A vocação marítima do bravense recua aos tempos da pesca da baleia, nos meados do século XVIII, com a tradição da construção naval e com a escola de pilotagem. Tudo terá começado com a passagem por Cabo Verde de barcos baleeiros recrutando homens para trabalhar na pesca da baleia.
Nos finais do século XVII, segundo António Carreira (1983), baleeiros americanos e de outras nacionalidades começaram a pesca de cetáceos nos mares dos Açores e das Ilhas de Cabo Verde. As relações com os insulares, entre os quais procuravam auxiliares para as tarefas da pesca, terão aberto aos cabo-verdianos as perspectivas de emigrar para os Estados Unidos.
De 1880 a 1889, uma vaga de naturais da ilha Brava seguiu nos navios de baleia e, a partir da última data, a emigração para os Estados Unidos atingiu as restantes ilhas, com grande entusiasmo e êxito.
O Museu da Baleia da cidade de New Bedford, Massachussetts, nos Estados Unidos, dá conta do envolvimento desses homens durante esse período da pesca da baleia.
Valsa Matilde
A 23 de Agosto de 1943, aquando da despedida dos passageiros e dos tripulantes do veleiro Matilde e da fatídica viagem para a América [ver Expresso das Ilhas n.º 850 de 14 de Março de 2018], Silvestre Pinheiro Faria (Brava, 1924 – 1993) compôs a ‘Valsa Matilde’, poema musicado por José Medina (Brava, 1900 – 1953), um dos maiores compositores da Brava [disponível no Youtube [ https://www.youtube.com/watch?v=9ZDWNMu8OC0 ], numa premonição poética do que viria a acontecer dias depois:
Partem os filhos da Brava,
Dignos irmãos dos de outrora,
Causa que então os levava,
É a mesma que os leva agora.
Nada evita a partida
De quem quer vencer na vida.
Velas ao vento, navio ao largo,
Que triste e amargo momento.
[…]
Mães, esposas, bem amadas,
Não choreis vossos amores,
Não temais nem as lufadas,
Nem das ondas os furores,
Que tem mais força a vontade
Que a alma da tempestade.
………
[…]
E assim vão sulcando o mar
Pensando sempre em voltar.
“Depois que Matilde sumiu entre pesadas nuvens, as procelas iniciam uma grotesca dança nas costas da Ilha. O temido ‘inverno’ do Ciclo das Águas chega demasiadamente cedo e implacável. Para piorar, um ciclone devasta o mar e a terra”.
Memorial Fajã d’Água
De Agosto a Novembro, por causa do vento sul que se fazia sentir durante o tempo das chuvas, o porto da Furna não oferecia condições de segurança aos navios pelo que a alternativa era o porto da Fajã d’ Água. Foi assim que o veleiro Matilde partiu da baía da Fajã d’ Água para a sua última e fatídica viagem rumo aos Estados Unidos.
Em 1993, para assinalar os 50 anos do desaparecimento do veleiro, os emigrantes americanos mandaram construir à entrada dessa povoação da Fajã d’ Água um monumento para honrar os filhos da Brava desaparecidos nessa viagem. Nele estão inscritos por ordem alfabética os nomes dos 53 passageiros e dos tripulantes então desaparecidos.
“Para não esquecer os sacrifícios dos seus emigrantes os bravenses puseram no 50.º aniversário do ‘Matilde’ 1943-1993”.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 852 de 28 de Março de 2018.