Em conversa com o Expresso das Ilhas, o médico ginecologista, Maikel Rodríguez,sublinha que a Síndrome Ovário Policístico é, de facto, bastante complexa e heterogénea, ou seja, expressa-se de diferentes maneiras no organismo de cada mulher e, caso a paciente apresente três características indicadas na doença, esta costuma ser mais expressiva.
O que é a síndrome do ovário poliquístico?
O médico ginecologista obstetra Ricardo Santos explica que que todas as mulheres possuem hormonas ditas “masculinas” como testosterona, mas em muito menores quantidades do que as femininas. A síndrome do ovário poliquístico (ou policistico), no entanto, é caracterizada por um aumento relativo das hormonas masculinas, aumento da insulina e síndrome metabólica e alterações hormonais associadas com amenorreia (ausência de menstruação ou menstruações infrequentes).
“O desenvolvimento folicular normal não se dá ou dá-se raramente, parando nos estádios iniciais de desenvolvimento. Estes folículos são os quistos ou cistos que dão origem à denominação. As alterações hormonais são causa e simultaneamente efeito do desenvolvimento folicular desregulado", explica.
A Síndrome do Ovário Poliquístico (SOP no inglês Polycystic Ovary Syndrome — PCOS) é a patologia endócrina (hormonal) mais frequente em mulheres em idade reprodutiva, e segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) podendo atingir 5% a 10% deste grupo. Mulheres com SOP estão em risco de outras doenças por causa da patologia endócrina subjacente, pelo que devem ser acompanhadas nesse sentido.
O médico insiste que é importante esclarecer a diferença entre a síndrome do ovário poliquístico / policístico e a presença de múltiplos quistos (ou cistos) no ovário.
“Os quistos (ou cistos) no ovário são muito frequentes nas mulheres em idade reprodutiva, sendo habitualmente resultado do seu normal funcionamento, no contexto do ciclo menstrual. O facto de o nome da doença se basear no aspecto dos ovários na ecografia leva muitas vezes a confusão, pois este aspecto não implica uma alteração importante. Apesar do nome (Síndrome do Ovário Poliquístico), nem todas as mulheres afectadas têm vários quistos e nem todos os quistos múltiplos correspondem a esta doença”, clarifica.
Causas
O ginecologista Maikel Rodríguez aponta que a síndrome do ovário poliquístico é mais frequentemente em algumas situações como excesso de peso e obesidade, diabetes e em mulheres com familiares com a síndrome. Actualmente pensa-se que a síndrome do ovário poliquístico seja, pois, algo de causas genéticas (dos pais) e ambientais, mas o médico alerta que estudos ainda não estão concluídos neste sentido.
A resistência à insulina (algo associado à diabetes e à própria obesidade) desempenha um papel importante no seu aparecimento e parece estar na origem de muitas das alterações observadas.
Sintomas
Os sintomasda síndrome do ovário poliquístico, como aponta também o ginecologista Maikel Rodríguez, podem ser muito variados, tal como a apresentação da doença.
“A doença habitualmente não causa dor no abdómen (barriga), nem engorda, apesar de estar relacionada com excesso de peso e obesidade. Frequentemente, as mulheres com este problema apresentam Hirsutismo (demasiados pêlos ou pêlos em locais incomuns para as mulheres), excesso de peso ou obesidade, amenorreia ou oligomenorreia (ausência de menstruação ou menstruação infrequente) e infertilidade”.
O diagnóstico
Como referido, apesar do nome, nem todas as mulheres afectadas pela Síndrome do Ovário Poliquístico possuem quistos (ou cistos) e nem todos os quistos múltiplos correspondem à doença.
É frequente as mulheres com esta doença apresentarem nas análises laboratoriais hiperandrogenismo, ou aumento das hormonas sexuais tipicamente masculinas. Porém, a virilização não é frequente e deve colocar em causa o diagnóstico. Ou seja, não é comum, as hormonas causarem um aspecto mais masculino da mulher.
“Para efetuar o diagnóstico, dois dos três critérios necessitam estar presentes: a pouca menstruação (oligomenorreia) e, ou ausência de ovulação (anovulação), sinais clínicos e/ou laboratoriais de aumento das hormonas masculinas (hiperandrogenismo). Ovários poliquísticos e exclusão de outras explicações (doenças) para tal”, informou Maikel Rodriguez ao Expresso das Ilhas, acrescentando que de entre os exames realizados, podem ser frequentemente observados na ecografia, mais folículos pequenos (quistos) em cada ovário, bem como ovários com maior volume que o habitual. E também, ausência de sinais de ovulação em ecografias seriadas (seguidas), bem como ausência de alterações normais ao longo do ciclo menstrual normal e regular.
O médico sustenta que na maioria das situações de SOP, o prognóstico é bom. Dependendo da situação, uma avaliação com o médico, pode determinar-se o diagnóstico correcto e delinear um plano de tratamento, que depende do caso, nomeadamente se se pretende engravidar. Em vários casos, a síndrome pode ser curada.
Tratamento
Segundo o médico ginecologista obstetra Ricardo Santos, o tratamento da síndrome do ovário poliquístico deve ser individualizado, já que depende tanto dos sintomas como do estado geral da mulher, doenças e características identificadas e pretensões da mesma, nomeadamente em relação à infertilidade.
“Em geral, cerca de 40% a 50% das mulheres com SOP são obesas (possuem excesso de peso). Fazer uma dieta adequada (alimentação saudável) e praticar exercício físico de forma regular pode melhorar muito, e até resolver, algumas das consequências da síndrome, como a sub-fertilidade. A perda de peso pode levar, só por si ou associada a medicação, a um reinício de ciclos ovulatórios (menstruações regulares). Por este motivo, e se uma gravidez não for desejada, está indicado um aconselhamento com o médico acerca de contracepção eficaz (como tomar a pílula), pois a fertilidade pode aumentar".
A perda de peso pode ser considerada uma medida desejável por vários motivos, pelo que deve ser procurada, mesmo que não resolva completamente as queixas. Entre 5 a 10% de perda de peso traz, muitas vezes, mudanças significativas no perfil hormonal.
Uma simples pílula anticoncepcional combinada pode controlar os sintomas de androgenismo. Em mulheres obesas com mais de 40 anos (ou fumadoras), no entanto, é melhor que o seu uso seja aconselhado por um médico. Alternativas poderão ser um sistema intrauterino com progestativo (hormona) e uma pílula com progestativos apenas, ou mesmo o uso durante alguns dias do mês de um progestativo. Qualquer destes tratamentos tem a vantagem de controlar a espessura endometrial, prevenindo o aumento exagerado e prolongado dessa camada do útero (hiperplasia do endométrio).
A metformina é um medicamento que poderá ser uma opção para melhorar o perfil hormonal e reiniciar ovulação, sendo mais eficaz em conjunto com medidas gerais (emagrecimento e/ou indutores de ovulação). O seu papel é limitado e deve ser sempre aconselhada por um médico. A metformina, por si só não emagrece, mas pode ajudar a perder peso, com dieta e exercício físico.
O tratamento cirúrgico da síndrome do ovário poliquístico deve ser reservado para casos em que as medidas gerais e tratamento médico falharam.
Pílula anticoncepcional
O anticoncepcional hormonal combinado oral (AHCO) ou pílula anticoncepcional é um comprimido que contém uma combinação de hormonas, geralmente estrogénio e progesterona sintéticos, que inibe a ovulação. O anticoncepcional oral também modifica o muco cervical, tornando-o hostil ao espermatozóide.
A médica Idelmira Horta explica que as pílulas anticoncepcionais são pequenas doses de hormonas ministrada diariamente para impedir a ovulação.
“Algumas vantagens do uso da pílula: é um método contraceptivo que não interfere na relação sexual, o uso é por via oral, é um método não muito custoso, e o uso da pílula ajuda no combate aos acnes e ajuda a amenizar os sintomas da menstruação e da tensão pré-menstrual, e ajuda também no tratamento de várias anomalias como, por exemplo, o Ovário Poliquístico”.
Mitos e verdades sobre o uso da pílula anticoncepcional
O Expresso das Ilhas esteve numa ronda nos Centros de saúde da capital do país, nos serviços de Planeamento Familiar, para apurar, junto aos utentes, algumas crenças populares em relação ao uso das pílulas concepcionais.
Cíntia Pereira, 26 anos, conta que sempre ouviu que a pílula anticoncepcional pode acabar com o desejo sexual das mulheres.
A médica Idelmira Horta esclarece que “não há qualquer relação entre o uso desse contraceptivo com a perda do apetite sexual, porém eventualmente se houver interferência do anticoncepcional na concentração do hormônio testosterona, poderá haver uma diminuição, mas não há perda da líbido”.
Gilmara Cunha, 29 anos, questiona se é mito ou verdade que a pílula engorda.
“Em geral, não há indícios de que o efeito da pílula tenha alguma relação com o aumento do peso. O que pode ocorrer é uma retenção de líquidos maior levando a um inchaço, dependendo do hormônio que foi utilizado. Entretanto, isso não está relacionado ao aumento de células de gordura. Pode eventualmente ocorrer um aumento de apetite, e se a paciente optar por alimentos não tão saudáveis, isso sim, pode levar ao aumento de peso”, pontua a médica Idelmira Horta.
Keila Pereira, 27 anos, diz que adolescente que ainda não tiver filhos, não pode usar a pílula porque corre o risco de ficar infértil.
A médica Idelmira Horta explica que, por a pílula ser uma dose diária de hormonas consumidas pela mulher, é um mito de que possa causar infertilidade nas adolescentes.
“Por ser uma dose diária de hormônios, é indicado para as mulheres que querem ter filhos num espaço curto de tempo. Assim que é parado o uso, a mulher volta a ovular normalmente, tanto é que a pílula deve ser consumida todos os dias de preferência na mesma hora, podemos ver que se for consumida irregularmente a mulher pode engravidar, porque não tem efeito a longo prazo”.
Edna Andrade, 51 anos, pergunta se é verdade que a pílula consumida durante vários anos pode acumular-se na parede do útero?
“É um mito que a pílula se acumula no útero e depois a mulher precisa fazer uma raspagem para engravidar. A pílula, para explicar de uma maneira simplificada, é consumida por via oral e vai para o estômago. O princípio activo que inibe a ovulação é absorvido no intestino e actua numa glândula no crânio que estimula a ovulação. Então a pílula nunca vai chegar ao útero e se acumular na parede dele”.
Texto publicado originalmente na edição nº1089 do Expresso das Ilhas de 12 de Outubro