A acção da empresa de contabilidade Mazars USA acontece no decurso de investigações criminais e civis à Trump Organization, que decorrem em Nova Iorque perante a possibilidade de ter inflacionado o valor dos activos do grupo empresarial para conseguir vantagens financeiras.
Numa carta enviada à Trump Organization a 09 de Fevereiro, a auditora notificou a empresa da sua decisão de deixar de prestar os seus serviços, revelando também que já não podia garantir que fossem correctas as contas que havia preparado para a empresa do antigo presidente norte-americano entre 2011 a 2020, com base na informação fornecida pela empresa.
A carta de Mazars, tornada pública na segunda-feira no âmbito de uma acção judicial, surge apenas algumas semanas depois de a Procuradora-Geral de Nova Iorque, Letitia James, afirmar que os seus investigadores tinham descoberto provas de que Trump e a sua empresa usaram valores "fraudulentos ou enganadores" dos seus campos de golfe, arranha-céus e outras propriedades para conseguir empréstimos e benefícios fiscais.
"Ainda que não tenhamos concluído que as várias declarações financeiras, como um todo, contenham discrepâncias materiais, com base nas circunstâncias totais, acreditamos que o nosso conselho para que não continue a confiar nessas declarações financeiras é o correto", escreveu o conselheiro geral da Mazars, Wiliam Kelly, ao seu homólogo na Trump Organization, Alan Garten.
Kelly afirmou que a Mazars desenvolveu o seu trabalho relativamente às declarações financeiras de Trump "de acordo com padrões profissionais", mas já não pode defender os documentos, tendo em conta as descobertas da Procuradora-Geral de Nova Iorque e a sua própria investigação.
A declaração da Mazars tem efeito para as declarações entre 2011 e 2020, tendo a declaração de 2021 sido preparada por outra auditora, segundo os documentos judiciais.
Kelly também informou Garten que a sua auditora não poderia continuar a trabalhar com Trump devido a um conflito de interesses e incitou-o a procurar outro contabilista, distanciando a Mazars do seu mais reconhecido cliente e actividade que está no centro das investigações.
Em comunicado, a Trump Organization declarou-se "desapontada pela Mazars ter escolhido seguir caminhos separados", mas salientou a carta como algo positivo, notando que a auditora não encontrou discrepâncias materiais nas declarações financeiras de Trump.
O gabinete de Letitia James incluiu uma cópia da carta no processo que deu entrada em tribunal, numa altura em que a Procuradora-Geral estadual procura forçar uma intimação para levar Trump e os seus dois filhos mais velhos a testemunhar sob juramento na sua investigação civil às suas práticas empresariais.
A Procuradoria Distrital de Manhattan está a desenvolver uma investigação criminal paralela.
O juiz do tribunal estadual Arthur Engoron está escalado para ouvir os argumentos relativos à intimação na próxima quinta-feira.
A Procuradora-Geral não desencadeou nenhuma acção legal contra Trump, mas defende que a sua investigação de quase três anos encontrou provas suficientes de conduta ilícita para exigir que Trump, Donald Jr. e Ivanka respondam a perguntas sob juramento.
Na tentativa de travar a intimação, os advogados de Trump argumentaram que qualquer testemunho dado pelo ex-presidente e pelos seus filhos no âmbito da investigação civil pode ser usado contra eles na investigação criminal paralela.
Trump usou as declarações financeiras junto de bancos para garantir centenas de milhões de dólares em empréstimos para propriedades como um edifício de escritórios em Wall Street e um campo de golfe na Florida, mas também para justificar o seu lugar nas listas dos mais ricos do mundo em revistas financeiras.
Numa acção judicial no mês passado, o gabinete de Letitia James detalhou várias situações nas quais Trump declarou erradamente o valor de bens em declarações financeiras entregues a bancos.
O Deutsche Bank aceitou as declarações financeiras de Trump sem objecções num acordo para empréstimos de 300 milhões de dólares para três das suas propriedades e, num memorando interno, enfatizou a força financeira de Trump para justificar a concessão do empréstimo, segundo o gabinete da Procuradora-Geral.
Outro banco declarou ter recebido declarações financeiras em 2014 que atestavam que Trump possuía bens no valor global de 5,8 mil milhões de dólares e tinha uma liquidez de 302 milhões de dólares. Um elemento do banco envolvido no empréstimo disse a James que o empréstimo não teria ido para a frente se houvesse conhecimento do real valor dos bens de Trump.
Segundo o antigo advogado pessoal de Trump, Michael Cohen, o ex-presidente norte-americano tem um historial de declarações erradas sobre o valor dos seus bens, inflacionando-o em alguns casos e minimizando-o em outros, para assegurar condições favoráveis em empréstimos e impostos.