Actualizações mensais dos combustíveis diminuem impacto no consumidor - ARE

PorAndre Amaral,9 jun 2018 8:01

Os preços dos combustíveis têm mantido nos últimos meses uma tendência de subida constante. O PCA da Agência de Regulação Económica, Lívio Lopes, realça que Cabo Verde “está sujeito a externalidades negativas e outros factores externos” que conduzem às actualizações em alta dos preços. Combustíveis mais caros podem significar aumentos nas facturas da electricidade.

Como se estabelece a estrutura de preços dos combustíveis?

O quadro de acção de um regulador é técnico, mas sobretudo legal, regulamentar e contratual. Neste caso concreto, do estabelecimento da estrutura de fixação dos preços dos combustíveis em Cabo Verde, somos regulados pelo Decreto-Lei n.º 19/2009, de 22 de Junho, que estabelece os princípios orientadores da política de preços e a fórmula de cálculo dos preços de comercialização de produtos petrolíferos em Cabo Verde. O Decreto-Lei referido institui o modelo tarifário dos preços máximos (price-cap) como mecanismo de fixação de preços dos produtos petrolíferos. O regime “price-cap” – que representa um forte incentivo à eficiência das empresas - prevê a recuperação apenas de custos elegíveis e um retorno justo sobre o capital investido, incentivando desta forma a redução dos custos, aumento da eficiência e investimentos no sector. A fórmula, supracitada, é a seguinte: PMVCF = CP + CUGSL + MMUD + IVA + Outros I&T +/- ARR, em que PMVCF – significa preço máximo de venda ao consumidor final por unidade (litro ou kg); CP – Custo de aquisição do produto no mercado internacional, incluindo custos de seguros de transporte marítimo internacional e despesas adicionais de importação; CUGSL – Custo unitário de gestão do sistema de logística, que incorpora os custos relacionados com a gestão das instalações de armazenagem, incluindo o retorno sobre o capital investido e o transporte marítimo inter-ilhas; MMUD – Margem máxima unitária de distribuição e venda a retalho; IVA – Imposto sobre o valor acrescentado; Outros Impostos e taxas – Demais impostos e taxas não incluídos nos itens anteriores, nomeadamente, a taxa rodoviária nos casos da gasolina e gasóleo normal; ARR – Arredondamento. Com base no artigo 8º do Decreto-Lei n.º 19/2009 a ARE desenvolveu a metodologia e os procedimentos para o cálculo dos parâmetros CP, CUGSL e MMUD da fórmula de fixação de preços dos produtos petrolíferos. O parâmetro CP, que garante a recuperação automática dos custos de importação - uma vez que estes estão fora do controlo das empresas petrolíferas – é determinado pela indexação à flutuação das cotações dos derivados de petróleo no mercado internacional, utilizando como referência as cotações diárias do Platts European Marketscan (Gasolina, Jet A1, Gasóleo e Fuelóleo) e do Platts LPGaswire (Butano). O parâmetro CP incorpora o custo FOB de referência, o premium (frete ao fornecedor), os impostos aduaneiros e os custos adicionais de importação. Os parâmetros CUGSL e MMUD, revistos quinquenalmente, permitem a arrecadação de receitas suficientes para fazer face aos custos operacionais razoáveis, amortizações e uma taxa de retorno adequada, mediante gestão eficiente e investimentos prudentes.

É preciso reconhecer, também, as descidas. Recentemente, no mês de Março passado (de 1 a 31 de Março de 2018) houve uma redução generalizada dos preços dos combustíveis no mercado nacional.

Quais as justificações para uma actualização mensal dos preços?

A actualização mensal é uma opção assumida pela ARE, em articulação com o Governo, visando, entre outras razões, diminuir o impacto no consumidor, das actualizações por períodos mais longos. De 29 de Agosto de 2009 até 30 de Abril de 2017, o parâmetro CP era revisto tendo em conta a média das cotações do Índice Platts (Platts European Market Scan e LPGasWire) em vigor nos dois meses anteriores ao da fixação dos preços no mercado nacional e vigorava por um período de dois meses, o que obrigava as operadoras a um maior esforço de planeamento e gestão do stock e acarretava um maior desfasamento entre a evolução internacional e nacional dos preços de combustíveis. A partir de 01 de Maio de 2017, a ARE instituiu a revisão mensal do parâmetro CP visando, acompanhar os termos do novo contrato anual (Abril de 2017 a Março de 2018) de fornecimento de produtos petrolíferos refinados ao país; garantir uma maior segurança no planeamento do fornecimento; ajustar a dinâmica dos preços nos mercados internacionais ao custo de stock no país; reflectir mais rapidamente no mercado nacional os custos reais dos produtos petrolíferos e alinhar o período de cálculo dos preços às melhores práticas internacionais de comercialização de combustíveis. São estas as justificações para uma actualização mensal, que julgo adequado, se tivermos em conta que por este mundo fora as actualizações são, muitas vezes, diárias.

A gasolina, entre Dezembro do ano passado e a última actualização (em vigor até ao final de Maio), sofreu um aumento de 11 escudos. No mesmo período o gasóleo subiu 9,7 escudos. Porquê estas subidas?

Em primeiro lugar é preciso reconhecer, também, as descidas. Recentemente, no mês de Março passado (de 1 a 31 de Março de 2018) houve uma redução generalizada dos preços dos combustíveis no mercado nacional. Não me lembro de nenhuma reacção em relação a este facto! O parâmetro CP é de repasse e recuperação automática dos custos de importação (tecnicamente, cost passthrough). De Dezembro de 2017 a Maio de 2018, a gasolina e o gasóleo tiveram aumentos de $67,91 e $76,92 por cada tonelada importada, correspondendo a uma variação percentual de 9,95% e 13,55%, respectivamente. Sendo o preço do petróleo e dos seus derivados fixados em USD, a depreciação do euro em relação ao dólar agrava (e vice-versa) o preço ao consumidor porque as aquisições são efectuadas em euro, moeda que tem paridade fixa com o escudo de Cabo Verde. Comparando o câmbio de Maio 2018 relativamente ao de Dezembro de 2017, verifica-se uma apreciação de euro face ao dólar em 1,96%, justificando o aumento menos acelerado de preços no mercado interno (7,83% para a gasolina e 11,37% para o gasóleo) em relação ao aumento de preços verificado no mercado internacional (9,95% para a gasolina e 13,55% para o gasóleo). Adicionando os impostos aduaneiros, o CUGSL, a MMUD, o IVA e a taxa rodoviária se obtém o preço de venda ao público (PVP). Portanto, em relação à sua pergunta, tendo em conta este e outros factores, a variação de PVP da gasolina e do gasóleo, entre Dezembro do ano passado e a última actualização (Maio), foi de 5,60 e 6,60 escudos, respectivamente, e não de 11,00 e 9,70 escudos. Nota-se claramente o impacto da apreciação/depreciação do euro em relação ao dólar, à qual se associam os outros factores já referidos para as alterações dos preços. Mas, para um melhor entendimento da sociedade civil, devo aproveitar para esclarecer que Cabo Verde, país pequeno, extremamente vulnerável e insular -fortemente dependente do fornecimento externo dos combustíveis -, está sujeito a externalidades negativas e outros factores externos que o simples cidadão ignora. Exemplo típico foram os casos dos furacões Harvey e Irma, em Setembro de 2017, que levaram à redução dos estoques de petróleo nos EUA - com o encerramento de refinarias -, resultando, indirectamente, para Cabo Verde num aumento generalizado dos combustíveis, em Outubro seguinte. Estamos portanto, sujeitos a factores externos que, às vezes, o cidadão consumidor ignora.

O nosso país é demasiadamente vulnerável aos choques externos, dos quais devemos incluir, no extremo, até fenómenos ambientais

Também o Fuel teve um aumento do preço no mesmo período. É de esperar que esse aumento se reflicta na factura da electricidade?

Naturalmente que sim, sendo o fuel o principal combustível para a ELECTRA. Foi o que aconteceu com a última actualização de electricidade (de 06 de Março de 2018), reflectindo, também, na factura da água. A grande conquista, para os próximos tempos, na redução da factura energética no país, poderá passar pela transferência da descarga primária do fuel 380 na Praia e no Sal, entre outras medidas, como o aumento das renováveis na produção.

Tendo em conta que os custos com a logística e transporte são fixos, os custos de importação, por si só, justificam o aumento do valor dos combustíveis?

De facto, os parâmetros CUGSL e MMUD (o IVA e a taxa rodoviária) comportam valores fixos, sem prejuízo dos ajustes legalmente previstos, durante o período tarifário, quinquenal. O que varia mensalmente é o parâmetro CP, por todas as razões expostas anteriormente mas também porque o peso relativo do parâmetro CP é muito superior aos outros, em cerca de 60%, isto é, os custos de importação pesam muito mais do que os da logística e da distribuição. Só não acontece alteração de preço quando a variação de cotações Platts e a do câmbio forem nulas relativamente ao mês anterior. O IVA, por ser ad valorem, interfere sempre nos aumentos/diminuições dos preços de combustíveis. Como dissemos anteriormente, o nosso país é demasiadamente vulnerável aos choques externos, dos quais devemos incluir, no extremo, até fenómenos ambientais.

Este texto foi originalmente publicado na edição 862 do Expresso das Ilhas

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Autoria:Andre Amaral,9 jun 2018 8:01

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  3 mar 2019 23:21

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