Operação “Voo da Águia” volta à ribalta: Mandado de detenção contra Zany Filomeno

PorExpresso das Ilhas,22 fev 2014 0:34

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A Procuradoria da Comarca do Sal emitiu, em finais de 2013, um mandado de detenção contra Zany Filomeno Soares Moreno. Esta informação está confirmada e o documento encontra-se na posse da Polícia Judiciária, na Praia, à espera da sua execução. “Lavagem de capitais e corrupção activa”, no âmbito da operação “Voo da Águia” que levou à condenação, em Outubro de 2009, de cinco arguidos a penas de prisão entre os 11 e 19 anos, estarão na origem da emissão desta ordem de prisão da Zany.

 

Em Outubro do ano passado, a ex-baronesa da droga saiu em liberdade, depois de ter cumpri­do cinco-sexto da pena de 8 anos de prisão que lhe foi aplicada, em Janeiro de 2008, por crime de tráfico de droga e associação criminosa. Recorde-se que, nes­sa altura, ela foi apenas julgada e condenada por estes dois actos ilícitos.

Volvido todo esse tempo, vem agora o Ministério Público (MP) lembrar-se que ela também co­meteu os crimes da lavagem de capitais e corrupção activa, no mesmo processo que, de resto, ela já foi julgada e condenada.

 

Zany confessou os crimes de lavagem de capitais e corrupção activa

Recorde-se que a propósito dos crimes - lavagem de capitais e corrupção ativa -, que terão motivado, agora, o mandado de detenção, segundo a acta de audiência de discussão e julgamento do processo “Voo da Águia”, na Comarca do Sal, Zany Filomeno, confessou, explicitamente, ter entregue o dinheiro a Else Lígia Martins, para pagar a um dos agentes da Polícia que foi recrutado para deixar passar a droga no crivo da fronteira no Sal.

Quanto ao crime de lavagem de capitais, é o próprio Acórdão nº 98/2010, de 1/07/10, do Supremo Tribunal de Justiça, em que foram os recorrentes: José Arlindo Varela Semedo (Zé Pote); Else Lígia dos Reis Furtado Fernandes Martins (Lígia); José Jorge Tavares Gonçalves (Jorge); José Rui Monteiro da Veiga (Tigana) e António Fernandes Tavares (Naiss), que deixa estampado os seguintes depoimentos da Zany: “(…) propôs-lhe registar os bens que havia adquirido com os lucros conseguidos, em nome de um familiar seu, como segurança, porque naqueles ca­sos as autoridades investigam sempre os bens das pessoas envolvidas. Que ela declarante (Zany) com toda a ingenuidade aceitou a proposta, deixando que fosse registado em nome dos familiares (…), uma vi­venda situada em Palmarejo, adquirida por quarenta milhões de escudos; e o outro em Meio de Achada de Santo António, que lhe custara dez milhões de escudos”.

“Portanto, estranho agora que haja um mandado de de­tenção contra a Zany, numa altura em que se encontra em liberdade, porventura, com ou­tra perspetiva de vida, depois de sete anos de reclusão”, observa um advogado, que não quis identificar-se, mas que conhece muito bem o processo “Voo da Águia”.

Mais: de acordo com um dos advogados de defesa de Zé Pote e José Jorge, “numa das sessões de audiência da discus­são e julgamento desses então arguidos, a defesa apresentou um requerimento no qual pedia que a Zany fosse constituída arguida naquele processo, face às suas confissões relacionadas com os crimes de lavagem de capitais e corrupção activa”. Entretanto, continua aque­le jurista, o representante do Ministério Público presente no julgamento indeferiu o re­querimento argumentando que não era a defesa que lhe sugiria que constituísse arguida, a tes­temunha Zany Filomeno. Todas essas declarações constam da acta da audiência de discussão e julgamento do processo “Voo da Águia” que se encontra, de resto, transitado em julgado, no Tribunal da Comarca do Sal.

“Vingança e tentativa de silenciamento”

Instado a pronunciar-se so­bre esta decisão do MP, o advo­gado da Zany Filomeno confir­ma a existência do mandado e considera que este “expediente é um acto persecutório de vin­gança e de tentativa de silen­ciamento” da sua constituinte, já que o mandado de detenção surge poucos meses depois da publicação de dois manuscri­tos da sua cliente. Nessa carta, recorde-se, escrita a partir da Cadeia Central de São Martinho, na Praia, Zany manifestou a sua profunda indignação com a jus­tiça cabo-verdiana que, no seu entender, a abandonou ao “Deus dará”; acusou, igualmente, o Procurador-Geral da República (PGR), Júlio Martins, de não ter cumprido o acordo de proteção de testemunha, aquando da sua colaboração com a justiça, no julgamento do mediático pro­cesso “Voo da Águia”, que levou à condenação de várias pessoas, acusadas de narcotráfico.

Nesses manuscritos a que, acima referimos, a ex-reclusa retratou-se de todo o depoimen­to que serviu de base para a con­denação das pessoas envolvidas na operação “Voo da Águia”, em Outubro de 2009 e considera, igualmente, “inocentes”, os sen­tenciados Zé Pote e José Jorge. Recorde-se que Zany afirmou na sua missiva que o julgamento do processo “Voo da Águia” foi uma operação muito bem “urdida” para entre outros intentos, fazer com que os réus fossem conde­nados e os seus bens declarados a favor do Estado.

Um outro jurista por nós contactado, que não quis se identificar, considera que este mandado, a materializar-se, seria um caso inédito na justiça cabo-verdiana. Na ótica daquele advogado, seria a primeira vez em Cabo Verde que um cidadão é julgado e condenado num processo e volta, depois de vá­rios anos, à barra dos tribunais para responder pelo mesmo processo, alegadamente, em crimes diferentes: “lavagem de capitais e corrupção activa, no caso concreto dessa senhora”. “A cidadã em causa, não é cul­pada pelo eventual erro que a justiça terá cometido, aquando da acusação da prática de crimes para os quais já foi julgada e condenada”, assevera o mesmo jurista alertando para aquilo que considera uma “tamanha afronta aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, em matéria da justiça”

Uma fonte da Procuradoria­-Geral da República, instado a pronunciar-se sobre a existên­cia ou não desse mandado de detenção e qual é a sua base legal, confirma, de facto, a emis­são dessa ordem de detenção, que aguarda a sua execução na Direção Central da Polícia Judiciária, na Praia. “Quando os procuradores do Sal foram analisar o processo de novo, descobriram que, afinal, a Zany foi julgada e condenada só pelos crimes de associação criminosa e tráfico de droga, ficando os de lavagem de capitais e corrupção activa, pelos quais ela, ainda, nunca foi acusada e processa­da” garante a nossa fonte que reconhece a existência de “uma falha grave do representante do MP que esteve presente no julgamento”.

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Autoria:Expresso das Ilhas,22 fev 2014 0:34

Editado porExpresso das Ilhas  em  31 dez 1969 23:00

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