Demonstrados à saciedade estão o estilo cáustico, os epítetos e outras designações pejorativas para apodar os que têm ideias diferentes; os impropérios e as desconsiderações do outro; as suspeições, dúvidas e acusações não fundamentadas contra aqueles que não pensam segundo os seus guiões.
Senão, vejamos algumas das farpas desferidas contra mim: … as raposas limitam-se a rosnar, e a lançar impropérios ao desbarato. / A impotência gera fantasias. E, claro, desatinos. / Não argumenta. Esperneia. / … limita-se a reproduzir falácias, cacoetes e absurdos. / E perfídia.
A minha prosa é apodada de lengalenga, pura riola, e fingimento. / … “arte” falaciosa de argumentar, em que algumas criaturas, no cume da esperteza saloia, tentam demonstrar … que um triângulo tem, afinal, 4 lados e não 3, ou que 12 + 7 = 20. A Doutora … usa vários desses estratagemas ao mesmo tempo, com o seu caudal de inconsistência e truculência…
Eu havia também mencionado a impressão que deixa nos leitores de se considerar detentor da verdade absoluta e de que o resto do mundo, ou pelo menos todos que consigo não concordam, são ignorantérrimos que não percebem nada de nada.... E que parece crer no dogma da sua infalibilidade pessoal quando fala ex cathedra.
Prova:Se a Doutora MOP tivesse, por exemplo, lido John Milton, teria certamente compreendido o significado da liberdade de pensamento e a expressão na construção de uma sociedade moderna, próspera e desenvolvida. /Se calhar… julga que vivemos, ainda, “no socialismo real”… ou, talvez até, que estamos mentalmente na Idade Média... / Enche cinco colunas inteiras de jornal como quem enche diligentemente chouriços. / Lança mão de artifícios miudinhos, ancorada sempre … num provincianismo bacoco, feito de brejeirice, trocadilhos ocos ... recadinhos e estórias de [sic] carochinha, que fazem a glória das velhas desocupadas.
Gente, como se consegue destilar – isto, sim, é pura destilação, e em concentração bem elevada – essa profusão de insultos gratuitos, esse desprezo pelas produções do semelhante,essa tentativa de deitar abaixo quem simplesmente discordou e chamou a atenção para algo que pensa ser reprovável?
Qual a dimensão da insegurança que leva alguém a tentar achincalhar, diminuir, vilipendiar – sem qualquer base objectiva, até muitas vezes sem lógica – pessoas que nem conhece pessoalmente, mas que mostram discordância ou fazem reparos? Quão baixa deve ser a auto-estima de alguém que para se sentir superior tem de tanto apoucar os outros – não só os que se atrevem a cruzar o seu caminho, mas todos que publicamente expressam opiniões divergentes – como vem fazendo há anos! Autênticos casos de bullying!
Apontei, também,que o articulista se arvora em Deus, que é o único que pode saber as intenções alheias. Demonstração: Ficou furiosa / Tanta raiva e mal-estar causou. /A peça vazia e atabalhoada é o retrato perfeito da alma dessa Senhora. / … uma das características centrais do totalitarismo é a manipulação dos sentimentos e o eclipse da razão. É este, precisamente o jogo favorito da bem-educada MOP. Manipular incautos. / Fingimento. / Perfídia. / Truculência /… alegre destilação “de complexos profundos de uma certa e decadente elite crioula”. O autor dessas linhas supõe conhecer tão bem a minha alma, que até lhe reconhece o retrato perfeito; e os jogos favoritos da minha mente! Tal e qual só Deus!
Contudo, não digere adequadamente o que lê, antes de contra-atacar. No meu escrito mostrei claramente que não era meu objectivo entrar na controvérsia da substituição da Constituição, por não ser jurista. Escrevi em defesa da honra do meu marido; não para rebater argumentos. Resposta: A Doutora Odette Pinheiro não argumenta. Esperneia. Desvia a atenção do essencial. Auto-engana-se [sic]. Encheu cinco colunas inteiras do jornal, como quem enche diligentemente chouriços, e não conseguiu, mesmo assim, rebater uma única passagem do meu texto de reflexão. É obra… Obra seria se eu tivesse conseguido o que manifestei duas vezes não ser meu objectivo, dando de barato a questão da Constituição.
Será simplesmente um erro de leitura, ou algo mais grave? Pois, semelhantemente, não compreendeu ou quis compreender, quando escrevi: “E se não entender que é … um insulto, o que escreveu – então tenho muita pena de si, Senhor Doutor. Precisa rever-se a si mesmo, ver-se ao espelho, descobrir se não falta algo muito importante na sua cultura humanística e geral, na sua formação pessoal – aquelas coisas que são aprendidas a partir do berço e se continua a aprender a vida toda...” A partir do berço – isto é, da infância (metonímia – uso de uma coisa para representar outra, por estarem estreitamente associadas).
A propósito disto, dispara: Fala, longamente, da minha “baixeza”, da minha (suposta) falta de educação, do carácter, da ausência de “berço”… A Doutora Maria Odette Pinheiro quererá dizer que as pessoas desprovidas de “berço” não podem exercer a cidadania, estudar, participar, ter discernimento e defender, enfim, o bem comum? Estarão condenadas a ser cidadãos de segunda…? Procurem no meu artigo e não encontrarão nada disto. Parece que há uma afasia emocional, em que as emoções sobem tão alto que obscurecem a compreensão do que foi dito, toldam a lógica e a racionalidade, lêem o que não está lá, na pressa de disparar o gatilho.
Mas o cúmulo do absurdo, e o que mais me fez rir, é trazer à colação o modo como o meu nome é escrito, com 2 tês – assim exarado no meu registo de nascimento, por originalmente ser um nome francês – para afirmar algo completamente infantil: Cidadania plena só para aqueles, dir-se-ia, cujo nome se escreve com 2 tês! Mesmo descontando o sarcasmo, isto é bem ilustrativo dos curto-circuitos que podem acontecer nas cabeças dos mais inteligentes e eruditos. Ups!
Para terminar, o culto de personalidade e a existência de intocáveis: Admiti que a pessoa que eu defendia, se estivesse viva e perante argumentos convincentes que derrubassem os seus, era Homem para admitir estar errado (caso realmente estivesse). A réplica: Se calhar a ilustre Doutora Odette Pinheiro julga que vivemos, ainda, nalgum país do “socialismo real”, onde há, por definição, culto de personalidade, nomenclaturas com poder divino, super-homens de recorte nietzschiano e respeitinho histérico pelos chefes do regime.
Admitir a possibilidade de erro numa pessoa, não será o oposto do culto de personalidade ou de a considerar intocável? Quando é que a defesa da honra se tornou culto de personalidade? Na verdade, só quem preza a honra, sua e dos demais, percebe quão ofensivo é dizer “tentou iludir a nação”! Os outros não conhecem a diferença entre dizer isto ou que “alguém estava errado”. Este é o cerne da questão, que o articulista não entendeu.
Haveria muito mais para comentar, mas o espaço disponível não me permite fazê-lo. Creio, contudo, ter já estabelecido a falta de credibilidade do que o autor escreve e das interpretações que oferece. Por isso, declaro que não responderei a qualquer escrito futuro, sobre mim, da mesma lavra, remetendo os leitores para este presente artigo. Não interpretem isso como “quem cala, consente”. É que agora entendo por que é que os nossos intelectuais não respondem aos insultos do articulista, aconselhando-me, até, a fazer o mesmo! Dizem que não vale a pena: “É dar demasiada importância ao que ele diz”. De modo que no futuro deixarei que as palavras sejam levadas pelo vento.
O que foi dito de mim em nada beliscou a minha pessoa. Sei quem e o que sou, pela graça de Deus. Sou suficientemente segura para não insultar, mesmo quando tenho de fazer reparos. E prova-se que os meus eram justificados.
Espero que o que ficou aqui demonstrado faça com que a mão vá à consciência: sirva um pouco de espelho, o que eu aconselhara no artigo anterior. Se assim for, valeu a pena. Não há maior investimento que contribuir para a melhoria de qualquer ser humano.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 962 de 6 de Maio de 2020.