Os leões estão a mudar a sua estratégia de caça – por causa de uma invasão de formigas

PorExpresso das Ilhas,6 fev 2024 7:58

Formigas, outras formigas, elefantes… e haver árvores ou não. Eis a cadeia de relações que afecta o ecossistema dos Pantera Leo – e a sua estratégia de caça.

No Conservatório Ol Pejeta, no Quénia, o aparecimento de formigas-cabeçudas (Pheidole megacephala) está a mudar o ecossistema e a alterar as estratégias de caça dos leões.

Este fenómeno, detalhado num estudo publicado na revista Science esta quinta-feira passada, demonstra os efeitos em cadeia de uma espécie invasora em todo um ecossistema.

As Pheidole megacephala, espécie africana de pequenas, mas influentes formigas, perturbaram o equilíbrio ao superarem em competição as formigas acácias nativas do género Crematogaster.

Estas formigas nativas, conta o site zap.aeiou.pt, têm uma relação simbiótica com a espinhosa-de-assobio, (Vachellia drepanolobium), uma árvore comum na savana.

As Vachellia drepanolobium protegem as árvores dos elefantes, garantindo uma maior cobertura arbórea dos territórios de caça dos leões — um factor crucial para os seus métodos de caça.

A invasão das formigas-cabeçudas não é única no Quénia. Estas formigas causaram perturbações ecológicas na Austrália e em todo o Pacífico, incluindo as Ilhas Havaianas.

“O enorme impacto destas formigas é surpreendente”, diz à Scientific American Douglas Kamaru, investigador da Universidade de Wyoming e coautor do estudo. “E tudo começa com estas pequenas, minúsculas formigazinhas. Não subestimem estes bichinhos”.

Observações anteriores já tinham mostrado haver um declínio nas árvores espinhosas-de-assobio nos locais onde as formigas-cabeçudas prevaleciam.

Num estudo independente, publicado em 2019 na Ecology, uma outra equipa de investigadores tinha descoberto que o sucesso de caça dos leões aumentava com mais cobertura arbórea, uma vez que estes usam as árvores para preparar as suas emboscadas.

No novo estudo, a equipa de Kamaru tentou perceber se a invasão de formigas tinha afectado as práticas de caça dos leões – sabendo que os ecossistemas são complexos, com muitas espécies interligadas.

O estudo envolveu o rastreamento de seis grupos de leões com coleiras GPS no Conservatório Ol Pejeta, tendo sido analisados os locais de caça, categorizados em função da sua cobertura arbórea em relação com a presença de formigas e de presas disponíveis para caça.

Os investigadores usaram um método computacional designado “nested path analysis” para analisar então a influência de vários fatores nas taxas de abate de zebras. Em áreas com invasões de formigas, descobriram os investigadores, havia menos cobertura de árvores — e uma consequente diminuição no abate de zebras.

O estudo permitiu mostrar também que os leões estão a adaptar-se a estas mudanças: nas zonas em que a escassez de cobertura arbórea dificulta a caça à zebra por emboscada, os felinos começaram a caçar búfalos africanos — uma presa mais desafiadora, que requer táticas de caça cooperativa.

Assim, apesar da invasão de formigas, a população de leões manteve-se estável. Tal como sustenta Darwin, a Lei da Selva não é a do mais forte, mas a do que se adapta melhor.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1157 de 31 de Janeiro de 2024.

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Autoria:Expresso das Ilhas,6 fev 2024 7:58

Editado porAndre Amaral  em  6 fev 2024 7:58

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