Porto Memória: O Ensino Superior do Seminário-Liceu

PorManuel Brito-Semedo,11 fev 2019 6:54

​O ensino superior em Cabo Verde tem a sua génese no Seminário Eclesiástico da Diocese de Cabo Verde, conhecido como Seminário-Liceu de São Nicolau (1866-1917).

Homenagem a Dom José Luís Alves Feijó, Bispo Fundador do Seminário-Liceu, 1866-1867, e ao Cónego António Oliveira Bouças, último Vice-Reitor, 1904-1917

Curso Superior de Estudos Eclesiásticos

Criado para o estado eclesiástico, foi ali formado e ordenado, entre 1866 e 1899, quarenta e nove presbíteros, sendo que 17 eram provenientes de Portugal Continental [1 era da ilha da Madeira], 1 de Bissau e os restantes 31 de Cabo Verde. Dentre estes figuram Nicolau Gomes Ferreira (Santiago, 1874), António Manuel da Costa Teixeira (Santo Antão, 1890), Porfírio Pereira Tavares (Santiago, 1895) e Francisco de Deus Duarte (São Vicente, 1901), para se referir apenas aos mais conhecidos.

O Regulamento Interno do Seminário-Liceu estabelecia que o Curso Superior de Estudos Eclesiásticos tinha a duração de dois anos tendo, em 1876, passado para três anos. De acordo com essa nova estrutura, os estudantes faziam, ao todo, 9 anos de estudo (curso superior de 3 anos e curso de preparatórios/instrução secundária de 6 anos) sem contar com o tempo necessário para a habilitação em instrução primária, dividida em elementar (seis cadeiras) e complementar (oito cadeiras).

Curso de Preparatórios

O Curso de Preparatórios era comum aos alunos que se destinavam tanto à vida civil como à vida eclesiástica, “pois que nos seus estudos preparatórios poderão utilmente aprender os mancebos que, não se destinando ao estado eclesiástico, desejam contudo seguir estudos superiores ou receber uma educação litteraria e scientifica”.

O Curso seguia os programas dos liceus do reino, na parte aplicável, e ministrava uma formação que capacitava os alunos para exercerem actividades ligadas à função pública e privada.

Para além do curso de preparatórios e de ciências eclesiásticas, havia ainda aula de música vocal e instrumental, obrigatório para aqueles que queriam seguir a carreira clerical e facultativa para os que queriam seguir a vida civil.

Professores com Aptidão

Para o Seminário funcionar era necessário haver um corpo de professores creditados e com aptidão para o magistério.

A Lei que criou o Seminário-Liceu estabelecia que os professores deviam ser encontrados entre os capitulares da Catedral de Cabo Verde. Para os Cursos de Preparatórios foram fixados quatro professores e para os Cursos Eclesiásticos cinco. Além destes, haveria outro de música e canto eclesiástico.

O Bispo Dom José Luís Alves Feijó recrutou em Portugal três novos cónegos para serem docentes no Seminário, vindo um deles a ser designado Vice-Reitor.

O Seminário Eclesiástico começou a funcionar com os professores vindos do Reino, além do de cantos e ritos, e dois outros (Latim e Filosofia) que tinham feito parte do Liceu Nacional, no que respeita à parte eclesiástica, e um professor de teologia, que foi para ali transferido em 1869. Para além disso, foi determinado, por Portaria Régia de 24 de Julho de 1867, que um professor da Escola Principal passasse a leccionar no Seminário a aula de instrução primária. Posteriormente, uma Portaria Régia de 2 de Novembro de 1869 viria a determinar que a Escola Principal de Instrução Primária fosse considerada anexa ao Seminário-Liceu.

Elite Crioula com Consciência da Nação

Com uma cultura clássica e humanista, dali viriam a sair poetas e prosadores que “haviam de pôr um marco profundo na vida intelectual cabo-verdiana, despertando e cultivando nela o gosto e o respeito pelas coisas literárias”. Destes, destaca-se José Lopes da Silva (São Nicolau, 1872 – 1962), Juvenal Cabral (Santiago, 1889 – 1951), Pedro Monteiro Cardoso (Fogo, 1890 – 1942), João Lopes (São Nicolau, 1894 – 1979), Teodoro de Oliveira Almada (São Nicolau, 1894 – 1976), Luís Almeida Gominho (São Nicolau, 1895 – 1983), António Aurélio Gonçalves (São Vicente, 1901 – 1984), Pedro Corsino Azevedo (São Nicolau, 1905 – 1942) e Baltasar Lopes da Silva (São Nicolau, 1907 – 1989).

A todo esse conjunto de “elite negro-crioulo, mestiço e branco crioulo”, se deverá ligar a ideia de “consciência da nação”, ela própria em face do “outro”, em nome de uma “realidade-povo” que apenas na segunda metade do século XIX começava a ter contornos definidos e a assumir o princípio activo da homogeneidade.

Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 897 de 6 de Fevereiro de 2019.

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Autoria:Manuel Brito-Semedo,11 fev 2019 6:54

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  11 fev 2019 6:54

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