Nelson Correia escolheu o mês de Agosto para celebrar o seu matrimónio. Além de ser uma época em que muitos familiares estão juntos, é o mês do seu aniversário.
“Casei no mês de Agosto, porque é o mês do meu aniversário e de férias. Agosto, além de ser um mês simples, é um mês em que muitos familiares se reúnem”, conta.
Para Nelson, a afirmação que Agosto é mês de desgosto não passa de um mito. O seu casamento aconteceu em 2019, e desde então disse que tudo tem sido normal.
“Na próxima semana vou completar cinco anos de casado. A experiência foi muito boa”, diz.
Dionísia Martins também casou no mês de Agosto. A data foi escolhida por ser a melhor altura do ano para o casal. “Escolhemos o mês de Agosto porque para nós era a melhor época do ano, porque todos os familiares estão reunidos nesta altura”.
Ao Expresso das Ilhas explicou que nesta altura do ano muitas pessoas encontram-se de férias e têm, portanto, mais disponibilidade para participar em celebrações matrimoniais.
Dionísia Martins afirma que a crença popular que Agosto é um mês aziago nem foi levada em conta. “As pessoas falam desse mito, mas esse mito não me diz nada, porque acredito que quando as pessoas querem algo devem fazê-lo acontecer, seja em que mês for”.
Mito ou realidade
Para o docente e investigador José Maria Semedo, essa superstição é uma confusão e uma deturpação de uma crença. “É uma deturpação, primeiro, do nome do mês, segundo da origem do nome do mês, pois uma é crença. Claro que as pessoas quando tiram a sorte, tende a dar certo ou errado.
Semedo frisou que há dois meses em que as pessoas evitam casar. “Eu sei que isso existe. Há dois meses que as pessoas evitam o casamento. Em Janeiro e Agosto, ou dá tudo bem, ou dá tudo mal. Para evitar o azar, não se casam nesses dois meses. Não tem nada a ver com a origem do calendário, muito menos com o nome do calendário”.
“Até porque o azar e a sorte não são atribuíveis ao nome dos meses, mas sim ao ciclo do zodíaco. Em que constelação estava o sol naquela época do ano. Desde o tempo dos mesopotâmios e do Egipto. E ainda há quem creia nisso, nos tempos modernos”, sublinha.
Para o historiador, o calendário que nós usamos correntemente é chamado gregoriano, do Papa Gregório.
“No século XVI o Papa Gregório decidiu fazer uma correcção, um reajuste no calendário por causa da Páscoa. E nesse reajuste é criado o mês e o ano. Então começou-se a contar os meses a partir de Janeiro, porque é a altura em que o Sol está mais perto da Terra. É uma referência mais astronómica”, explica, acrescentando que as pessoas em geral evitam casar no mês de Agosto, tanto no religioso como no civil.
Por outro lado, refere que há jovens que já não ligam esta crença. “Quem sabe a origem do nome não liga, mas toda a família faz pressão, porque se você dizer que vai casar no mês de Agosto, todos os familiares vão lhe pressionar”.
O investigador considera que ainda há muitas pessoas que acreditam neste mito. “O povo acredita nisso. É uma criança que se instalou”.
Na Paróquia Nossa Senhora da Graça, na Praia, a responsável do registo de casamento informou-nos que há anos em que em Agosto há menos casamento, mas há anos em que há mais celebrações de casamento.
De acordo com os dados da Conservatória (Direcção Geral dos Registos, Notariado e Identificação) em Agosto há sempre menos registos de casamento.
Já os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) de casamentos de 2021 mostram que Agosto foi um dos meses com mais registo de casamento (245). Já no ano de 2020, Agosto foi um dos meses com menos registo de casamento (84).
Casamentos em Cabo Verde
Conforme afirma José Maria Semedo, estatisticamente poucas pessoas se casam em Cabo Verde. “O casamento não chega a 20%. É um quinto da população jovem que casa”.
Semedo reforça que às vezes temos a percepção de que há muitos casamentos, mas que o casamento é uma coisa rara. “É insignificante. É menos de um quinto da população que casa”.
Os dados do INE mostram que de 2015 a 2021, foram celebrados um total de 2.263 casamentos em Cabo Verde.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1186 de 21 de Agosto de 2024.