“A via rápida Praia/Tarrafal será um acelerador do desenvolvimento da ilha de Santiago e de Cabo Verde”, responde, por escrito, o Primeiro-ministro ao Expresso das Ilhas. “Tendo cerca de metade da população do país, Santiago tem de emergir, no quadro do plano estratégico de desenvolvimento sustentável II e da ambição de Cabo Verde para 2030, como uma economia dinâmica”, refere ainda Ulisses Correia e Silva.
“Santiago é uma ilha que tem potencial para ser digital, turística, com agricultura inteligente, um centro financeiro internacional, uma zona especial do agronegócio, um polo industrial e logístico e um epicentro do conhecimento, passando pela edificação de um hub de ensino, formação profissional e investigação, assim como pela promoção da indústria criativa, farmacêutica e economia da saúde. Um verdadeiro centro internacional de prestação de serviços”, afirma o líder do governo.
A Estradas de Cabo Verde lançou um Concurso Público Internacional para a escolha de um Consultor que irá avaliar o potencial e as possíveis opções de uma Parceria Público-Privada (PPP) para a Concessão da autoestrada Praia – Tarrafal.
A análise servirá para o governo tomar uma decisão, com base numa identificação precoce e na quantificação das fontes potenciais de receitas, custos e riscos da concessionária, uma análise de custo-benefício multicritério e um dimensionamento do impacto fiscal potencial para o executivo. Este é um estudo inicial e não para entrar em níveis detalhados de estudos técnicos e de viabilidade do modelo de PPP.
Só depois, o governo decidirá se avança para a realização de um estudo de viabilidade técnica, económico-financeiro, ambiental e social e uma eventual estruturação do projecto da PPP.
Para já, as análises devem comparar opções técnicas e demonstrar se a alternativa escolhida, em termos de layout e características técnicas e operacionais, oferece maiores benefícios do que outras em termos de custos; deve também confirmar se/qual é a lógica de custo/benefício para o projecto da via rápida, e fornecer estimativas do impacto financeiro do projecto em termos de impacto fiscal (direto e indireto) para o governo.
O estudo consistirá em (i) uma avaliação técnica, (ii) uma análise económica (análise de custo-benefício) do projecto da estrada e (iii) uma avaliação financeira das opções de PPP, incluindo uma estimativa do impacto fiscal de cada opção.
O Primeiro-ministro não tem dúvidas que “a ilha de Santiago precisa melhorar as conectividades e a mobilidade, nos domínios aéreos, marítimos, tecnológicos e terrestres. Conetividade terrestre através das acessibilidades para ligar localidades com as mais diversas centralidades, mas também através de uma via rápida, moderna e futurística Praia/Tarrafal, que viabilizará a ligação entre o norte e o sul da ilha”.
“A via rápida Praia/Tarrafal viabilizará um reordenamento completo do território da ilha, reduzirá substancialmente a migração interna na ilha de Santiago assim como as assimetrias regionais. Permitirá, por outro lado, que as infraestruturas e os investimentos em qualquer ponto da ilha sirvam toda a ilha, com impactos económicos, sociais e políticos importantes”, considera Ulisses Correia e Silva.
“Um investimento com este porte e com potencial para gerar externalidades para todo o país, como decorre das normas impostas pelo próprio Governo, requer estudos técnicos, económicos, financeiros e análises de impactos aprofundados, com completude e qualidade”, refere ainda o Chefe do governo.
Análise de Custo-Benefício e Processos de Avaliação Económica do Investimento Rodoviário
Segundo os termos de referência do concurso público, serão definidos os benefícios dos utilizadores conforme:
a) Benefícios directos: resultantes de investimentos que implicam a minimização dos custos de transporte, considerando a redução dos custos de operação dos veículos, bem como do tempo de deslocamento, dos custos de manutenção e do número de acidentes. Os benefícios aplicam-se ao tráfego normal, desviado e gerado.
b) Benefícios indirectos: resultantes do desenvolvimento social e económico da região devido aos investimentos rodoviários realizados. Os benefícios indirectos expressam-se em termos de crescimento líquido da produção local, valorização real dos imóveis localizados na área de influência da estrada, maior arrecadação de impostos e, sobretudo, evolução social, rendimento e adequada redistribuição da população residente na região estudada.
Além de um modelo de crescimento de tráfego, o consultor irá preparar um modelo financeiro de PPP, que deve incluir resultados padrão de boas práticas, como taxa interna de retorno económico, valor presente económico líquido, TIR financeira [Taxa Interna de Retorno, um percentual para avaliar se vale a pena investir num determinado projecto] e NPV [indicativo do valor de todos os fluxos de caixa futuros ao longo de toda a vida de um investimento], permitindo comparações entre as opções em análise.
A avaliação terá de analisar a adequação das opções de PPP à concretização deste projecto de investimento e deve ser capaz de responder às seguintes questões:
- Modelo de operação: com ou sem portagem para o utilizador. Seja no todo, ou em parte da extensão da via.
- Qual o modelo de remuneração da concessionária?
- Se as portagens são pagas pelos utentes e/ou adicionais e em que modalidade? Qual é a disponibilidade?
No fundo, como refere o Primeiro-ministro, é preciso “analisar a viabilidade técnica, económica e financeira, assim como propor o melhor traçado, o modelo de financiamento – utilizador pagador e/ou comparticipação do Estado –, o modelo de parceria público privada e de partilha e governança de riscos”.
Avaliação Financeira e PPP da Solução Escolhida
O objectivo deste componente, como se lê nos termos de referência do concurso público, é determinar se o investimento deve ser implementado por meio de uma PPP ou se deve ser implementado usando um modelo tradicional de obras públicas. Caso o modelo de PPP venha a ser considerado como a melhor forma de realizar o investimento, este componente do estudo deve estabelecer a estrutura básica da PPP.
O consultor deverá preparar uma matriz de atribuição de riscos. A lista de cenários e hipóteses será acordada com o Estado antes de realizar a análise. Um dos principais resultados será a identificação de opções estruturantes que tornem a solução proposta atrativa para o sector privado, cumpram os requisitos de financiamento público e minimizem os custos financeiros das contribuições do Estado.
As contribuições financeiras estimadas serão comparadas com o orçamento máximo disponível para o sector rodoviário. Se a solução não for avaliada como acessível, a análise recomendará opções realistas para o Estado (como selecionar uma solução menos dispendiosa).
Dado que o Estado provavelmente terá que contribuir financeiramente para o projecto, o consultor preparará uma revisão das despesas públicas do sector rodoviário para avaliar o espaço fiscal disponível durante a vigência da concessão. Esta análise será essencial para avaliar a adequação de qualquer solução (PPP ou com fundos públicos).
O Banco Mundial e as PPP
As parcerias público-privadas (PPPs) costumam ser vistas como a solução ideal para governos que equilibram orçamentos limitados e procuras crescentes de infraestruturas. Como refere o Banco Mundial, esta noção do sector privado a avançar com o dinheiro para financiar a construção e as melhorias nas infraestruturas rodoviárias, e depois a recuperá-lo através dos futuros pagamentos de portagens por parte dos utilizadores das estradas, “pode ser atraente para governos sem dinheiro em países desenvolvidos e em desenvolvimento”.
No entanto, avisa o Banco Mundial, a implementação de tais projectos muitas vezes não é tão simples quanto muitos governos imaginam. Um dos factores mais comuns que contribuem para essas falhas é o volume de tráfego (e as receitas resultantes) que acaba por ser significativamente diferente do que foi originalmente previsto.
Este risco de tráfego manifestou-se em muitos projectos, levando a falências, renegociações e intervenções dos governos. Devido a essas falhas, os financiadores privados tornaram-se cada vez mais avessos ao risco em projetos de PPP de estradas. Actualmente, muitos investidores apoiam apenas projectos que os protejam significativamente ou que transfiram esses riscos inteiramente para o governo.
É claro que as redes rodoviárias são críticas para o crescimento económico e as estradas são particularmente importantes nos países em desenvolvimento, onde mais de 70% da carga é transportada por via terrestre.
Mas as melhorias nas estradas também exigem grandes investimentos iniciais e grandes cargas financeiras de manutenção. Em Portugal, por exemplo, a autoestrada A24, no norte do país, com 155 quilómetros, equipada com viadutos, nós de ligação, pontes e túneis, custou, só para construir, cerca de 5 milhões de dólares por quilómetro.
Segundo o relatório Estrada com Portagem, PPPs, Identificar, Mitigar e Gerir o Risco de Tráfego, do Banco Mundial, a maioria das formas de PPP pode ser distinguida por duas características principais: o nível de investimento e envolvimento do sector privado na construção do activo e até que ponto os pagamentos do utilizador criam um fluxo de receita para o sector privado. E se a receita do privado depende parcial ou totalmente das receitas da portagem, a capacidade do sector privado de financiar o projecto depende fortemente da previsibilidade e confiabilidade dessas receitas.
Nas economias em desenvolvimento e emergentes, que experimentam um rápido crescimento económico e de automóveis, talvez haja uma propensão muito maior (e, na verdade, pressão) para tentar desenvolver os modelos de PPP “utilizador-pagador”. Isso acontece porque os orçamentos do governo geralmente são extremamente limitados e enfrentam uma variedade de procuras concorrentes (outras prioridades de gastos). Sob essas restrições fiscais, o aumento do investimento privado contra receitas futuras de portagem torna-se muito atraente, seja através do pagamento de uma renda ao governo (para compensar parte ou todo o investimento público num activo existente) ou de uma concessão (para compensar parte ou todo o investimento público num novo activo).
“A via rápida Praia/Tarrafal tem de ser concebida e executada, necessariamente, no âmbito de uma parceria público privada. Se os estudos vierem a comprovar a sua utilidade e impacto e a viabilidade técnica, económica e financeira, encontraremos, seguramente, investidores e financiadores privados para esta parceria”, explica o Primeiro-ministro ao Expresso das Ilhas.
“Avançando como acreditamos, haverá um antes e um depois da via rápida Praia/Tarrafal. Queremos, gostaríamos e trabalharemos para que ‘este depois’ seja o quanto antes possível”, conclui Ulisses Correia e Silva.
O concurso internacional vai até ao dia 12 deste mês. A duração prevista do estudo é de 80 dias após a adjudicação.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1118 de 3 de Maio de 2023.