Jornalista guineense dirige filme que denuncia trabalho infantil e casamento forçado

PorExpresso das Ilhas, Lusa,27 abr 2025 9:09

25,7% das meninas com menos de 18 anos estão casadas na Guiné-Bissau
25,7% das meninas com menos de 18 anos estão casadas na Guiné-Bissau

Mussá Baldé termina este fim-de-semana as filmagens de “Minina di Bandeja”, filme que denuncia as práticas de trabalho infantil e casamento forçado de raparigas na Guiné-Bissau

“A ideia é levar o filme aos festivais internacionais, porque queremos que o mundo saiba que apesar da existência de um grande trabalho de sensibilização que tem sido feito ao longo dos anos, estas duas temáticas, trabalho infantil e casamento precoce ou casamento forçado, ainda continuam a ser o dia-a-dia aqui na Guiné-Bissau”, disse à Lusa Mussá Baldé.

Correspondente em Bissau da agência portuguesa de notícias e do serviço de língua portuguesa da RFI (Rádio França Internacional), o jornalista adiantou que o filme se destina "sobretudo a apoiar as organizações da sociedade civil na Guiné-Bissau que trabalham nessa temática”.

Mussá Baldé pretende, quando concluir “Minina di Bandeja”, entregar cópias da obra a qualquer organização que queira ter acesso ao filme, ou que são parceiras nesse trabalho, para divulgação e sensibilização comunitária.

Além da divulgação na Guiné-Bissau, Mussá Baldé quer fazer o mesmo no exterior.

“A minha ideia é divulgar o filme internamente, mas também divulgar o filme lá fora. Participando em festivais, em mostras de cinema, desde logo em Portugal, levar o filme a várias comunidades, mesmo não sendo pessoas afetadas diretamente com esses flagelos, mas pessoas que eventualmente possam estar interessadas em conhecer um pouco mais a realidade da Guiné-Bissau e ajudar a Guiné-Bissau a enfrentar estes flagelos”, explica.

O filme, de cerca de 70 minutos, pretende demonstrar algumas das vicissitudes por que passam as meninas em venda ambulante, designadamente assédio sexual, violência sexual, violência física, violência psicológica.

“A criança em venda ambulante é mais suscetível de não andar na escola ou ter bom aproveitamento escolar. Há casos de meninas que percorrem cerca de 25 quilómetros diários na venda ambulante, em Bissau, e nesses casos as meninas estão expostas à gravidez precoce ou casamento forçado”, acrescenta.

Mussá Baldé pretende demonstrar que a venda ambulante e o casamento forçado são também fatores para baixa escolarização da população feminina na Guiné-Bissau, e provar que “qualquer menina que for apoiada e orientada pode estudar, formar-se e ajudar o país”.

O sexto Inquérito aos Indicadores Múltiplos (MICS), realizado pelo Governo guineense e pela UNICEF, com a parceria das agências da ONU como o PNUD, FNUAP e PAM e ainda da União Europeia, publicado em outubro de 2020, revela, entre outras conclusões, que o fenómeno casamento precoce de meninas continua a ser uma realidade na Guiné-Bissau.

O documento revela que 25,7% das meninas com menos de 18 anos estão casadas na Guiné-Bissau, das quais 11,4% no meio urbano e 36,1% no meio rural.

Na Guiné-Bissau, uma criança em cada três trabalha, ou seja 39% de todas as crianças dos 5 aos 17 anos.

“Estes dados alarmantes impeliram-me a pensar na realização de um filme que pudesse trazer à ribalta a realidade das meninas/raparigas que são obrigadas pelos adultos a casamento e ainda submetidas ao trabalho infantil”, explica.

Mussá Baldé começou a escrever o roteiro há cerca de dois anos e iniciou as filmagens em 28 de fevereiro, com a participação de estudantes de liceus e universidades da Guiné-Bissau e de atores guineenses.

Dada a falta de equipamento na Guiné-Bissau, Mussá Baldé pretende, após pré-edição e edição em Bissau, fazer a pós-produção em Lisboa para corrigir aspetos técnicos e tratar da legendagem.

“Minina di Bandeja” é falado em crioulo, e a ideia é ter cópias com legendas em português, francês, inglês e espanhol.

“O filme não será comercializado. Ninguém vai pagar para assistir esse filme. É para ser projetado para divulgar e sensibilizar para o combate ao flagelo do trabalho infantil e casamento precoce ou casamento forçado”, reitera.

Mussá Baldé reconhece que o projeto é uma “iniciativa ousada” da sua parte, porquanto o orçamento do filme está coberto pelo apoio inicial da UNICEF, FNUAP e Banco da África Ocidental em apenas 40%.

“É uma iniciativa ousada da minha parte, mas também, se eu não tiver coragem, nunca mais vou fazer o filme”, vinca.

Mussá Baldé contactou outras instituições e aguarda que também se juntem ao projeto, designadamente o instituto Camões, que considera “uma instituição muito importante na ajuda e promoção dos direitos humanos na Guiné-Bissau”.

“Ainda me vai chamar para ver o que é que se pode fazer em termos de apoio”, manifesta.

“Portanto, neste momento está-nos a faltar à volta de 60% do orçamento do filme, mas, graças a Deus, com o apoio que o Banco da África Ocidental nos deu, comprámos um equipamento novo em Lisboa e agora estamos a avançar. Talvez, as instituições que se interessam por estas temáticas percebam que é preciso ajudar, porque estamos a fazer um trabalho que vai servir para ajudar no trabalho que também eles fazem”, adianta.

O Código Civil em vigor estipula que o casamento na Guiné-Bissau só é legal a partir dos 16 anos.

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Autoria:Expresso das Ilhas, Lusa,27 abr 2025 9:09

Editado porJorge Montezinho  em  27 abr 2025 17:34

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