“Às vezes há uma atenção concentrada sobre os regimes inconstitucionais e perde-se a perspectiva do quadro maior que é a luta contra o terrorismo, em que a situação é bastante grave”, referiu, à margem de uma visita a Cabo Verde para participar numa conferência internacional sobre democracia.
Quatro países da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) estão sob regimes militares, na sequência de golpes de Estado: Niger, Mali, Burkina Faso e Guiné-Conacri.
Dos quatro países sob regimes militares, só na Guiné-Conacri não há uma acção terrorista visível.
“O que é mais urgente é lutar contra o terrorismo. Quando falamos com regimes militares, eles perguntam: vocês querem que haja eleições num território dominado pelo terrorismo, onde não é possível fazer-se recenseamento eleitoral? Onde não é possível fazer-se campanha? Então, que tipo de eleições vamos ter, quão representativas vão ser”, questionou Leonardo Simão.
“Olhemos para a questão da segurança em primeiro lugar e depois vamos ver o resto”, acrescentou.
Questionado sobre a desconfiança dos parceiros para com os regimes militares, complicando as perspectivas de apoio para um retorno à via democrática, Leonardo Simão acredita que a fase mais crispada já passou.
“Eu penso que a situação torna-se mais complexa, mas [a cooperação] não é impossível. Já há uma maior apetência desses países [sob regimes militares] em dialogar”, sustentou.
“É preciso trabalhar com a organização regional [CEDEAO] e, a partir daí, com cada um dos países. Houve um período, sobretudo até Janeiro deste ano, com uma retórica belicosa, mas eu penso que esse período está a ficar para trás”, disse.
Um recuo da “retórica negativa” e de “emoções negativas”, perspectiva “maiores possibilidades de um diálogo que faça mais sentido. Aquilo que eu tenho sentido, no contacto regular com cada um destes países, é que, hoje, há maior serenidade e que abre espaço para o diálogo”, dentro da organização regional e no interior de cada um deles.
Apesar do optimismo, Leonardo Simão defendeu empenho.
“Não se pode pensar que as coisas caminham por si próprias. É preciso que haja um empenho, por vezes discreto. É preciso ir trabalhando com todas as forças vivas, políticas, religiosas, tradicionais e outras para que haja estabilidade na região como ponto de entrada. A partir daí, tudo o resto se resolve”, sustentou.
O terrorismo é o mais urgente dos desafios que a sub-região africana enfrenta, mas não é o único, apontou Leonardo Simão.
“O primeiro desafio é o terrorismo, o segundo é o drama humanitário, o terceiro é demográfico - portanto, a [perspectiva de vida da] juventude -, e o quarto são as mudanças climáticas”, acrescentou.
Um mapa complexo onde é preciso “conter o terrorismo onde está”, no centro do Sahel, travando “o objectivo estratégico de se ligar à costa [Atlântica] e à pirataria”, o que poderia representar um problema de segurança ainda maior.
“Todo o esforço deve ser feito para apoiar estes países a conter o terrorismo, mas, ao mesmo tempo, prestar atenção humanitária”, disse Leonardo Simão.
“Infelizmente, o apoio financeiro para a ajuda humanitária está em declínio” em África, face a necessidades de emergência na Ucrânia e em Gaza.
“É preciso reverter este cenário”, concluiu.