AHRW afirmou, citando organizações humanitárias e de direitos humanos locais e internacionais, que grupos criminosos locais aumentaram o recrutamento de crianças para responder às operações da Missão Multinacional de Apoio à Segurança no Haiti (MSS) -- força multinacional aprovada pela ONU e liderada pelo Quénia para ajudar o Governo haitiano a restaurar a lei e a ordem no país - e da polícia nacional do Haiti.
"Com opções limitadas de sobrevivência, muitas crianças no Haiti são atraídas para grupos criminosos, onde se envolvem em atividades ilegais e enfrentam sérios riscos", afirmou Nathalye Cotrino, investigadora de crises e conflitos da HRW, organização não-governamental (ONG) de direitos humanos.
"Para conter a violência, o Governo de transição deve concentrar-se em melhorar a vida das crianças, proporcionando proteção, acesso a bens e serviços essenciais, incluindo educação e oportunidades legais para a sua reabilitação e reintegração", indicou a responsável da ONG.
Os investigadores da HRW estiveram em Port-au-Prince em Julho de 2024, onde realizaram várias entrevistas, recolheram depoimentos de crianças ligadas a estes grupos, reuniram-se com autoridades governamentais e conversaram com diplomatas e representantes da sociedade civil, entre outros.
Os grupos criminosos controlam quase 80% da capital do Haiti, Port-au-Prince, e da sua área metropolitana e estão a expandir-se para outras zonas. Cerca de 2,7 milhões de pessoas, incluindo meio milhão de crianças, vivem sob o seu controlo, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).
Embora não existam números oficiais disponíveis, as organizações humanitárias e de direitos humanos e os funcionários do Governo estimam que pelo menos 30% dos membros de grupos criminosos são crianças e os funcionários do Governo haitiano estimaram que vários milhares de membros de gangues estão a operar no país.
As crianças participam nas atividades criminosas, desde extorsão e pilhagem a atos graves de violência, incluindo assassínios e raptos. As crianças associadas a grupos criminosos disseram à HRW que a fome é o principal fator que as obrigam a aderir a estes grupos ou que leva as suas famílias a permitirem que os filhos façam parte destes gangues. Os grupos são, muitas vezes, as suas únicas fontes de alimento, abrigo e rendimento das famílias.
Os menores destes grupos são vítimas de maus-tratos quando se recusam a participar nas atividades criminosas, sendo geralmente espancados ou recebem ameaças de morte, segundo a ONG.
Estas crianças enfrentam também violência por parte da polícia e de grupos rivais, bem como dos chamados grupos de autodefesa. O Gabinete Integrado das Nações Unidas no Haiti documentou casos de execuções sumárias e linchamentos de crianças entre janeiro e junho. Todas as crianças entrevistadas pela Human Rights Watch disseram que queriam abandonar os grupos criminosos.
De acordo com a ONG, as agências da ONU, organizações locais e entidades governamentais, como o Instituto de Bem-Estar Social e Investigação, iniciaram algumas iniciativas de apoio a crianças anteriormente associadas a grupos criminosos.
No entanto, para a HRW, o Governo carece de uma estratégia abrangente e necessita de mais recursos para garantir que todas as crianças recebem proteção, nomeadamente através do acesso à educação, das vias legais para sair dos grupos e do acesso à justiça.
O Governo de transição está empenhado em enfrentar este desafio, afirmaram o primeiro-ministro haitiano, Garry Conille, e outros responsáveis governamentais, mas é urgentemente necessário mais apoio internacional, afirmou ainda a Human Rights Watch.