Cabo Verde. Não gostei nada disso. Não só violaram as nossas fronteiras como a rapariga que disseram que trouxeram não foi vista. Ela foi morta”, acusou.
Arguidos do processo “Lancha Voadora” esperam decisão do STJ
O mediático caso do processo “Lancha Voadora” que começou em 2011, ainda promete fazer correr muita tinta e em Abril de 2014 terá o seu desfecho.
Recordando que na altura o arguido Paulo Pereira, a figura central deste esquema, foi condenado a 22 anos de prisão e Carlos Gil, considerado o seu braço direito, foi sentenciado a 17 anos.
Quirino dos Santos recebeu como pena 15 anos, Ernestina “Nichinha” Pereira, 13, Luís Ortet e António Semedo, 12, Ivone de Pina Semedo, 11, Veríssimo Pinto, nove anos e seis meses, e Jacinto Mariano, 9 anos de prisão.
Por falta de provas que sustentem as ligações de Djoy Gonçalves, José Teixeira, José Oliveira, Nilton, Sandro, Nirina e das empresas TecnoLage, AutoCenter, ImoPraia, Editur e a Aurora Internacional aos crimes que lhes eram imputados, foram todos absolvidos, mas as três primeiras foram multadas.
A condenação pela primeira Instância e o confisco da maioria dos bens pertencentes a estes réus não agradou nem os advogados da defesa, nem ao Ministério Público. A acusação discordou totalmente das absolviçõese da não dissolução das empresas, bem como da não aplicação da multa à Imopraia.
Por sua vez, a defesa queria a absolvição dos seus clientes. Ambos recorreram ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ) e o MP pediu agravamento de pena dos arguidos, de 24 para Paulo Ivone, 20 para Carlos Gil, 17 para Ivone, Ernestina e Quirino, Luís Ortet e António Semedo 18 anos, Veríssimo Pinto 14 anos e seis meses de prisão.
Em 2014 será conhecido o desfecho do caso da maior apreensão de drogas de sempre em Cabo Verde.
Agentes da BAC numa saia justa
Ainda com processos nas costas encontram-se 13 elementos da polícia acusados de roubo de mais de dois quilos de cocaína nas instalações da Brigada Anti-Crime (BAC). Nove dos agentes envolvidos foram condenados com penas que oscilam de 7 a 13 anos de prisão e quatro foram absolvidos.
Após a decisão da primeira Instância, mediante um habeas corpus 7 foram colocados em liberdade, mas em contrapartida foram demitidos da corporação. Os acusados vão agora aguardar uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).
Nestes casos estão implicados os agentes Dulce Vaz, acusada de planear em cumplicidade com outros colegas da profissão, também arguidos neste processo, condenada a 11 anos de prisão, assim como Daniel Alberto Lopes Furtado Fernandes.
A Edson de Pina, que também se encontrava em prisão preventiva, desde de Julho de 2011, foi aplicado a pena de 12 anos de prisão.
Alberto Gomes 13 anos, José da Silva 9, Elder da Veiga, Euclides de Mello e Odair Ramos condenados a 7 anos.
Joaquim Pires, Elso Rocha, Alexandro dos Santos e Danilson Lopes foram absolvidos.
Pedro Vaz, que também aguardava o julgamento em prisão preventiva foi condenado a 2 anos de prisão, suspenso por 4 anos.
Recorda-se que o caso aconteceu em Julho de 2011, altura em que foi encontrada no litoral da Calheta, concelho de São Miguel, uma grande quantidade de droga a flutuar no mar.
Morte ou prisão
Presa por tráfico de drogas, mas por ter colaborado com a justiça durante o julgamento que conduziu à condenação de Zé Pote e José Jorge, a baronesa Zany Filomeno que fora condenada a oito anos de prisão, após cumprir parte da pena reclamava a tempo e hora por sua liberdade. Cansada de esperar resolveu colocar a boca no “trombone” e exercer a pressão sobre a justiça.
A “pressão” exercida deu certo e entrou numa guerra declarada com o Procurador-geral da República, Júlio Martins.
Sem ver cumpridas as exigências da baronesa, numa manhã, e quando menos se esperava, abriu-se a cela da Cadeia Central da Praia e Zany Filomeno foi colocada em liberdade, sem a mudança de identidade e novos passaportes para ela e familiares mais próximos.
Desde esse dia não se ouviu falar mais da baronesa e muito menos no seu paradeiro.
Quadrilha desarmada
Outro destaque do ano foi a detenção por parte da Polícia Judiciária do grupo de delinquente os “Titanic”.
Durante as buscas que conduziram à detenção da rede criminosa, a PJ apreendeu diversas armas de fogo, de calibre 6,35 e 7,35, munições de 9mm, uma metralhadora, viaturas, entre outros objectos e mais de três mil contos em dinheiro provenientes das práticas ilícitas do grupo.
Conforme sublinhou a nossa fonte, trata-se de uma quadrilha altamente perigosa que andava a causar pânico na cidade da Praia. É composto por 9 indivíduos, suspeitos dos crimes de associação criminosa, homicídios, execuções, assaltos à mão armada e sequestros.
No grupo David Golias é tido como cabecilha. Enquanto chefe e cabecilha de todo o esquema, era quem recebia dinheiro para executar pessoas e distribuía tarefas a cada elemento, conforme a habilidade que apresentavam. Cada um tinha o seu “trabalho” específico: assassinato, roubo, extorsão, etc.
A rede é acusada de autoria de vários homicídios ocorridos na capital, como o do cambista Agnelo Varela, do professor Miguel Fernandes, que era esposo de uma outra cambista, e Peixinho, e é suspeito terem morto João David, o assassino de Peixinho que também era um dos elementos do grupo.
Como medida de coação, o Tribunal da Comarca da Praia decretou prisão preventiva a David Golias, Eme, Elizandro e o cambista Zé Pedro. Os restantes vão guardar o julgamento em liberdade.
“Assassino de Es Terra continua a monte”
Como nos anos anteriores, os homicídios continuam a marcar negativamente a sociedade cabo-verdiana e a impotência das autoridades em parar esta onda criminosa é evidente. A capital registou vários homicídios, entre outros, o do empresário Emanuel Spencer e a recente execução de “Zé Es Terra” que puseram a nu o nível de insegurança que se vive actualmente em Cabo Verde.
A figura cabo-verdiana de 2013
É nesta onda de tanta tristeza e marginalidade em 2013, que surge um homem para alegrar o coração dos cabo-verdianos. Antes desconhecido, Casimiro Teixeira deu uma pequena entrevista, baseando na sua opinião sobre a justiça em Cabo Verde, o que rendeu a popularidade e a fama.
As suas palavras: “I no, gressives paah, sei lá, tou lá tou cá”, ganharam notoriedade e passaram a ser usadas em qualquer circunstância ou classe social.
Casimiro agora se sente tão famoso, alegando que estão a roubar-lhe o direito do autor e que não autorizou a ninguém usar as suas palavras. O senhor agora ficou “gressives paah”.