STF aponta "desafio" de Moro para explicar ligações à presidência

PorExpresso das Ilhas, Lusa,19 nov 2021 7:24

O juiz do Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro Gilmar Mendes considera que o ex-juiz e eventual candidato à presidência Sergio Moro tem "um desafio" de explicar em campanha as ligações antes de entrar na política.

"Eu tenho a impressão de que essa vai ser uma explicação que, certamente, ele [Sergio Moro] terá que dar, desde a opção que fez de servir ao governo Bolsonaro", afirmou, em entrevista à Lusa, um dos organizadores do Fórum Jurídico de Lisboa, que terminou na quarta-feira na Faculdade de Direito.

Lembrando que Moro não é um caso único no Brasil de magistrados ou membros do Ministério Público que saem da carreira para se dedicarem à política, Gilmar Mendes citou outros exemplos, como o da juíza Selma, do seu estado do Mato Grosso, também da área criminal.

"Era chamada a 'Moro' do Pantanal" e a sua candidatura "também terminou de forma melancólica, porque se verificou que já durante a sua actividade como magistrada exercia uma actividade política e já recebia recursos para fazer a campanha", referiu.

Mas, considerou que "tudo isto é bastante complicado" e defendeu a criação de uma lei da ineligibilidade, que, no entanto, não espera ver aprovada durante esta legislatura.

Com uma certa ironia, porém, referiu que a opção de Sergio Moro "de fazer política nos partidos políticos, pelo menos é a opção correcta".

"É melhor do que fazer política estando no judiciário", acrescentou.

Assim, "certamente, [Moro] vai discutir com os políticos, no campo da política e não usando dos poderes soberanos do Estado, prendendo inimigos políticos, favorecendo eventuais amigos políticos", sublinhou.

Quanto às consequências para a operação Lava Jato da eventual candidatura de Moro, Gilmar Mendes afirmou que a maior operação anticorrupção no país "já sofreu um certo esvaziamento, além de um certo descrédito a partir da revelação, do episódio das comunicações, do telegrama chamado Vaza a Jato".

"E o próprio judiciário começou a fazer talvez uma autocrítica mais forte desse episódio", apontou.

"A própria Procuradoria-Geral, sob nova gestão, tem sido muito crítica em relação ao modelo de força tarefa e a tudo o mais", referiu.

Mas as consequências económicas e políticas da Lava Jato foram muito sérias, e fala-se que "trouxeram também muitos prejuízos à própria economia e às próprias empresas", realçou. "Certamente nós não conhecemos tudo o que ocorreu, mas todos os desdobramentos não são bons", acrescentou.

"O facto de Moro deixar uma vara federal e assumir o Ministério da Justiça de um Governo de um Presidente que se beneficiou da prisão do adversário, prisão que foi por ele decretada, obviamente que não é um facto positivo", afirmou o juiz STF.

Depois, Moro "deixa o Governo e vai trabalhar numa empresa americana, que presta serviços, inclusive de gestão falimentar [de falências], na recuperação judicial, que é a gestora de empresas que foram quebradas pela Lava Jato", revelou.

"Portanto, toda essa história, certamente é uma boa oportunidade de ele [Moro] explicar isso na campanha", o que considera ser "um desafio" para o candidato.

"Há muitas teorias conspiratórias sobre isto", que a operação Lava Jato foi "estimulada pelos americanos", para desta forma retirarem as empresas brasileiras do cenário internacional de concorrência, referiu Gilmar Mendes.

"Esse debate certamente virá, inclusive a partir desse emprego que ele [Sergio Moro] conseguiu de uma empresa americana de consultoria e que presta esse tipo de serviço mundo afora", frisou.

Apesar disto, considerou que a operação Lava Jato teve "méritos no que diz respeito a muitas revelações e ao combate à corrupção, mas certamente vai ter a pecha de falta de imparcialidade".

Assim, na sua opinião, "muitas coisas serão anuladas, outras não" e "isso tem que ser avaliado topicamente".

Quanto à passagem de magistrados para a política "é uma questão bastante delicada" e "não é bom para o judiciário nem para o sistema de justiça", vincou.

Por isso, defendeu que seja feita "uma avaliação" desse problema.

No entanto, sobre quando poderá avançar essa lei, Gilmar Mendes referiu que há uma discussão no Congresso Nacional "de tornar esses personagens que exercem essas funções, que muitas vezes são muito visíveis, inelegíveis, por um período, que fosse seis, oito anos, de modo a que a memória do público já fosse atenuada, se eles tivessem de facto vocação política e quisessem fazer a política".

Mas para o juiz do STF é um debate que "não é fácil de ser implementado, porque juízes e promotores dirão e porque não os oficiais da polícia?".

"Hoje temos muitos policiais na actividade política, e que deixaram o cargo", frisou. Então, a questão é porque não abranger também "o delegado que actua numa operação muito rumorosa e que depois então se lança candidato".

Por agora, tudo não passa de uma medida que "está em amadurecimento no Brasil", porque casos como os que citou e o de Sergio Moro "não ajudam a justiça e os próprios atingidos, condenados, certamente fazem cobrança em torno desse tema".

E, apesar de tudo, não acredita que a medida possa ser aprovada nesta legislatura.

A lei de inelegibilidade "estabelece as condições para alguém não ser elegível por um período, sem que isso seja uma sanção, é apenas uma condição de vida, deixou a magistratura, mas fica oito anos sem poder se candidatar", concluiu.

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Autoria:Expresso das Ilhas, Lusa,19 nov 2021 7:24

Editado porAndre Amaral  em  21 ago 2022 23:28

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