China expande-se pelo Ártico e abre a sua primeira base militar no exterior

PorExpresso das Ilhas,22 jul 2017 6:02

O gigante asiático continua a expandir-se pelo mundo. Pequim tem apostado na compra de portos no exterior, tendo gasto, só no ano passado, 20 bilhões de dólares, avança o Financial Times. O círculo Ártico integra agora as rotas chinesas. No campo militar a China inaugurou a sua primeira base militar no estrangeiro no que alguns analistas vêem como um apresentar de factura depois das ajudas económicas.

 

À medida que o alcance da China, enquanto potência marítima aumenta, aumenta também a aquisição de portos no exterior. De acordo com uma reportagem do Financial Times, no ano passado, os investimentos nessa área duplicaram, e Pequim avançou com os seus planos para a abertura de novas rotas marítimas através do círculo Ártico (ver imagem).

O investimento tem sido feito em portos localizados em torno de três “passagens económicas azuis”, que, recorda a mesma publicação, em Junho foram consideradas por Pequim como cruciais para o sucesso da sua estratégia “One Belt One Road” (“Um Cinturão, uma Estrada”).

Esta ambiciosa estratégia visa instituir-se como uma nova “rota da seda” e revolucionar o comércio mundial. Mas acima de tudo é vista como uma grande ofensiva diplomática, para conquistar aliados diplomáticos e mercados abertos em cerca de 65 países entre a Ásia e a Europa. A estratégia tem sido comparada ao Plano Marshall, mas as intenções por trás da mesma têm também levantado reservas.

Entretanto, a expansão continua. Até Junho, empresas chinesas tinham então anunciado os seus planos de comprar ou investir em nove portos no exterior, em projectos avaliados em 20,1 bilhões de dólares, conforme apurou um estudo do Grisons Peak, um banco de investimento com sede em Londres, citado pelo FT. Além disso, estão em curso negociações para investimentos em vários outros portos, para os quais nenhum valor foi divulgado.
Atendo a esses valores verifica-se, pois, uma aceleração acentuada em projectos portuários no exterior, que no ano passado eram de 9,97 bilhões de dólares, segundas as estimativas do FT.

Mas para o PCA do Grisons Peak isto não é de estranhar. “No ano passado, a China anunciou… as suas três passagens económicas azuis, por isso não é surpresa ver esse nível significativo de aumento do investimento em portos e transporte marítimo “, disse Henry Tillman.

Uma das três rotas, que vai da China para o Oceano Índico e depois para o Mediterrâneo, aparece em destaque.

Na Malásia estão programados  investimentos em quatro projectos portuários diferentes e na Indonésia, está previsto um investimento na expansão do maior porto do país. No total, mais de 12 bilhões serão investidos. Acredita-se que nestes projectos haja o intuito diplomático de criar boas relações com os países vizinhos da região, mas a política expansionista e algumas questões referentes à soberania colocam os projectos sob alguma desconfiança.

As atenções também estão voltadas para a rota marítima da China para a Europa, via Oceano Ártico, que poderia reduzir o tempo de viagem por vários dias. Aqui, de acordo com o FT, está planeado um projecto que envolve um porto de águas profundas perto de Arkhangelsk, no Mar Branco da Rússia, e uma ferrovia que entra pela Sibéria. O investimento em ambos será liderado pela empresa estatal Poly Group.

Também o porto lituano de Klaipeda, que suporta o tráfico de rotas do Ártico, atraiu propostas de investimento da China Merchants, um operador de portos, para construir um grande porto de contentores. E houve também conversações sobre possíveis investimentos portuários chineses em Kirkenes, um porto norueguês no Mar de Barents e em dois portos da Islândia, escreve o FT, citando fontes próximas às negociações.

Ora, alguns dos investimentos portuários levantam dúvidas sobre as verdadeiras intenções de Pequim. A pergunta colocada é se, por detrás do comércio, não haverá uma agenda estratégica não declarada.

“Estrategicamente, a posse de portos abre portas para actividades não-comerciais, como hospedar forças militares e reunir informações”, disse, ao FT, Jonathan Hillman, director do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. Porém, considera o mesmo especialista: “Além da estratégia global, há também um pouco de política. Grupos de interesse na China e nos países parceiros estão ansiosos para participar de novos projectos, e agora eles podem fazê-lo sob a ampla bandeira da iniciativa “Belt and Road” da China “.

 

Djibouti, palco multinacional de bases militares

 

Com o anúncio na passada semana da abertura de uma base naval da República Popular da China (RPC) no Djibuti, este país passa agora a albergar instalações militares de cinco nações: Estados Unidos, França, Arábia Saudita, Japão e China. A sua localização geográfica, entre o Mar Vermelho e o Golfo de Áden, no cruzamento de uma das mais importantes vias marítimas do comércio internacional e, num plano geoestratégico mais vasto, entre a Europa e a Ásia, explicam a razão desta escolha.

Em 2016, mais de vinte mil navios passaram ao largo do Djibuti assim como 10% do total dos hidrocarbonetos, sendo que 10% do tráfego naval tem o Japão como destino. Também a maior parte do comércio da RPC com a União Europeia, estimado em 870 milhões de euros por dia no ano transato, transita pelo Golfo de Áden e Mar Vermelho, além de mais de 60% do petróleo do Médio Oriente para a RPC. Estes dados ajudam a explicar o forte envolvimento dos dois países nas missões de patrulhamento ao largo da vizinha Somália contra os piratas - menos activos atualmente - e o facto de as suas únicas bases militares no exterior se situarem no Djibuti.

A localização geográfica confere ao Djibuti particular relevância, situando-se numa região de conflito permanente. Além da Somália, onde operam as milícias Al-Shabaad, ligadas à Al-Qaeda, que tem realizado ataques não só neste país como no vizinho Quénia, outro ponto de conflito é o Iémen, com a guerra civil entre os Houthi, apoiados pelo Irão, e o governo do presidente Abdrabbuh Mansour Hadi, que tem como aliado a Arábia Saudita.

A presença das bases é também explicada pela estabilidade política do país que está, no entanto, de algum modo ameaçada pela pressão crescente de migrantes e refugiados provenientes dos países vizinhos e outros locais. Em 2016, estimou-se que cerca de cem mil pessoas tenham passado pelo Djibuti, onde existem três campos para refugiados, ainda que estes prefiram prosseguir viagem ou integrarem-se na economia informal do país. A guerra civil no Iémen só contribuiu para aumentar a pressão sobre o Djibuti, país pobre em recursos e onde o desemprego atinge valores acima dos 50% da população activa. O clima quente e seco faz com que a actividade agrícola esteja longe de suprir as necessidades alimentares da população. Esta depende da assistência externa para sobreviver.

Existem ainda recursos minerais não explorados e que constituem uma das apostas a médio prazo para desenvolver a economia. Segundo o Banco Africano para o Desenvolvimento, em 2016, o setor mineiro representou menos de 3% do PIB nacional. Perante este quadro, o arrendamento de terrenos para bases acaba por constituir - com as atividades portuárias - a principal fonte de rendimentos do país.

Só Washington paga mais de 60 milhões de dólares por ano pela sua base, que é também a maior no Djibuti, e a única permanente dos EUA em África. Por seu lado, a RPC estaria a pagar 20 milhões de dólares. Além dos cinco países, desde 2014 que se fala na possibilidade de a Rússia ter instalações militares no Djibuti e o Irão teria sondado as autoridades djibutianas, sem sucesso.  

 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 816 de 19 de Julho de 2017

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Autoria:Expresso das Ilhas,22 jul 2017 6:02

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  23 jul 2017 13:31

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