Esta exposição conta com a parceria da Embaixada do Brasil em Cabo Verde. Estes trabalhos resultam de uma colaboração entre os dois artistas, de países diferentes e com linguagens e técnicas diferentes, trazendo para o público um conceito diferente.
Amadeo Carvalho é um artista plástico cabo-verdiano radicado em Londres. Amadeo une poesia e pintura na sua obra, que inspira reflexões sobre as camadas possíveis de interpretação dos olhares e expressões da sua herança cultural, as suas memórias de infância e as comunidades de Cabo Verde.
O artista realizou diversas exposições individuais em locais como o W Hotel (Londres), o Centro Cultural do Mindelo (São Vicente) e o Centro Cultural de Cabo Verde (Lisboa). Participou da X Bienal de São Tomé, e esteve em residência artística no Ateliê Cida Lima.
Cida Lima, nasceu no Sertão da Bahia, Brasil, e actua desde os anos de 1990. Residiu em diversos países como Moçambique, Bangladesh, Estados Unidos, Quénia, Angola, Costa Rica e Cabo Verde.
Essa viagem multicultural da artista inspira o seu trabalho, que reinterpreta estéticas tradicionais e integra memórias e pessoas à cultura dos lugares. Em cada exposição, Cida trabalha em colaboração com artistas locais, desconstruindo percepções eurocentristas e reimaginando processos históricos.
Exposição “Atlântico Negro”
Esta exposição mostra o diálogo entre os dois artistas que aprofundaram as suas pesquisas onde a figura feminina cabo-verdiana ganha muita força e um lugar central.
Em entrevista ao Expresso das Ilhas, Cida Lima afirmou que esta exposição surgiu de uma residência do artista no seu atelier, no Brasil. “A proposta inicial foi uma residência, e essa residência era só a fusão e a troca de informação das técnicas. Amadeo trabalha com a técnica de projecção e de desenho com muita precisão, e aquilo chamou-me a atenção, porque eu nunca fui muito boa nesta técnica”.
“E, a partir daí, começamos a trocar informações, mostrando o meu trabalho e ele mostrando o trabalho dele. E aí começamos não só a trabalhar tecnicamente nisso: fundimos uma técnica na outra. Isso é que eu acho a coisa mais interessante deste trabalho, essa fusão de técnicas”, relata.
A artista frisa que produziram muitos trabalhos, e que a primeira fase deste projecto teve início no seu estúdio, no Brasil. Já os trabalhos que estão no estúdio de Amadeo fazem parte da última fase do projecto.
Cida Lima sublinhou que pretendem com esta exposição despertar o interesse das pessoas de uma forma mais reflexiva. “Esse trabalho traz não só imagens plásticas, mas também o comportamento da mulher”.
“Mas acho que o papel da arte é esse: despertar para que esse olhar seja mais amplificado, também essa fala seja ouvida não só no Dia da Mulher, nos discursos, mas também seja ouvida na prática. Não é só a mulher batalhadora que trabalha, que carrega o seu balaio, mas também a mulher glamorosa, competente, em todas as áreas que ela tem o direito de estar”.
Como feminista disse que esta exposição é um grande passo e uma grande contribuição que estão a dar. “Vindo não só de uma mulher, como de um jovem rapaz”.
“Isso, para mim, é muito importante, é muito gratificante, inclusive, por conta da mensagem que esse trabalho pode passar, ou seja, que a contribuição do papel da mulher não é só da rosa no Dia da Mulher. Eu acho que temos que falar sobre as mazelas e sobre as diferenças que o patriarcado impõe”, explica.
Amadeo Carvalho, por seu lado, realça que aprendeu que a mulher não é apenas uma musa ou um símbolo, mas que ela é também o coração da transformação cultural.
Amadeo Carvalho explica que o objectivo desta exposição é mostrar ao público a força da mulher cabo-verdiana. “A mulher aqui tem muita força e é a protagonista da sua história, porque se tu não percebes a tua história, não consegues descobrir quem tu és”.
A artista plástica brasileira assegurou que no decorrer do trabalho viu a lenta transformação da sociedade, “porque a minha sociedade que é uma sociedade patriarcal, machista, não é diferente daqui. O índice de violência contra a mulher aqui também é muito alto e muito grande”.
Desejo de levar a exposição para o Brasil
Cida Lima mostrou-se interessada em levar a exposição para o seu país natal, o Brasil. “Tenho o desejo de levar essa exposição para o Brasil, da mesma maneira como é importante para Cabo Verde. Acho que é um lugar também inspirador para Amadeo em termos de fazer intercâmbio com outros artistas”.
Por isso disse que estamos abertos a convites. “Só nos orgulha se convidarem. Agora é uma exposição grande que acho que nem sempre vai-se poder fazer o trabalho todo, a não ser que seja através de um órgão oficial como a Embaixada do Brasil, como a Embaixada de Cabo Verde, no Brasil, que são instituições importantes para esse tipo de deslocamento”.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1218 de 2 de Abril de 2025.