YouTube, o incentivo ao radicalismo

PorExpresso das Ilhas,18 mar 2018 11:06

​Criada para divulgação de vídeos, a rede do YouTube tem sido uma aposta cada vez maior dos grandes comunicadores. No entanto, segundo investigações do New York Times e do Wall Street Journal, tem sido também um dos grandes fomentadores do radicalismo de opiniões na sociedade actual.

Quem entra no YouTube, a maior rede social de vídeos do mundo, é recebido com uma grande selecção de conteúdos que podem interessar ao utilizador. Essa selecção torna-se óbvia ao fim de algumas utilizações quando os gostos do utilizador são já mais ou menos reconhecidos pelo algoritmo que controla aquela rede social através dos vídeos vistos anteriormente, canais subscritos ou vídeos assinalados como preferidos.

Recentemente, o New York Times teceu duras críticas ao YouTube ao afirmar, num artigo da autoria de Zeynep Tufekci, que aquele site funciona como “um grande radicalizador” da sociedade actual. Segundo a autora graças ao algoritmo de controlo do YouTube as versões da história são sempre dadas no mesmo sentido.

“Durante as eleições de 2016 tive de ver alguns vídeos de comícios de Donald Trump. A partir daí o YouTube começou a recomendar-me vídeos de extrema-direita, de negação do Holocausto, de supremacia branca. O mesmo acontecia com os vídeos em reprodução automática”, escreve Tufekci.

A jornalista resolveu, então, fazer uma experiência. “Criei uma segunda conta no YouTube onde comecei a ver vídeos de Hillary Clinton e Bernie Sanders, para ver onde me levava o algoritmo de controlo. Depressa tinha sido conduzida a vídeos de tendência conspiratória de esquerda que incluíam discussões sobre a existência de agências secretas governamentais e alegações de que o governo dos EUA estaria por trás dos ataques do 11 de Setembro”.

Em qualquer dos casos, recorda a jornalista do New York Times, o YouTube acabava sempre por recomendar vídeos cada vez mais extremistas e cada vez mais distantes daquilo que inicialmente procurara. E, em todos os temas, a mesma resposta, a mesma radicalização. “Vídeos sobre vegetarianismo conduziram a vídeos sobre o movimento vegan e vídeos sobre jogging conduziram a outros sobre como correr ultra-maratonas”, recorda Tufekci.

“Tendo em conta os seus mil milhões de utilizadores, o YouTube pode ser um dos maiores instrumentos de radicalização da sociedade do século XXI”, aponta.

Tufekci rejeita a ideia de uma cabala orquestrada pelos engenheiros que trabalham no YouTube preferindo apontar o dedo à forma como a Google, dona do YouTube, construiu o seu modelo de negócio e também à forma como a inteligência artificial (leia-se o algoritmo) que controla o site funciona.

“Apesar de toda a sua imponente retórica a Google é um negociante de publicidade que vende a nossa atenção a empresas que pagam por isso. Quanto mais tempo as pessoas estiverem no YouTube mais dinheiro a Google acaba por ganhar”.

Numa entrevista ao Wall Street Journal, um antigo engenheiro da Google, Guillaume Chaslot, explicou que trabalhou na construção do algoritmo de recomendação do YouTube e que se sentiu alarmado pelas tácticas usadas pela empresa para ‘obrigar’ os utilizadores a ficarem mais tempo no site.

Depois de ter sido despedido, em 2013, Chaslot ajudou o Wall Street Journal numa investigação ao conteúdo do YouTube. Conclusão: o YouTube frequentemente “disponibilizou conteúdos de extrema-esquerda ou de extrema-direita a utilizadores que usavam meios e canais de comunicação mais convencionais e que essas tendências extremistas eram evidentes com uma grande quantidade de material. “Se se procurasse informação sobre vacinas contra a gripe eram fornecidos vídeos sobre a conspiração anti-vacinas”, aponta o WSJ.

Outra teoria aponta para que o algoritmo que gere as recomendações no YouTube tenha uma tendência para conteúdo inflamatório, aponta o New York Times.

Na corrida eleitoral de 2016 Guillaume Chaslot criou um programa que seguia os vídeos recomendados pelo site assim como os padrões de recomendação e descobriu que independentemente de onde se começasse (seguindo Clinton ou Trump) “o mais provável era que, no final, se acabasse por ir parar a um vídeo de campanha de Donald Trump”.

“Combinando esta descoberta com outras pesquisas que mostram que, durante a campanha de 2016, as notícias falsas (fake news) incluíam muito mais vídeos favoráveis a Trump do que vídeos favoráveis a Clinton e a tendência do YouTube para os conteúdos incendiários parece mais do que evidente”, conclui Zeynep Tufekci.


Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 850 de 14 de Março de 2018.

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Autoria:Expresso das Ilhas,18 mar 2018 11:06

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  18 mar 2018 11:06

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