Cabo Verde precisa de um Governo com a exportação no seu ADN

PorPaulo Monteiro Jr.,22 fev 2016 6:00

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Em 2014, a ONU estimava que Cabo Verde possuía uma população de cerca 520 milhares de habitantes. Refira-se ainda que, de acordo com o MFP-CV, para esse mesmo ano, o produto interno bruto cabo-verdiano (PIB, ou seja, a riqueza gerada – ou produção efectuada – no nosso país), atingiu 1970 milhões de dólares americanos. A realidade dos números atrás descritos coloca Cabo Verde no grupo dos Micro-Estados.

Um Micro-Estado para ser hoje sustentável externamente precisa muito mais da exportação que um país grande, com massa crítica, mercado interno e recursos. Infelizmente, o actual governo não compreendeu isso e não soube actuar no sentido de focalizar no esforço para a alteração das nossas condições estruturais e para um programa concertado com o sector privado nacional de sensibilização dos players internacionais para resolver o problema crucial do aumento substancial da capacidade de exportação de bens e serviços. 

Três maiorias governativas sucessivas significam um horizonte temporal médio/longo prazo e traduzem um conjunto de condições propícias para fazer reformas, em áreas como o sistema de justiça, o sector público alargado (redução/reorientação das despesas do SPA e reestruturação das empresas públicas), sistema de educação/formação e o licenciamento industrial e turístico. Estas medidas estruturais são factores fundamentais para a emergência de uma combinação de incentivos indiferenciados e específicos de atractividade para o investimento – nacional e estrangeiro – em unidades da economia real orientadas para os mercados externos.

Neste contexto, o governo incumbente tem a obrigação de explicar clara e detalhadamente o fenómeno do não aproveitamento por Cabo Verde das condições generosas do AGOA para as exportações para Estados Unidos – têxteis, vestuário, etc. Basta comparar com a performance das Ilhas Maurícias, no quadro do AGOA, e ver que a exportação não está no ADN do governo actual. Acresce que o défice da nossa balança de bens e serviços é persistente e profundo. De 2001 até o presente, o défice abissal da balança de bens foi parcialmente compensado pelo comportamento da balança de serviços – turismo – que regista um pequeno saldo positivo. A evolução da balança de bens e serviços contribuiu de forma determinante para o enorme défice médio das contas externas, tendo como principais factores o défice alarmante da balança de bens e uma elevada propensão marginal a importar. De realçar que, no caso do turismo, o seu contribuído está muito aquém das potencialidades do país dado que o governo não tem sabido definir o pensamento e os investimentos para sermos um país de turismo e lazer de qualidade, que se traduziria num aumento significativo das receitas para o grosso da nossa economia. As receitas de turismo representam actualmente cerca de 70% das exportações de bens e turismo. 

A entrada efectiva do país na Organização Mundial do Comércio e sobretudo na CEDEAO (isto é, a participação efectiva nos estádios avançados de integração económica: união aduaneira, mercado comum) cria um contexto concorrencial substancialmente diferente para países com uma capacidade muito incipiente de exportação como é Cabo Verde.

Chegados a estes estádios avançados de integração, sendo clara as vantagens da participação em espaços económicos mais vastos, assistimos a algumas interrogações e inquietação, inteiramente justificadas, sobre, por exemplo, os efeitos da união aduaneira (mercado comum) nas receitas tributárias do Estado no curto prazo.

O país tem uma estrutura industrial incipiente e essencialmente voltado para o mercado doméstico e, analisando a estrutura das exportações por produtos constata-se que não se especializou em nenhum sector de exportação. Ademais, a estrutura geográfica do comércio externo indica que a CEDEAO representa uma posição insignificante. A conhecida teoria gravitacional do comércio não funcionou aqui. Adicionalmente, refira-se que a competitividade medíocre e o «mau ambiente de negócio» do país tornam particularmente difícil a capacidade de atractividade para o investimento directo estrangeiro e debilitam a posição nacional dentro da CEDEAO. 

Em suma, o que se joga no futuro próximo é o posicionamento estratégico do país na CEDEAO e a sua rota de crescimento robusto sustentável. As «chances» de sucesso da economia cabo-verdiana dependerá essencialmente do investimento directo estrangeiro (IDE) em unidades de economia real nos sectores de bens e serviços transaccionáveis. O IDE pode trazer novas tecnologias e métodos de gestão mais avançados. 

Dados a variável chave da equação para o crescimento robusto sustentável da economia cabo-verdiana nos próximos anos e os elevados níveis de endividamento externo acumulados nos últimos sete anos, a manutenção de excedentes nas balanças corrente e de capital terá de constituir uma característica estrutural da economia cabo-verdiana. Para isso é imperativo reduzir substancialmente o défice crónico profundo da nossa balança de bens. Acresce que uma redução substancial do défice da balança de bens implica que consigamos, nos próximos anos, obter ganhos de competitividade – e de produtividade - sem paralelo nestes 40 anos da história económica da República.

Para equacionar e promover boas respostas a estes desafios, Cabo Verde precisa de um governo cosmopolita, capaz de implementar e de explicar medidas estruturais, algumas das quais não serão fáceis. O legado das reformas adiadas é grande.

Para o bem e para o mal, são as eleições que legitimam certos projectos governativos e rejeitam outros, ainda que muitos eleitores só de forma muito difusa se apercebem deles. As alternativas na consulta popular do próximo mês de Março são muito simples: escolher um novo governo com a exportação no seu ADN ou continuar com o velho governo reciclado e acentuar a trajectória lúgubre por onde Cabo Verde tem vindo a percorrer.

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Autoria:Paulo Monteiro Jr.,22 fev 2016 6:00

Editado porExpresso das Ilhas  em  31 dez 1969 23:00

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