Ao longo dos últimos sete anos, o mercado de trabalho cabo-verdiano sofreu transformações significativas na sua estrutura. Estas alterações reflectiram não só a evolução das qualificações da população, mas também o quadro institucional em vigor. Um dos traços mais marcantes é a dificuldade na transição da educação universitária para o mercado de trabalho dos jovens cabo-verdianos com formação superior, envolvendo custos pessoais e sociais muito relevantes e induzindo depreciação de competências, fenómenos de revisão de expectativas de rendimentos e de exclusão social. Parte desta evolução adversa resulta do funcionamento ineficiente do mercado de trabalho.
É importante discutir – e isso passa também por escolhas políticas corajosas, definidas com uma preocupação de proceder a transformações estrutural e sectorial da economia – como essa transição da educação universitária para o mercado de trabalho deveria ser facilitada, compreendendo melhor os aspectos da procura e da oferta neste mercado. Será inteiramente demagógico pretender que é possível poupar todos aqueles que não deveriam sofrer com esses custos para uma economia como a cabo-verdiana, caracterizada por uma fraca capacidade produtiva e por uma insuficiência de pessoas com educação superior com os perfis mais procurados pelos empregadores e com skills ou experiência de trabalho adequados, sobretudo nos escalões etários jovens. Adicionalmente, os processos de ajustamento que se desenrolam em contextos de reduzida eficiência para o encontro entre os dois lados do mercado de trabalho, complicam o problema.
As qualificações da população activa com uma formação superior não são uma nebulosa. O governo ao ter avançado com uma política de aumentar a proporção da força de trabalho com formação superior devia, por um lado,
ter em conta as características chave do sistema de educação e do funcionamento do mercado de trabalho bem como a estrutura da economia cabo-verdiana (mercado interno, especialização sectorial, tamanho das empresas, etc.). Por outro lado, numa situação crítica de contracção da actividade económica, o governo perde demasiado tempo na gesticulação politiqueira nesse território de ficção científica que são …os «clusters», quando o desemprego dos jovens – em especial com formação superior – aponta para uma distopia.
A proporção da força de trabalho com ensino superior no total da população em idade activa subiu, entre 2011 e 2015, de forma assinalável. Num regime macroeconómico caracterizado por um crescimento tendencial reduzido e por um baixo «mismatch» entre a formação adquirida no sistema superior de ensino e a exigida pelas empresas – a maré montante do desemprego submerge em primeiro lugar os segmentos menos desejados do mercado de trabalho pelas empresas -, é inevitável o aumento do risco de desemprego para os jovens com níveis de educação superiores. A manutenção desta tendência crescente do número de jovens cabo-verdianos com diploma universitário poderá fazer aumentar ainda mais esse risco num cenário em que o aumento das qualificações formais não se traduza numa efectiva qualidade da força de trabalho, medida pela capacidade em adoptar novas tecnologias produtivas, a disciplina ou por uma experiência adequadas.
A difracção é essa flecha causal que vai do desemprego total – de acordo com o INE de Cabo Verde, em 2014, 15,8 por cento da população activa estava desempregada – em direcção às taxas diferenciadas dos mercados desagregados – por exemplo, para os jovens foi de 35,8 por cento. Por oposição, a flecha em sentido inverso é muito mais fraca. Se esta sugestão for correcta, a explicação macroeconómica pode tratar os aspectos segmentados por nível de escolaridade como fenómenos mais determinados.
O ensino universitário em Cabo Verde é muito recente. Há dez universidades ou instituições de ensino superior com um total de cerca 13.000 estudantes. Contudo, importa notar que a percentagem da população na faixa etária de 25 – 64 anos com uma formação superior, ela não atinge os dois dígitos.
A parte dos jovens com formação superior em Ciência – Tecnologia – Engenharia – Matemática (CTEM) é muito inferior à dos graduados em Cabo Verde nas Humanidades, Direito e Ciências Sociais. Um outro facto a realçar diz respeito à fraca existência de formação profissional superior e nas competências linguísticas (particularmente em inglês). No que diz respeito à procura de diplomados com escolaridade superior deve-se olhar para o tamanho das empresas, localização geográfica, sector da economia e o perímetro das administrações públicas. No mercado de trabalho cabo-verdiano, a maior parte da procura dos licenciados (ou graus de escolaridade acima da licenciatura) provém do perímetro do Estado e em seguida do sector dos serviços financeiros (principalmente dos bancos).
As características do sistema de ensino superior podem explicar em parte as dificuldades no circuito de transição para o pólo de produção: a ausência de uma orientação para o ensino profissional superior, a parte relativamente pequena do chamado «work-based learning» - onde o soft skills pode ser adquirido – e a percentagem relativamente elevada de licenciados em áreas com uma empregabilidade mais limitada (por exemplo, humanidades, artes, ciências sociais). Isso é complicado ainda pelas fraquezas do sistema de ensino no seu todo.
Na envolvente específica que Cabo Verde vive neste momento (situação interna crítica, integração regional, globalização), qual seria a (s) estratégia (s) adequada (s) para restaurar a circulação? Pensa-se em primeiro lugar nas políticas do emprego para os jovens com formação superior. Elas visam, entre outros objectivos, a melhorar o encontro entre a oferta e a procura no mercado de trabalho. Uma segunda estratégia: aumentar a procura agregada dos bens e serviços. Contudo, face a um desemprego elevado e persistente, somos conduzidos a auscultar o pólo das empresas e… a repensar uma estratégia consistente para o ensino superior cabo-verdiano numa perspectiva global.