Estado de Direito, demagogia e mentalidade revolucionária

PorExpresso das Ilhas,22 fev 2015 0:00

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“O que por seu conteúdo é injusto, não pode ser justo ainda que adopte forma de lei.” – Jescheck

“…um mundo melhor, com menos crimes, mais seguro e justo, só se alcançará no culto da liberdade.” – Germano Marques da Silva 


Pela voz sombria do ministro Démis Almeida (ver http://www.rtc.cv/tcv/index.php?paginas=13&id_cod=38681), tão confuso quão evasivo, o Governo deu a conhecer à sociedade cabo-verdiana, num “comunicado” de imprensa marcado pela sordidez, a sua intenção de aumentar a pena de prisão para 35 anos de prisão!

A tolice política não tem, de facto, limites.

Foi um momento triste, protagonizado por um politicante piegas, inexperiente e visivelmente perturbado, por uma figura grotesca, enredada naquele tecnocratês que, no seu vazio intrínseco, nada explica nem esclarece. Também, convenhamos, não era esse o objectivo de fundo…

Qual é a razão de ser dessa “proposta” canhestra? Cientificamente, nenhuma. É a quadratura do círculo.

A esperteza do sr. Démis, encarnação do perfeito chico-esperto nacional, é a mesma esperteza saloia de um Júlio Lopes Correia, essa luminária que, enquanto titular da pasta da Administração Interna, escrevia cartas à magistratura, clamando, pateticamente, pela necessidade de uma sua “coordenação” com a polícia, à moda do velho Estado burocrático-policial! 

É a esperteza, enfim, de um partido que convive mal com a democracia constitucional e nunca deixou, por actos ou omissões, de solapar as bases do Estado de direito material, cujo esteio é, desde sempre, a fé no Homem e na sua essencial dignidade. De um partido que, entre o Estado e o cidadão, opta invariavelmente pelos interesses do primeiro.

O PAICV é assim, e nada o mudará. Nunca. Há limites que a Natureza impõe à engenharia e às operações de marketing, cuja fachada, por mais brilhante que seja, não consegue esconder os propósitos íntimos da alma.

O argumentário do Governo é uma mistura de esquizofrenia e insensatez.

Um como que “flatus vocis” sofrível e sem qualquer coerência técnica.

Démis, o vazio, proclama: “Só se passa de 25 para 35 anos quando haja concurso de crimes, ou seja, quando o agente cometer mais do que um crime. Imaginemos que a pessoa cometeu um crime cuja pena máxima é 25 anos, cometeu um outro susceptível de ser aplicado uma pena de 10 anos. No regime actual essa pessoa teria no máximo uma pena de 25 anos, mas com o regime que se propõe, havendo concurso, pode ter 35 anos”.

Descontemos as bacoradas gramaticais do jovem governante! Acto gravíssimo, em todo o caso.

Vamos ao Direito Penal.

Porque é que o Governo, nessa mesmíssima linha punitiva, não propõe penas mais altas?! A incoerência salta à vista desarmada.

Uma pena de 40 ou 50 anos seria bem mais “justa”, porque o hipotético indivíduo demisiano pode ter cometido não um mas dois homicídios dolosos. Então, neste caso, a pena de 35 anos já não faria o menor sentido. A asneira e a demagogia têm este preço.

Mas parece que a malta não pensou nisso.     

Qual é o critério científico que leva, de resto, o nosso filódoxo do Sal a falar de (apenas) 35 anos e não de 70 anos como pena máxima? Ou será tudo um imenso absurdo?

Todos gostaríamos de saber, desvendando, assim, o estranho mistério!

Até um ceguinho inofensivo consegue perceber que a motivação do grupelho que nos “governa” não é nem nunca foi resolver o problema da insegurança, fruto, aliás, da sua política errática em vários domínios.

O astuto Governo pretende, isso sim, aumentar os poderes repressivos e controlar, ainda mais, consoante a sua vocação primordial, a vida e a liberdade dos cidadãos.

Fomenta, num primeiro momento, a anarquia e a irresponsabilidade (encontros com thugs, confraternização com narcotraficantes, etc.) para, depois, surgir como o grande salvador da pátria, pedindo penas criminais “mais altas” e um Estado policial e implacável! Pudera…

Lembrando Bertrand de Jouvenel, estamos aqui perante o crescimento avassalador do poder político, numa exploração mesquinha de paixões e sentimentos populares.

Trata-se de uma forma miserável de fazer política, típica, aliás, de tiranos e espíritos medíocres.

Não há, cientificamente, nenhuma relação entre a insegurança que o país ora atravessa e a moldura penal legalmente consagrada. Isso é pura treta. Que se prove o contrário!

O problema de Cabo Verde chama-se antes…impunidade. IMPUNIDADE, ouviram?

Desde o célebre livro do marquês de Beccaria, de 1764, marco indelével do iluminismo penal, já se sabe que a barbaridade penal, resíduo de épocas mais recuadas, em que imperava a retributiva “lei de talião”, só aumenta a revolta e desfaz a confiança nas instituições.

O problema é outro, entre nós. É um facto. A trapaça é evidente.

Muitos crimes graves, que verdadeiramente apoquentam a população, não foram sequer desvendados.

Os respectivos culpados não são conhecidos e o julgamento (judicial, claro) não teve lugar. É uma falha grave do sistema instituído.

Mas o Governo, no cume da charlatanice, prefere falar em “aumento da pena”, quando o problema é claramente outro.

A “fuga em frente” é um método perverso bastante usado pelos partidos de matriz revolucionária, que nunca assumem as suas responsabilidades, preferindo, antes, culpar os outros e os “acasos” da história.

Jean-Paul Sartre, na época da Revolução fracassada de Mao, dizia que “todos somos responsáveis pela fome que grassa na China”.

Os filhos de Marx, esse santo imaculado da utopia, nunca são culpados de nada, “cercados”, coitadinhos, pelos odiosos “burgueses” e capitalistas!

A Venezuela, corroída actualmente pelo vírus do socialismo totalitário, endureceu a acção policial, no meio da mais severa arbitrariedade, mas é, apesar de tudo, um dos países mais inseguros do mundo.   

O que torna os países seguros é, como bem sublinhou Humberto Cardoso, na esteira de Steven Pinker, o rigor honesto e hermeneuticamente fundado dos tribunais, o primado da lei e a transparência das instituições.

Um Estado só é forte se for bem ordenado, prudente, não arbitrário.

Os países mais prósperos e pacíficos do mundo não são as ditaduras, são antes as democracias constitucionais, como o Canadá, a Noruega, a Nova Zelândia, etc., etc..

As democracias mais pacíficas possuem, de resto, penas bastante leves e acreditam na recuperação do criminoso. Os resultados práticos dão-lhes inteira razão.

Porque a pena criminal só deve ter finalidades preventivas e não de vingança.

A sua cultura cívica é florescente e vibrante, caldeada, não na lógica barata da demagogia, tão acarinhada por Janira Hopffer Almada, Démis Lobo e tutti quanti, mas no respeito escrupuloso pelos direitos, liberdades e garantias das pessoas.

(O critério da racionalidade, defendido por Winfried Hassemer, Roxin ou Figueiredo Dias, não deve ser substituído pelo “critério” paicvístico da pesporrência).

São países que perceberam que o Estado de direito deve ser, antes de tudo, um autêntico Estado de Justiça. Onde as pessoas são livres e confiantes.

Os seus líderes são instruídos, cultos e procuram seriamente o bem comum.

Saibamos dizer um rotundo “não” aos velhacos e burocratas de serviço!

PS: O sr. “Filú”, pontificando mais uma vez nas páginas do jornal A Nação, em nome dos católicos nacionais, regozija-se com a promoção de D. Arlindo a Cardeal e tece, de permeio, um conjunto de considerações a respeito do contributo da igreja apostólica romana na construção histórica da nossa nação. É verdade que o novo Cardeal merece o nosso louvor e a nossa irrestrita admiração. O mesmo já não se pode dizer do deputado paicvista, admirador confesso de Fidel Castro e, logo, da genocida ideologia comunista, absolutamente contrária à fé Cristã. Por esse simples facto, Filú não pode ser católico e nem pode, tampouco, aproximar-se dos sacramentos. Sei que um mar de analfabetos e idiotas úteis sairá, logo, em defesa do sociólogo pró-comunista, mas leiam antes o Decreto do Santo Ofício de 1949, do Papa Pio XII, confirmado por João XXIII em 1959. A norma continua em vigor.

 

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Autoria:Expresso das Ilhas,22 fev 2015 0:00

Editado porExpresso das Ilhas  em  31 dez 1969 23:00

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