O Estado ao prosseguir os seus fins tem, naturalmente, necessidades económicas cuja satisfação implica despesas – despesas públicas. Por isso, o Estado e as entidades publicas desenvolvem uma atividade tendente, por um lado, a obtenção dos meios económicos susceptíveis de assegurar a satisfação das necessidades publicas, por outro, ao correto afetação dos meios obtidos.
As receitas públicas podem classificar-se, sob o ponto de vista jurídico, em receitas voluntárias e receitas coercivas. Nas receitas voluntárias ou de direito privado, o preço é estabelecido por via negocial ou contratual, em que o Estado intervém em pé de igualdade com qualquer outro particular (receitas patrimoniais). As receitas coercivas ou de direito público, são autoritariamente fixadas pelo Estado, por via legislativa (impostos, taxas, multas, coimas). Uma das receitas coercivas é, sem duvida, o imposto, cuja importância tem vindo gradualmente a crescer, sendo atualmente a mais importante receita pública dos Estados modernos de economia de mercado, caso de Cabo Verde.
A fiscalidade visa a cobertura das despesas públicas (financiamento do OGE) e utilizada como instrumento da política económica-social, como sejam tributárias – contribuições especiais impostos e taxas; patrimoniais – privatizações, prestações de serviços públicos; creditícias – recursos ao credito. A fiscalidade persegue objetivos múltiplos, em certos aspetos contraditórios e impopulares, de conciliação sempre difícil com as funções económicas do Estado e os principais objetivos do sistema fiscal, que são: a eficácia (eficiência) na adequação de recursos, a equidade na repartição dos rendimentos e da riqueza, a estabilidade (previsibilidade) e o crescimento da atividade económica.
A nova lei de benefícios fiscais tem como objetivo a dinamização da economia, podendo tomar a forma de redução de matéria coletável, reduções de taxas, incentivos em espaços menos desenvolvidos, geração de emprego, criação de zonas francas ou crédito fiscal ao investimento. Porém, qualquer decisão empresarial tem sempre implicações fiscais. A fiscalidade afecta a poupança (investimento) das empresas (autofinanciamento), na medida em que influencia os fluxos financeiros, reduz os cash-flows disponíveis para aplicação e condiciona as decisões de investimento e de financiamento e, em certos casos, políticas de distribuição de dividendos, pois não incide de forma igual sobre as diversas alternativas de financiamento (leasing, fatoring, crédito bancário, autofinanciamento, business angels, etc).
A estrutura fiscal de um país é determinada pelo seu nível de desenvolvimento e fatores de índole histórica, cultural, social e política. Não existe uma estrutura fiscal óptima. Contudo, os países desenvolvidos têm uma estrutura fiscal baseada em impostos sobre rendimentos, contribuições para a segurança social e impostos gerais sobre o consumo. A actual estrutura fiscal depende essencialmente dos impostos sobre o rendimento, em particular sobre o trabalho dependente, do imposto sobre o valor acrescentado e dos impostos especiais do consumo. A tendência evidencia-nos um gap significativo (20%) nos impostos indiretos e um aumento relativo nos impostos diretos.
O nível de fiscalidade (coeficiente fiscal) é expresso pela relação entre receitas fiscais (IMPOSTOS e Contribuição da SS) e um indicador de rendimento nacional (PIB). Permite medir a parte do rendimento nacional que, através dos impostos, é transferida do sector privado para o setor público. Os factores que condicionam o nível de fiscalidade são a magnitude da base de incidência (de resto, curta), a permeabilidade do sistema, a evasão fiscal e a fraude fiscal, o necessário grau de incentivos fiscais concedidos, e muitas das vezes sem a devida utilização, o grau de monetarização da economia, a dimensão das empresas, acesso ao financiamento, e a maior ou menor intervenção dos poderes públicos na economia. A regra é: mais economia e menos Estado, e aumentar a monitorização e controlo das despesas públicas.
A aptidão de Cabo Verde para consagrar, através do imposto, uma parte dos seus rendimentos ao financiamento das despesas públicas, depende da sua capacidade tributária, o que não é nem de longe suficiente. Alguns factores influenciam o nosso nível de fiscalidade, designadamente a distribuição do rendimento, a escolha da unidade de tributação, montante de deduções/benefícios concedidos, a preferência que se concede aos bens públicos relativamente aos bens privados, o tratamento fiscal que se concede ao consumo ou à poupança/investimento, as limitações legais da progressividade das taxas e dos escalões de rendimentos, a capacidade administrativa e a eficiência no acompanhamento e seguimento dos contribuintes, a estrutura da tributação ou a elasticidade do imposto sobre os rendimentos.
O esforço fiscal é medido na relação entre as receitas fiscais efetivamente cobradas e a sua capacidade tributaria. Se o nível de fiscalidade efectivo for maior do que o nível de fiscalidade potencial (o que não é medido), logo existe um esforço fiscal exigido à população e é tanto maior quanto mais afastados estiverem àqueles indicadores. Torna-se necessário dar a conhecer a nossa contribuição em termos de impostos, e quais impostos.
O sistema fiscal deve ter princípios para atingir essas condições, isto é, máxima neutralidade, equidade e custos mínimos de cobrança. O funcionamento dos impostos deve ser de tal ordem que não favoreça nem prejudique determinados agentes económicos em detrimento de outros. Porém, deve ser facultado, o quanto antes, aos contribuintes os instrumentos de assimilação dessas matérias, designadamente, um glossário fiscal adequado e atualizado.
A distribuição da carga fiscal efetiva (o que se tem efetivamente de pagar, além dos 25%, somam-se a tributação autonoma…) na economia deve estar de acordo com os padrões de equidade aceites pelo consenso das mentes esclarecidas. O espectro dos impostos existentes deve ser bem concebido, de modo a que a cobrança desses tributos proporcione ao Estado um mínimo de custo e o contribuinte tenha o máximo de facilidades e comodidades. O custo da cobrança pode bem ser maior que o liquidado.
Avaliar o passado recente e olhar em frente para o futuro próximo (década) é um exercício natural de fim de ano. Mas quando estiver em causa a economia nacional, também pode ser um exercício necessário e urgente.
Texto originalmente publicado na edição impressa do nº 777 de 19 de Outubro de 2016.