De acordo com a nova teoria, exposta num artigo publicado esta quarta-feira no boletim científico Astronomia e Astrofísica por Jamie Farnes, professor no departamento de engenharia científica da universidade britânica, o conceito de 'massa negativa' é descrito com a imagem de que se essa massa for empurrada irá acelerar no sentido inverso (negativo) ao da força sobre ela exercida.
De acordo com o artigo, esta nova perspectiva da composição do universo poderá também comprovar uma previsão teórica feita por Albert Einstein há 100 anos.
O modelo conceptual do Universo - denominado LambdaCDM - sobre o qual assenta a Física teórica actual postula que a totalidade da matéria visível (galáxias, planetas e todos os corpos celestes e poeiras estelares) representa apenas 5% da matéria e energia realmente existentes, com os 95% desconhecidos a serem classificados como 'matéria negra' e 'energia negra'.
Mas o modelo LambdaCDM não esclarece as características físicas dessa matéria e energia desconhecidas e invisíveis, cuja existência é postulada apenas a partir dos efeitos gravitacionais que exercem sobre a matéria observável.
"Pensamos agora que a 'matéria negra' e a 'energia negra' podem ser unificadas num fluído com 'gravidade negativa' que, em vez de atrair, repele todas a matéria em seu redor. Apesar de esta matéria ser conceptualmente estranha, sugere que o universo tem um equilíbrio, uma simetria entre forças positivas e negativas", diz Jamie Farnes no artigo.
O modelo teórico agora proposto produz também as primeiras previsões corretas do comportamento dos chamados "halos de matéria negra", conceito que explica como as galáxias se mantêm coesas apesar da sua extrema velocidade de rotação, que deveria gerar forças capazes de as desagregar. Os modelos teóricos vigentes recorrem à figura dos halos de matéria negra, que ao envolverem as galáxias as mantêm estáveis.
Na investigação publicada esta quarta-feira, os cientistas criaram um modelo matemático de simulação em computador das propriedades da 'massa negativa' que foi capaz de prever a formação de halos de matéria negra consistente com aqueles cuja existência em torno das galáxias é inferida através de observações com radiotelescópios.
Albert Einstein sugeriu pela primeira vez a existência de matéria indetectável no universo em 1918, há precisamente 100 anos, quando descobriu nas suas equações um parâmetro a que chamou a 'constante cosmológica', que hoje é designada como 'matéria negra'.
Numa afirmação que se tornou famosa, Einstein considerou a constante cosmológica a sua "maior gafe", mas observações astrofísicas modernas comprovaram que se trata de um fenómeno real.
Em apontamentos datados de 1918, Einstein descreveu a constante cosmológica escrevendo que "uma modificação da teoria é necessária para que a noção de 'espaço vazio' ocupe o lugar de massas gravitacionais negativas distribuídas por todo o espaço interestelar".
Os físicos teóricos actuais vêem na afirmação uma indicação de que o próprio Einstein considerava a existência de um universo onde a ausência de matéria seria preenchida por 'massa negativa'.
Jamie Farnes escreve no artigo publicado no boletim Astronomia e Astrofísica que "abordagens anteriores combinando 'energia negra' e 'matéria negra' tentaram modificar a Teoria Geral da Relatividade de Einstein, o que se provou extremamente difícil".
"A nova abordagem parte de duas ideias antigas comprovadamente compatíveis com a teoria de Einstein - massas negativas e criação de matéria - e combina-as. E o resultado tem uma 'beleza teórica' assinalável: 'energia negra' e 'matéria negra' podem ser unificadas numa única substância, gerando uma imagem do universo em que a matéria de massa positiva (a matéria convencional) flutua e 'surfa' num oceano de 'massa negativa'", explica.
A nova teoria é um edifício conceptual, mas os investigadores consideram que poderá ser comprovada na prática através de observações e experiências que virão a ser realizadas pelo futuro radiotelescópio designado SKA (Square Kilometre Array), um projecto internacional - em que Portugal participa através do Instituto de Telecomunicações e das universidades do Porto, de Aveiro, de Coimbra de Évora e de Lisboa e do Instituto Politécnico de Beja - para construir o maior radiotelescópio do mundo, com 2.500 antenas e capacidade para recolher dados de 40% do céu em cada observação.
"Ainda há muitas questões teóricas para serem trabalhadas e muitas simulações de computador para realizar, e o modelo LambdaCDM tem 'um avanço' de 30 anos (em relação ao modelo agora proposto), mas se esta nova teoria for validada por observações, o mistério dos indetectáveis 95% da matéria e energia que constituem o universo terá uma solução 'estética': tínhamo-nos simplesmente esquecido de incluir nas equações um simples sinal menos", conclui Jamie Farnes.