Mare Nostrum, cheio de mortos

PorExpresso das Ilhas,14 jul 2014 0:00

O drama da migração para a União Europeia assume proporções trágicas. Nos últimos meses centenas de migrantes perderam a vida tentando aportar na costa italiana. O mais recente relato chocante dá conta de 30 mortos encontrados numa embarcação que transportava quase 600 pessoas. Alegadamente, terão morrido asfixiados. Passou-se no último fim-de-semana de Junho, o mês em que, em apenas dois dias, 5000 migrantes foram resgatados.

 

Os migrantes africanos continuam a tentar chegar aos milhares a solo europeu. E, nessa tentativa, vão-se somando as mortes dos que não resistem às péssimas condições e falta de segurança das embarcações em que viajam. 

No fim-de-semana de 27 a 29 de Junho, pelo menos 5000 pessoas empreenderam essa travessia, de África para a Itália, tendo sido resgatados pela marina desse país. Mas o resgate chegou tarde para alguns.

A bordo de um pequeno barco de madeira, com apenas 30 metros de comprimento seguiam perto de 600 pessoas. Foi aí que a polícia marítima encontrou 30 imigrantes mortos. A causa terá sido asfixia, devido à sobrelotação da embarcação. Ou talvez afogamento. Não se sabe ao certo. O rasto dessas vítimas perde-se, nas paragonas das notícias, antes de feita a autópsia.

Desde o passado mês de Janeiro, a marina de Itália já resgatou 67.696 pessoas que tentavam atravessar o canal da Sicília, de acordo com números oficiais lançados em Junho. O número é um recorde, superando já o ano de 2011, quando foram registados 63 mil resgates.

 

Tragédia ignorada

Depois da tragédia de Outubro, a Itália lançou um dispositivo de resgate permanente, chamado Mare Nostrum. A iniciativa, refere o El País, pouca ajuda recebe da União Europeia, ficando Roma com a responsabilidade quase por inteiro.

“A Europa diz-me tudo sobre como tenho de pescar peixe espada, mas não me ajuda a salvar as crianças no Mediterrâneo”, denunciou recentemente ao El País o primeiro-ministro italiano Matteo Renzi.

A UE tem continuamente ignorado os pedidos de ajuda de Itália que não tem mãos a medir para fazer face a este problema. O Papa Francisco já se uniu aos apelos do governo italiano. Perante este drama que todos conhecem mas sobre o qual tem sido feito muito pouco, o Papa resumiu:  ”é uma vergonha”.

 

Ajuda a caminho

De acordo com a comissária para os Assuntos Internos da Comissão Europeia, Cecilia Malmström, serão dados quatro milhões de euros ao país, para ajudar a resolver esta emergência humanitária.

“Estas novas mortes ilustram claramente que os traficantes (de pessoas) e os criminosos não tem nenhum respeito pelas vida humanas e que temos de incrementar imediatamente os nossos esforços para lutar contra as suas actividades mortíferas”, disse ainda.

Em Maio, as autoridades italianas detiveram dois suspeitos de tráfico de pessoas. Os homens, que são da Tunísia, foram capturados após terem sobrevivido a um naufrágio de um barco líbio que matou 17 pessoas. Na mesma altura, as autoridades, citadas pelo Estadão, informaram também que seis egípcios foram presos na Sicília como suspeitos de traficar centenas de imigrantes da costa da Líbia.

Entretanto, o recém-escolhido presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker declarou que está a analisar a possibilidade de criar um comissariado especial para tratar o tema da imigração. “A questão será discutida após 16 de Julho”, declarou Juncker, referindo-se à data em que será formalmente empossado, cita a Agência italiana de notícias, ANSA.

 

Frontex impotente

Há cerca de duas semanas, segundo o El País, o governo italiano pediu um maior contributo da Frontex (Agência Europeia de Gestão das Fronteiras Externas) e instou as Nações Unidas a intervirem na Líbia, onde, diz a mesma fonte, os traficantes cobram mil euros pela travessia para a Europa. A afluência de imigrantes disparou com a queda de Khadafi em 2011, sendo que muitos africanos de diversas origem rumam para Itália a partir desse país.

Dados da Frontex referem que, em 2013, mais de 40.000 pessoas entraram na União Europeia, de forma irregular, através do canal da Sicília. Quase 10.000 procediam da Eritreia, 9.000 da Síria e mais de 4.000 da Somália.

Numa outra análise, em 2012, e segundo o relatório da Frontex - agência europeia para a segurança das fronteiras exteriores do território comunitário - , a entrada de imigrantes sem papéis na União Europeia diminuiu 49%, quando comparada com o ano anterior. Tal representou a maior descida registada pelas autoridades comunitárias, sendo que pela primeira vez, desde 2008, o número de imigrantes ilegais se situou abaixo dos 100 mil (72.430 contra os 141.051 de 2011).

Pela zona do Mediterrâneo Central houve uma diminuição de 82% na entrada de imigrantes, sendo que 10379 entraram na EU, pela Itália. Ainda em 2012, devido à guerra civil na Síria, o número de sírios que tentaram entrar em território comunitário europeu quintuplicou em comparação com o ano transacto.

 

Um Outubro fatídico

Outubro de 2013 foi provavelmente o mês mais fatídico da migração para a União Europeia. Quase 400 imigrantes africanos perderam a vida em dois naufrágios junto à ilha italiana de Lampedusa.

No primeiro naufrágio, logo no início do mês, faleceram 359 pessoas, entre elas 16 crianças. Numa embarcação, que havia zarpado da Líbia, seguiam aproximadamente 500 migrantes somalis e eritreios, inclusive muitas crianças e algumas mulheres grávidas. Perto da Costa, e segundo contou à imprensa um dos náufragos, acenderam uma fogueria para chamar a atenção. Mas o barco estava sujo de gasolina e em poucos segundos o fogo propagou-se e consumiu a embarcação. Apenas 150 pessoas foram resgatadas com vida. As restantes ou morreram ou foram dadas como desaparecidas. Cerca de metade eram mulheres e crianças.

Em desespero a presidente da Câmara de Lampedusa disse ao então Primeiro-ministro, Enrico Letta: “o mar está cheio de mortos. Venha aqui olhar o horror na cara”.

Uma semana depois, ainda com o mundo em estado de choque, uma nova. Mais de 30 pessoas, entres as quais uma dezena crianças, morreram após mais um naufrágio, em águas internacionais - a 105 quilómetros da Lampedusa - de uma embarcação com cerca de 250 imigrantes de nacionalidade eritreia e somali a bordo. Desta vez, o alerta foi dado pelas autoridades maltesas, que também ajudaram nas buscas.

A tragédia aconteceu depois de uma intensa noite em que a guarda costeira italiana havia já socorrido mais de 500 imigrantes em dificuldades, no estreito da Sicília.

Uma gigantesca operação de salvamento está em curso ao largo da ilha de Lampedusa, em Itália, para resgatar os ocupantes de um navio que naufragou ao final da tarde a cerca de 70 milhas da costa europeia.

Estes foram os casos mais mediáticos, devido ao elevado número de vítimas e curto intervalo entre ambos. Mas aparecem pontualmente outros relatos de mortandade. Em Agosto, de 2013, por exemplo, seis jovens migrantes, todos com menos de 30 anos morreram afogados ao tentar alcançar a costa da Sicília. Segundo a primeira reconstrução dos factos, citada pelo JN, o pesqueiro que transportava 98 pessoas, encalhou num banco de areia e os ocupantes acreditaram terem chegado à costa, lançando-se então ao mar e pensando que poderiam alcançar a praia a pé. A tragédia ocorreu a cerca de 15 metros da praia da cidade de Catânia, no Leste da ilha italiana.

 

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Autoria:Expresso das Ilhas,14 jul 2014 0:00

Editado porExpresso das Ilhas  em  31 dez 1969 23:00

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