No próximo dia 20 de Março, os eleitores cabo-verdianos vão votar para escolher entre os candidatos a chefe de Governo mas também em relação a projectos governativos (PG). Numa democracia, como a nossa, a consulta popular é precedida de debates entre os candidatos a chefe de Governo dos partidos entre os quais se decidem normalmente as eleições entre nós, a saber MpD e PAICV.
Debater propostas políticas, para um país que se encontra numa situação económica crítica, passa por identificar, ex ante, os principais problemas, desafios e, por discutir as propostas de soluções para que os eleitores se apercebam da sua diferença e plausibilidade.
Depois de ver na TCV a entrevista colectiva dos concorrentes às eleições legislativas e o debate do dia 3 de Março, aprofundei uma convicção sobre a candidata a chefe de Governo do PAICV: é determinada, combativa, tem o talento da retórica e uma táctica deliberada de confundir os eleitores. Mas a todas essas características falta o essencial: a substância.
Nestes tempos difíceis (economia cabo-verdiana e global) em que vivemos, carregados de incerteza e riscos, ser chefe de Governo exige experiência, expertise e boa compreensão da interdependência global. E é perante essas dificuldades e complexidades de execução das medidas de políticas activas do emprego, que a proposta de criação, durante uma legislatura, entre 75 mil e 125 mil postos de trabalho, se mostra irrealista e fantasmagórica. Neste contexto, os líderes políticos dos partidos com representação parlamentar e, nomeadamente os dos dois maiores partidos, têm a obrigação de explicar clara e detalhadamente aos eleitores cabo-verdianos como tencionam resolver os nossos problemas magnos.
Um primeiro conjunto de problemas é constituído pelo crescimento anémico da economia, «gap» do emprego alarmante e dívida pública excessiva - acima de 2 mil milhões de US dollars, valor perigosamente elevado para um Micro-Estado; em particular, este nível de endividamento, medido em percentagem das receitas tributárias, é manifestamente insustentável. Os problemas da competitividade medíocre, da incapacidade de conquista de mercados de exportação de bens & serviços e da ineficiência do sistema bancário, outro conjunto.
A manifesta insuficiência do número de postos de trabalho na economia e a persistência de elevados níveis de desemprego no nosso país – em particular, dos jovens – espelham a evolução na actividade económica e também os fortes desequilíbrios acumulados nos últimos sete anos. Deste modo, a capacidade de absorver um elevado número de desempregados permanece como um dos principais desafios da economia cabo-verdiana, que se torna estruturalmente mais difícil de vencer quanto maior a duração do desemprego.
O binómio crescimento/emprego é nevrálgico. A complexidade dos mecanismos envolvidos no processo de crescimento económico não é compatível com uma abordagem dirigista, como o Governo do PAICV fez – garrotando o sector privado - mas exige da sua parte um papel catalisador, implementando as reformas que alterem as nossas condições estruturais – a saber, acções concretas em áreas específicas, muitas das quais fora da estrita esfera económica – e corrijam os desequilíbrios macroeconómicos fundamentais e as falhas de mercado.
Neste contexto, a reanimação da confiança dos mais empreendedores e uma nova dinâmica empresarial assente no princípio de integração nas cadeias de valor globais, bem como o aumento e a melhoria qualitativa dos factores produtivos, poderão permitir uma política macroeconómica de crescimento robusto sustentado e a criação do emprego. Porém, são necessárias estratégias que promovam o investimento directo estrangeiro – constitui uma fonte vital de financiamento e da partilha de risco da economia cabo-verdiana - e a diversificação para novos sectores orientados para o mercado externo.
Note-se que, esses esforços tomam tempo e os seus efeitos sobre a criação de novos postos de trabalho serão lentos a manifestar-se.
Os resultados das análises econométricas apontam para a existência de uma relação significativa e com o sinal esperado entre a taxa de crescimento do produto e a criação de emprego. Adicionalmente, existe evidência de que a elasticidade do emprego em relação à taxa de crescimento do produto é, no curto prazo, fraca: cerca de um terço. No médio prazo – 2 a 3 anos – não está muito longe da unidade.
Estes resultados permitem tirar as seguintes conclusões:
Os números atrás sugerem que as estratégias de política macroeconómica bem como industrial (dirigidas às empresas, pólo de circulação) devem ser acompanhadas, no curto prazo, de políticas activas de criação de empregos para aliviar o mercado de trabalho cabo-verdiano de uma parte do seu excesso de oferta. Tendo em conta esta primeira conclusão, medidas paliativas de políticas activas do emprego deveriam ser implementadas:
A extensão do emprego a tempo parcial.
A manutenção das actividades existentes, lá onde o produto marginal do trabalho cubra o seu custo social.
Planos de absorção de desempregados financiados pelo sector público: estágios remunerados, educação/ formação, trabalhos de utilidade pública, subsídio (temporário) às empresas privadas para a criação de novos postos de trabalho, etc.
Adicionalmente, refira-se que a capacidade de absorver um número elevado de desempregados está, no entanto, limitada pelo défice orçamental do sector público cabo-verdiano que, ao longo dos últimos sete anos, tem situado em níveis sistematicamente muito superiores a 3 por cento do produto interno bruto.
A impossibilidade de atingir a criação do número de postos de trabalho prometidos pela candidata Janira Hopffer Almada – entre 75 mil e 125 mil empregos - numa legislatura, dado que implica uma taxa de crescimento média do produto interno inacessível!
Quanto ao candidato a Primeiro-Ministro, Ulisses Correia e Silva, com abordagem, políticas e meios diferentes, a meta de criação, durante a legislatura, de 45 mil postos de trabalho é possível mas difícil de atingir.
Mesmo que as eleições legislativas fossem equiparáveis a um referendo global sobre programas governativos – e não são - a promessa de criação de 125 mil postos de trabalho, em 5 anos, revela não só uma resistência quase psicótica às leis da teoria económica mas sobretudo uma falta de respeito pelo eleitorado e pelas vítimas da crise de emprego.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 745 de 09 de Março de 2016.