O anúncio feito pelo primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, esta segunda-feira, caiu como uma bomba: o rei Juan Carlos abdicava a favor do seu filho, o príncipe Felipe. Pouco depois o monarca explicou, em breve declaração à Nação a razão desta decisão. “Uma nova geração reclama pelo papel protagonista para enfrentar com renovada intensidade os desafios”, disse. E estes não são poucos, a começar pela quebra de confiança de muitos espanhóis na monarquia.
Juan Carlos terá decidido abdicar no dia 5 de Janeiro, data em que completou 76 anos. Entretanto decidiu protelar o anúncio público para depois das eleições europeias. Assim, esta segunda-feira, em discurso à nação, o rei explicou os motivos do seu afastamento. Na mensagem, onde é clara a vontade de trazer sangue novo para a frente da monarquia espanhola, Juan Carlos recorda as quase quatro décadas do seu reinado. Fala do orgulho de se ter cumprido o desígnio de transformar Espanha numa “democracia moderna, plenamente integrada na Europa” e da gratidão que sente pelo apoio dado pelos cidadão para tornar o seu reinado “um longo período de paz, liberdade, estabilidade e progresso”.
Depois veio a crise, que ainda persiste e que “deixou graves cicatrizes no tecido social”. Porém esta carrega consigo, a esperança, destaca.
“Na preparação desse futuro, uma nova geração reclama com justa causa o papel de protagonista, o mesmo que correspondeu numa conjuntura crucial da nossa história a geração a que pertenço”, salientou.
Estava feita a introdução para a passagem da coroa a “uma geração mais jovem, com novas energias”, isto é, ao seu filho Felipe. Segundo o rei-pai, o herdeiro da coroa, “encarna a estabilidade, que é o sinal da identidade da instituição monárquica”.
O Governo espanhol reuniu-se ontem numa reunião extraordinária para tratar de assuntos relacionados com a sucessão, sendo que a tramitação institucional poderá demorar entre três e seis semanas, calcula a Casa Real.
Felipe VI
“O príncipe das Astúrias tem a maturidade, a preparação e o sentido de responsabilidade necessários para assumir com total garantia a chefia do Estado e abrir uma nova etapa de esperança em que se combinem a experiência adquirida e o impulso de uma nova geração”, dizia o Rei no seu discurso.
Aos 46 anos, Felipe de Borbón será assim proclamado Felipe VI, o novo rei de Espanha.
Felipe é um príncipe popular entre os espanhóis: 66.4% tem uma opinião positiva sobre o herdeiro. Uma percentagem ainda mais importante quando se vê o desapontamento com a actual situação da monarquia, e a necessidade da mudança que ora ocorre.
De acordo com uma sondagem publicada em Janeiro no El Mundo, 62% defendia a abdicação do Rei Juan Carlos. Também o El País, lançava em Setembro um inquérito que mostrou que 53% dos espanhóis desaprovava a maneira como o rei conduzia os seus assuntos. A Coroa enquanto instituição recebia nota negativa: 3.72/10.
Um artigo escrito também no El País, destaca que Felipe não tem o carisma directo de Juan Carlos, mas é um democrata convicto e adepto da constituição. “Um homem do seu tempo amante de consensos e perfeitos equilíbrios de poder.” Dele é esperada uma monarquia mais moderna e mais transparente, mais próxima das exigências dos cidadãos do século XXI”.
Contra a monarquia
A abdicação é o culminar de um ano terrível para a monarquia espanhola. Pela primeira vez na história, um membro directo da família real foi ouvido por um juiz. A protagonista foi a infanta Cristina, interrogada no caso de corrupção Nóos, no qual estará alegadamente envolvido o esposo, Iñaki Urdangarin.
Mas foi o incidente no Botswana, em 2012, onde o rei foi caçar elefantes em plena crise económica e financeira, que mais descrédito trouxe ao Rei pai. Juan Carlos, que desde que assumiu o trono, em 1975, depois da morte de Franco e por desígnio do ditador, conseguira manter uma boa imagem junto ao povo, viu assim a sua popularidade diminuir drasticamente.
Apesar disso, a monarquia espanhola tem um apoio «muito maioritário», defendeu ontem o Primeiro-ministro Rajoy.
No dia anterior, imediatamente após o anúncio de abdicação, surgiram as primeiras reacções a pedir que a monarquia seja reavaliada.
Em Espanha, mas também em outros países, junto às embaixadas e consulados, dezenas de manifestações foram convocadas “pela República” , solicitando um referendo à continuação da monarquia.
“Depois da abdicação do rei da Espanha, o seu filho mais velho (e masculino) será declarado o novo Rei, por herança. Dada esta anormalidade democrática, as redes sociais responderam convocando protestos em todo o país para pedir um referendo sobre a monarquia”, refere uma das notas distribuídas, citada pelo Público.
“Chegou o tempo de um processo constitucional e uma democracia real”, lê-se ainda no texto.
As manifestações têm apoio de alguns partidos políticos da oposição como a Izquierda Unida e o partido Podemos, criado há três meses e que elegeu cinco eurodeputados nas últimas eleições.