Pela internet (http://www.expressodasilhas.sapo.cv/opiniao/item/52018-no-reino-da-nao-justica) tomei conhecimento de um artigo de opinião da autoria dos advogados Amadeu Oliveira e Rogério Reis, com a participação da Dra. Dionara Anjos, publicado no jornal “Expresso das Ilhas”, intitulado “No Reino da Não-Justiça”, através do qual os referidos advogados teceram duras críticas ao Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ), ao Juiz colocado na Comarca de Ribeira Grande, Dr. Afonso Delgado, e ao Procurador da República colocado na Comarca do Porto Novo, Dr. Nilton Moniz.
Tenho de agradecer ao Expresso das Ilhas a publicação do referido artigo, pois, eu e a minha família somos um dos mais prejudicados pelo mau desempenho dos Magistrados colocados na Comarca de Ribeira Grande de Santo Antão. Muito recentemente, esses Magistrados tiveram a coragem de manter 09 (nove) chefes de família em prisão, ilegal, infundada e abusiva, por um período de tempo superior a 10 (dez) meses, pese embora ser evidente que mantinham esses pobres coitados presos, na cadeia de Ponta do Sol, por mero capricho pessoal e abuso de poder. Desnecessário será referir os enormes e irreversíveis prejuízos, materiais e morais, sofridos por esses cidadãos que, na sua maior parte, sequer tinham dinheiro para pagar um bom advogado que os livrasse das garras desse mal-afamado Juiz Dr. Afonso Delgado.
Como uma simples Cidadã Cabo-verdiana emigrante em Itália, deixei família e alguns poucos interesses económicos para trás. Estando em terra-longe, tenho sentido e sofrido os males resultantes da falta de Justiça em Cabo Verde. Eu e toda a minha família estamos ainda muito afectados e enfraquecidos como consequência da prisão ilegal e abusiva de um filho, um irmão e um sobrinho, mesmo quando não havia prova nenhuma para sustentar tal prisão. Era tão evidente que a prisão era abusiva que nem o Juiz, nem a Procuradoria realizaram diligências de prova que, sendo feitas, conduziriam à imediata libertação dos presos. Infelizmente, mesmo depois de, no julgamento, se ter demonstrado a falta de prova, e dos advogados terem requerido a imediata libertação dos detidos, o Juiz manteve tais cidadãos encarcerados por mais algum tempo, sem nenhuma razão para além do seu prazer pessoal.
Revoltada, tudo fiz para que tais anomalias fossem levadas ao conhecimento do Conselho Superior da Magistratura Judicial e da Procuradoria Geral da República, o que foi feito através de advogados que, voluntariamente e sem nada receberem, aceitaram ajudar as famílias sofredoras.
Foi então que compreendi que, em Cabo Verde, um juiz pode fazer as piores barbaridades que quiser, mesmo contra a lei dos homens e contra os mandamentos da lei de Deus, que nada lhe acontece, a não ser um recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que poderá demorar anos a ser decidido.
Assim, os magistrados prevaricadores sentem-se estimulados a abusar de pessoas do Povo, sem pudor nem temor algum, para depois mandarem as suas vítimas recorrerem ao Supremo Tribunal, sem receio algum de serem responsabilizados pelas suas maldades e atropelos à Lei. Só que, por vezes, um simples recurso poderá implicar uma despesa estimada em 200.000$00 (duzentos contos). Ora, se for o caso de uma pessoa pobre e que, ainda-por-cima, já esteve meses na cadeia sem trabalhar, não é justo um juiz despachar consciente e deliberadamente mal e contra a lei, só para obrigar um pobre coitado a recorrer ao Supremo.
É triste e revoltante que o CSMJ nunca tenha reagido de forma adequada e os processos-crime apresentados contra os magistrados serem para esquecer, devido à excessiva morosidade processual, artificialmente criada e mantida, como estratégia de protecção desses mesmos magistrados prevaricadores.
Assim, independentemente da possibilidade de haver um recurso, sinto-me autorizada a perguntar aos membros desse tal Conselho Superior da Magistratura Judicial se nas funções que a Constituição da República lhes confere não está o dever de averiguar os procedimentos ilegais, os actos abusivos e as condutas desviantes de juízes prevaricadores e abusadores. É que, se o Conselho Superior não possuir tal competência e não cumprir tal dever Constitucional, então mais vale extinguir e acabar logo com esse órgão, pois, sempre seria menos custo para o Estado, que já não teria de pagar salários, senhas de presença e demais benesses a titulares de um órgão pouco útil e nada operacional como tem sido o Conselho Superior da Magistratura.
Basta ver que os advogados autores do referido artigo de opinião não hesitaram em classificar o Conselho Superior da Magistratura Judicial de ser uma Instituição “desleixada e deficiente”, por ter estado, desde há muito, a actuar com “a maior incúria, a maior falta de zelo, a maior irresponsabilidade, e a maior falta de compromisso com a verdade” – Citação.
No meu modesto entender de emigrante, as denúncias contidas no referido artigo de opinião são bastantes para o CSMJ mandar logo instaurar um processo de Inquérito no sentido de se averiguar a veracidade ou não dos factos publicamente denunciados, tanto mais que esses factos foram divulgados por todo o mundo, pela internet, e partilhadas centenas de vezes pelo Facebook.
Escrevo estas linhas com a dor que só uma irmã e uma mãe podem sentir ao ver os seus ente-queridos presos injustificadamente, durante 10 (dez) meses, para só serem libertos quando o Juiz tomou conhecimento do conteúdo da queixa que fora apresentada contra si, tendo mandado libertar todos os presos, em menos de 45 minutos.
É certo que aqueles chefes de família, incluindo o meu irmão e o meu sobrinho, foram libertados, mas, os Magistrados envolvidos nessa barbaridade, nunca foram responsabilizados por tamanha maldade.
Numa situação dessa, estou em crer que Sua Excelência o Sr. Presidente da República de Cabo Verde, Dr. Jorge Carlos Fonseca, sendo um tão valente amante da Constituição da República, não quererá ficar de braços cruzados, assistindo de camarote, ao triste naufrágio do Sistema Judicial que já está bastante descredibilizado e inoperante.
Não sou jurista. Sou uma simples emigrante em Itália. Todavia, sei que o Presidente da República possui o dever moral e a obrigação constitucional de interpelar os membros do Conselho Superior no sentido de cumprirem a função de fiscalização e de disciplina dos Magistrados, pois, a nossa Constituição conferiu ao Presidente da República, o poder e a responsabilidade de indigitar quem será o Presidente do CSMJ, no caso, a Dra. Teresa Évora.
Logicamente, se é o Presidente da República quem tem o poder de indigitar o Presidente do CSMJ, consequentemente, caberá à Sua Excelência o Senhor Presidente da República exigir responsabilização.
Por outro lado, também deverá ser obrigação constitucional dos Deputados Nacionais, mormente os de santo Antão, solicitar informações ao CSMJ sobre esse estado de bandalheira actualmente reinante no Sistema Judicial de Cabo Verde.
Itália, Roma, Março 2017.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 797 de 08 de Março de 2017.