Os autores do relatório "Financiar África: Onde está o dinheiro?", hoje divulgado, reconhecem a dificuldade em avaliar as necessidades financeiras devido à incoerência dos dados provenientes de diferentes fontes.
No entanto, defendem que o financiamento climático deve ser mantido separado do financiamento ao desenvolvimento.
"O financiamento da luta contra as alterações climáticas deve ser complementar e não apenas uma reclassificação do financiamento ao desenvolvimento já existente", lê-se.
O documento é o produto de contribuições de oradores de um evento da Fundação Mo Ibrahim que estava previsto para Abril na Nigéria, mas que foi cancelado devido à instabilidade naquele país.
Segundo o relatório, actualmente a Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) de doadores ocidentais representa quase 10% dos recursos financeiros do continente.
Esta ajuda é dirigida principalmente para a saúde e a educação devido às condições impostas pelos doadores, o que limita o seu impacto.
Como alternativa, os países africanos têm recorrido cada vez mais a financiamento de países não ocidentais, como a China, Arábia Saudita, Índia ou Rússia.
No relatório, a fundação alerta para o aumento dos custos relacionados com a dívida, que triplicaram desde 2009, e para a complexidade dos contratos.
Em 2022, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Djibuti foram os maiores beneficiários de APD per capita em África, enquanto Angola tem o custo mais elevado do serviço da dívida pública externa do continente, que ascende a 72,1% da sua despesa pública, segundo o relatório.
A solução poderá estar nos recursos internos, os quais, segundo a União Africana (UA), podem cobrir, em média, entre 75% e 90% das necessidades de financiamento da Agenda 2063, o plano da UA para alcançar um desenvolvimento socioeconómico inclusivo e sustentável em 50 anos.
A prevenção de fraudes através de Fluxos Financeiros Ilícitos (IFF) poderia aumentar os recursos até 100 mil milhões de dólares por ano (93 mil milhões de euros), refere-se no documento, ultrapassando tanto a APD recebida (81 mil milhões de dólares por ano, 75 mil milhões de euros) como as remessas enviadas para o continente (97 mil milhões de dólares por ano, 90 mil milhões de euros).
Os autores destacam a importância de tornar os sistemas fiscais mais eficientes, e de alavancar o impacto das remessas, fundos soberanos, fundos de pensões e riqueza privada.
Como exemplo, indicam que Tanzânia, Angola e Costa do Marfim estão a aumentar as receitas fiscais graças à digitalização ou introdução de novos impostos.
Por outro lado, reformas monetárias na Nigéria, Tanzânia e Angola estão a promover a estabilidade dos preços e o acesso a moeda estrangeira, aumentando a confiança de empresas, consumidores e investidores.
O relatório refere ainda o potencial da monetização dos activos verdes de África, incluindo a biodiversidade, minerais críticos e o potencial de captação de carbono para desbloquear recursos financeiros.
"Precisamos de uma mudança completa de paradigma. Não se trata de África vir ao mundo desenvolvido com uma mão a pedir esmola e os países desenvolvidos considerarem quanto mais podem prometer. O que está em causa é o uso de dinheiro de forma mais racional e não apenas mais dinheiro", afirmou o fundador e presidente da Fundação Mo Ibrahim, em comunicado.
O empresário e filantropo sudanês Mo Ibrahim vincou: "Temos de aplicar a boa governação para garantir que estes activos são adequadamente aproveitados para os melhores interesses dos nossos povos".