Opinião: Intervenção do governo para quê?

PorPaulo Monteiro Jr.,1 dez 2012 23:00


No presente deba¬te sobre a política orçamental do Governo haveria vantagem em discutir não só sobre a intervenção do governo para quê?, mas também sobre intervenção como?

Ainda que central, a discussão sobre o Orçamento do Estado não deveria abstrair-se da maior batalha ideológica do nosso tempo: a intervenção do Governo na economia. É uma batalha ideológica, porque a ciência económica - tanto a teoria como a história- fornece um conjunto de respostas bastante "nuancées".

Assim, no caso particular de Cabo Verde, o fetichismo des¬pesista do Governo não só tem tido uma fraca influência no andamento da economia (por exemplo, na redução da elevada taxa de desemprego) mas so¬bretudo tem contribuído fortemente para os défices "gémeos" excessivos e para o crescimento demasiado rápido da dívida pública externa. Ademais, como as intervenções do governo têm sido realizadas, não têm trazido um efeito positivo significativo à eficiência (competitividade) da economia.

De notar que a política orçamental seguida no OE-2013, agravará ainda mais o défice e a dívida públicos. Ela baseia-se num princípio há muito conhecido dos economistas chamado multiplicador do orçamento-equilibrado. Ou seja, o governo aumenta simultaneamente os impostos e as despesas - mas alterando o défice corrente - o multiplicador é, na melhor das hipóteses, igual à unidade.

Ora, como os dados que podem ser vistos no documento do Banco de Cabo Verde (BCV) de há uns dias, com um crescimento em 16.3 por cento das despesas correntes e das receitas fiscais na ordem de 7%, há uma forte alteração (deterioração) do défice corrente. Sendo assim, como vem nos livros, a sangria despesista do Governo fará anular a já fraca capacidade de estimular a economia e apenas agravará a dívida pública.

O crescimento galopante da dívida pública externa tornou-se parte da realidade cabo-ver¬diana, atingindo, em 2011, um montante total de USD1060 milhões. Note-se que, no final de 2011, a dívida pública cabo-verdiana a Portugal ascendeu a USD 355 milhões, depois de se situar em USD 268 em 2010 (ou seja uma subida muito substan¬cial: 32%). Assim, de acordo com o Relatório de Política Monetária do BCV, " o stock da dívida do governo ultrapassará em 2013 os 90% do PIB". É ain¬da de referir que considerando o SPAL (ou seja, adicionando a dívida direta do Governo e a dívida garantida pelo Estado, nomeadamente dívidas da ELECTRA e dos TACV) a dí¬vida pública ultrapassa os 100 por cento do produto interno bruto (PIB). Cabo Verde entra para o clube dos países com a dívida pública em rácio do PIB nos três dígitos. É um nível pe¬rigoso. De destacar que é muito superior ao valor de referência de 60 por cento do PIB.

O debate sobre o nível pe¬rigoso atingido pela dívida pública de Cabo Verde tem sido toldado por um conjunto de mitos. Um deles respeita às condições do financiamen¬to: o país está numa posição especialmente boa para pros¬seguir uma estratégia de en-dividamento porque as taxas de juro são concessionais, os empréstimos são de longo prazo e com um período de carência confortável. É, por assim dizer, a maneira fácil e "sem dor" que o governo tem, enquanto a graduação para país de rendimento médio/bai-xo não se efectivar (pode ser em 2013), de obter recursos. Um outro mito concerne à apli¬cação feita dos empréstimos na "infraestruturação" do país: infraestruturas rodoviárias, portuárias, aeroportuárias, energias renováveis.

Ora, já é tempo de começar a fazer a avaliação do retorno social médio destes projectos de infraestruturação e compa¬rar com os seus custos efectivos tendo em conta a sua contri¬buição para o reforço do po¬tencial de crescimento do país. Deve-se aqui sublinhar que a moderna teoria de crescimen¬to económico recomenda que as áreas como a educação (de qualidade!), formação, pesqui¬sa e inovação são prioritárias para o investimento público, em particular numa pequena insular sem recursos minerais conhecidos.

Quanto ao outro mito as¬sociado à política de endivi¬damento do governo, a subida muito substancial no OE-2013 dos encargos com os juros da dívida pública deve servir de alerta. Os encargos vão conti¬nuar a aumentar. Isso resulta da combinação de um forte crescimento do stock da dívida pública com um aumento da respectiva taxa de juro implí¬cita.

Em suma, com um mo¬delo falhado do crescimento económico, porque privilegia infraestruturas físicas (betão) e demais bens não transacioná¬veis (ganhar divisas para pagar a dívida externa!), o risco que a intervenção do Governo possa redundar em falha é forte.

É tempo de pensar numa estratégia de complementari¬dade com o sector privado. É urgente reanimar a confiança no futuro.

 

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Autoria:Paulo Monteiro Jr.,1 dez 2012 23:00

Editado porAlexis Cardoso  em  15 jan 2013 23:00

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