2016: O que está em causa

PorPaulo Monteiro Jr.,18 nov 2015 6:00

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Num sistema democrático como o nosso a avaliação periódica é inevitável. Em 2016, os eleitores cabo-verdianos poderão, nas consultas autárquica, parlamentar e presidencial, legitimar certas opções políticas e rejeitar outras. As eleições legislativas serão a primeira consulta popular de 2016. Entre nós, normalmente os eleitores escolhem entre os projectos governativos alternativos e candidatos a chefe de governo das duas principais forças políticas, a saber o MpD e o Paicv. De um lado, uma visão construída e uma prática de forte intervenção na economia do governo incumbente. Por outro lado, um newcomer com uma visão do desenvolvimento mais voltado para o mercado – e o comércio internacional - e para o sector privado.

De uma maneira geral, a intervenção desenfreada deste governo na economia tem três características principais: (i) acantona no sector real da economia, essencialmente em cinco empresas-chave de capitais exclusivamente públicos – ASA, Cabnave, Electra, Enapor, TACV – ; (ii) no sector financeiro, as intervenções fazem-se em condições de subalternidade face às instituições financeiras de capital estrangeiro, ou seja, o governo joga um papel reduzido (insignificante). Análises de base micro-económica sugerem a existência de falhas de mercado em todas estas áreas de intervenção e a acumulação de enormes prejuízos no conjunto das empresas públicas que agravam as necessidades de financiamento do Estado.

Nesta perspectiva, o país não deveria ser obrigado a aceitar os elevados prejuízos e subsídios acumulados no sector empresarial do Estado  (SEE) - que agravam fortemente os desequilíbrios macroeconómicos existentes na economia cabo-verdiana – com argumentos baseados em grande parte na ideologia política do governo incumbente (e do partido que o sustenta). Mas, mais do que isso, cedendo a inércias e clientelismos político-partidários, o SEE cabo-verdiano atinge uma dimensão tal que torna dramática qualquer reforma estrutural que procure estancar a hemorragia de recursos a que dá origem. Para dar um exemplo, e basta um - a empresa do sector dos transportes aéreos, TACV. Deixada à solta, a deterioração da sua situação financeira asfixia o espaço e a confiança dos agentes económicos mais empreendedores, reduzindo perigosamente a margem de manobra para viabilizar alternativas políticas. Aplica-se bem à incapacidade de fazer e explicar reformas no SEE – reformas não realizadas por este governo em três legislaturas que agora findam - uma afirmação de Benston G. & al. (1986) « solutions are available now, but solutions long delayed may prove not to be solutions at all» .  

Acresce uma terceira característica principal das intervenções deste governo na economia que consiste no anúncio e realização de investimentos em infra-estrutura material (betão). A iniciativa governamental da última década e meia tem-se traduzido essencialmente na afectação de recursos produtivos no investimento material e em sectores não transaccionáveis, com implicações importantes em termos de crescimento. A taxa de retorno dos investimentos realizados foi muito limitada. Note-se também que estes investimentos nos últimos anos têm tido um efeito bastante reduzido no crescimento da economia cabo-verdiana. Num contexto de baixa produtividade tendencial, a poupança doméstica tende a ser inferior à necessária para financiar o esforço de investimento. Assim, num quadro em que os diferentes agentes económicos internos necessitam simultaneamente de financiamento, o Governo de JMN financiou os gastos com os investimentos em betão essencialmente através do endividamento externo. O governo newcomer vai ter de assumir um endividamento público excessivo - a dívida pública, a assumida mais a disfarçada, deve estar acima dos 130 por cento do PIB. Com o endividamento excessivo, a credibilidade do Estado cai e aumenta a possibilidade da cessação abrupta do acesso a financiamento externo.

O Governo continua a ceder a interesses constituídos e inércias assobiando para o lado, como se essa recusa do confronto com a realidade pudesse ser mascarada pela propaganda e pela deriva assistencialista através… dos Fundos. Aliás, mesmo que o (s) caso (s) da utilização do erário público para fins duvidosos fosse destituído de gravidade política – e não é – a construção da narrativa utilizada na sua justificação revela uma resistência doentia às leis elementares da transparência e rigor na gestão dos dinheiros públicos.

Em suma, o que está em causa nas eleições do próximo ano são ideias novas para uma nova abordagem de política económica assente na promoção da capacidade competitiva e no relançamento do sector privado – nacional e internacional em Cabo Verde - sobretudo no sector de bens e serviços transaccionáveis. Para impulsionar boas soluções aos problemas sócio-económicos estruturais – prejuízos gigantescos do conjunto do sector empresarial do Estado, crescimento lento do produto interno bruto e desemprego elevado (principalmente dos jovens) - precisamos de um novo governo de gente cosmopolita mas também enraizado e centrado no povo, capaz de fazer e explicar reformas no sector público administrativo alargado – consolidação orçamental virtuosa com soluções realistas no SEE.

Como é evidente este governo está sem fôlego e foi incapaz de impulsionar soluções aos problemas estruturais do país. E isso, nos tempos que correm, justifica uma severa punição eleitoral em 2016. Esperemos que a memória dos meus concidadãos não seja curta e escolham o partido e o candidato a chefe de governo que estejam à altura de colocar o país numa nova rota de desenvolvimento e de reposicionamento internacional.

 

*Mestre em ECONOMETRIA, ULB; antigo Economista Sénior no Banco de Portugal.

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Autoria:Paulo Monteiro Jr.,18 nov 2015 6:00

Editado porRendy Santos  em  13 nov 2015 13:45

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