Djam Neguin, artista multidisciplinar cabo-verdiano, vai levar a história do Funaná ao Festival Dias da Dança que se realiza no Porto, Portugal.
Uma das versões acerca da origem deste estilo musical conta que Funa tocava gaita e a sua companheira Na-Ná tocava ferrinho. No entanto não há qualquer registo de Na-Ná.
Segundo uma matéria sobre o artista cabo-verdiano publicada no site do Festival DDD, Na-Ná relembra-nos da omissão que as mulheres têm sido alvo ao longo da História, na escrita da História.
Djam Neguin, ao ser questionado sobre o que pode estar no âmago dessa omissão, desse apagamento, recorreu a um provérbio africano que diz (...) "Enquanto a história da caça ao leão for contada pelos caçadores, os leões serão sempre predadores”.
“Quem controla as narrativas, controla o mundo. E sabemos que vivemos num mundo embainhado pela lógica heteropatriarcal colonial machista que tem colocado o feminino numa posição objectivamente subjugada. Essas omissões e apagamentos históricos são estratégias para fazer predominar no imaginário um mundo de domínio masculino”, explicou.
Porém, o futuro tem a solução na medida em que ele se constrói agora, disse.
“A percepção ocidental linear do tempo (também de herança judaico-cristã) moldou-nos o entendimento do tempo enquanto uma linha recta. Todavia, há outras possibilidades temporais (muito mais interessantes a meu ver). Talvez, entender o tempo como um vórtex contínuo em que o presente, passado e futuro são absolutamente intersectados e intercambiáveis”.
“O futuro é também o não-tempo. É o único local que podemos habitar com absoluta imaginação. E por isso, as narrativas que queremos prevalecer precisam ser contadas agora. E não é possível contar estórias sem conhecer a História (aquilo que já se passou) e sermos capazes de interromper as ficções que têm dominado os arquétipos e inconscientes colectivos e mundificado as nossas experiências com base em opressões e silenciamentos”, acrescentou.
Djam Neguin considera que a sua arte está muito ligada às suas origens, e conta um pouco como tem construído o seu percurso: uma busca pelo seu “eu” através da recuperação da sua ancestralidade cultural para depois, antropofagicamente, fazer emergir as suas próprias ficcionalidades.
“Esta trajetória tem-se concretizado na forma de vários materiais artísticos que resultam dessas investigações que normalmente são permeadas pelo desejo de cruzamento de linguagens e multissensorialidades. Tem sido uma jornada interessante que tem-me possibilitado encontrar um lugar de extrema auto-fruição e ao mesmo tempo uma interface com as questões que atravessam o meu tempo e contexto de existência, enquanto um artista negro que precisa de estar a enfrentar constantemente o maquinário da decolonialidade”, salientou.