A jornalista e escritora bielorrussa Svetlana Aleksievitch foi distinguida hoje com o Nobel da Literatura 2015 pela escrita "polifónica, um monumento ao sofrimento e à coragem no nosso tempo", anunciou a Academia Sueca.
A autora bielorussa foi distinguida com o Prémio Médicis Ensaio, em 2013, pela obra "O fim do homem soviético", publicada este ano, em Portugal, pela Porto Editora.
Fonte da Elsinore adiantou hoje à Lusa, que, "dada a surpresa do Nobel, provavelmente ir-se-á antecipar a sua publicação".
Em comunicado divulgado hoje, a Porto Editora, por seu turno, realça que Svetlana Aleksievitch é "considerada uma das autoras mais prestigiadas a escrever sobre a URSS [União das Repúblicas Socialistas Soviéticas], [e] os seus trabalhos têm recebido uma enorme aceitação por parte da crítica".
Os seus livros estão traduzidos em 22 línguas e alguns foram já adaptados a peças de teatro e documentários.
Nascida sob bandeira soviética, em Ivano-Frankovsk, na Ucrânia, Svetlana Aleksievitch é filha de um militar bielorrusso e mãe ucraniana. Entre 1967 e 1972, a autora estudou jornalismo na Universidade de Minsk.
Segundo a Academia Sueca, "devido às suas posições críticas, foi obrigada, após a licenciatura, a trabalhar num jornal regional na cidade bielorrussa de Brest, junto da fronteira com a Polónia".
Mais tarde, Aleksievitch conseguiu voltar para Minsk, onde trabalhou na Sel'skaja Gazeta, segundo a Academia.
A autora exercitou "vários géneros literários", afirma a Academia Sueca, que cita, entre as suas referências, Sofia Fédortchenko (1888-1959), uma enfermeira que se tornou conhecida pelo seu diário em que documentava as experiências dos soldados russos durante a I Guerra Mundial (1914-18) e o escritor bielorrusso Ales Adamovich (1927-1994), autor de relatos documentais de guerra.
Durante muitos anos, Aleksievitch reuniu material para o seu primeiro livro, "A guerra não tem o rosto de uma mulher" (tradução livre a partir da edição francesa de 2005 do original "U vojny zenskoe lico"), uma obra publicada em 1985, baseada em entrevistas a centenas de mulheres que participaram na II Guerra Mundial (1939-45).
Este foi o primeiro título de uma série de cinco obras, intitulada "Vozes da utopia", na qual a autora aborda a ex-União Soviética (URSS) e a sua queda, numa perspetiva individual.
Em 1997 publicou "A Súplica. Chernobyl - Crónicas do mundo após o apocalipse", versão livre do título da tradução francesa, de 1998, do original "Cernobyl'skaja molitva", em que aborda a catástrofe nuclear de Chernobyl e as suas consequências, e que também pode ser entendido como "Orações de Chernobyl" ou "Vozes de Chernobyl", e que a Elsinore prevê editar em Portugal.
De sua autoria, do conjunto de obras dedicadas ao fim da era soviética, conta-se ainda "Os caixões de zinco" ("Cinkovye mal'ciki", no original), de 1990, que incide sobre a guerra liderada pela ex-URSS no Afeganistão, de 1979 a 1989.
À série junta-se, em 1994, a publicação de "Enredados pela morte" ("Zacarovannye smert'ju"), que, tal como outros títulos seus, foi escrito com base em entrevistas.
"Através do seu método extraordinário - uma colagem cuidadosamente composta por vozes humanas - Alexievich aprofunda a nossa compreensão de toda uma época", atesta a Academia Sueca.
O seu livro mais recente, "O fim do homem soviético", culmina a série "Vozes da utopia".
Segundo a Porto Editora, a obra aborda, volvidas mais de duas décadas, a desagregação da URSS, "que permitiu aos russos descobrir o mundo e, ao mundo, descobrir os russos".
"Após um breve período de enamoramento - prossegue a editora, na apresentação da obra - o final feliz tão aguardado pela história mundial tem vindo a ser sucessivamente adiado. O mundo parece voltar ao tempo da Guerra Fria".
"Enquanto no Ocidente ainda se recorda a era Gorbatchov com alguma simpatia, na Rússia há quem procure esquecer esse período e o designe a catástrofe russa. E, desde então, emergiu uma nova geração de russos, que anseia pela grandiosidade de outros tempos, ao mesmo tempo que exalta Estaline, como um grande homem", escreve a editora portuguesa.
"Com uma acuidade e uma atenção únicas, Svetlana Aleksievitch reinventa, neste magnífico requiem, uma forma polifónica singular, dando voz a centenas de testemunhas, os humilhados e ofendidos, os desiludidos, o homem e a mulher pós-soviéticos, para assim manter viva a memória da tragédia da URSS e narrar a pequena história que está por trás de uma grande utopia", remata a Porto Editora.
A Academia Sueca refere que devido às suas posições políticas críticas ao regime, Aleksievitch viveu exilada na Itália, França, Alemanha e Suécia.