Luís Leite: Devemos ser mais ousados e ambiciosos

PorJorge Montezinho,1 jul 2018 7:04

​Até Maio de 1978, operavam em Cabo Verde pequenas representações de seguradoras portuguesas que se encontravam sob a incumbência de gerentes de firmas comerciais. A partir deste ano, o exercício da actividade seguradora e resseguradora passou a ser exclusiva do Estado, tendo sido para o feito criado o Instituto de Seguros e Previdência Social. Este foi o cenário até 1990, quando houve a reforma do quadro institucional da actividade seguradora, favorecendo o aparecimento de companhias de seguros privadas. Um ano depois, foi criado o Instituto de Seguros de Cabo Verde, que tinha como funções o controlo e a supervisão do mercado segurador.

O Instituto de Previdência Social é transformado em sociedade de capitais públicos passando a denominar-se GARANTIA Companhia de Seguros de Cabo verde, SARL. Em 1992,A GARANTIA é transformada em sociedade anónima e em 1998o Decreto-Lei nº 70/98 de 31 de Dezembro autoriza a alienação de parte das acções detidas pelo Estado na Garantia. A Resolução nº 74/98, da mesma data, aprovou a regulamentação do concurso internacional para a aquisição das respectivas acções, bem como a escolha dos parceiros estratégicos para o desenvolvimento das Instituições Financeiras do País. No ano seguinte, e no âmbito do processo de privatização das instituições de crédito e sociedades financeiras com capitais públicos, o Agrupamento constituído pela Caixa Geral de Depósitos e pelo Banco Interatlântico adquire 95% da participação do Estado na Companhia. Em 2012, a GARANTIA obtém a certificação nos termos da norma Internacional NP EN ISO 9001:2008 Gestão Orientada para a Qualidade e para a melhoria contínua do serviço que presta aos clientes. A 30 de Abril, de 2014, a Fidelidade, Companhia de Seguros S.A., adquire 55,8945% do Capital Social da GARANTIA e em Dezembro do mesmo ano os trabalhadores da Companhia adquirem acções ao Estado de Cabo Verde. Fevereiro de 2016, a Companhia apresenta a nova identidade visual da Garantia, um logótipo que nasceu da união da Garantia com a Fidelidade, e que traduz uma marca mais moderna, forte e internacional. Há um ano, a Garantia lançou no mercado nacional o primeiro Seguro de Saúde privado, destinado à população em geral e com uma Rede Privada de Prestadores. O passado do sector, os desafios do presente e as apostas do futuro são os temas principais desta entrevista com Luís Leite, administrador executivo da GARANTIA.

Que balanço pode fazer dos 40 anos do sector segurador em Cabo Verde?

A actividade seguradora evoluiu muito nestes 40 anos, tanto do ponto de vista institucional e regulamentar, apesar de termos só duas seguradoras a operar no mercado, como principalmente no domínio da oferta de serviços e produtos, seja em termos de qualidade, seja na sua diversificação e inovação. A Garantia, por exemplo, oferece mais de 30 seguros nos ramos vida e não vida. Essa evolução, que podemos caracterizar de muito positiva, é evidenciada pelo papel e a função social das seguradoras, cada vez mais vincados na nossa sociedade, ainda que em termos do seu impacto económico, designadamente o contributo do sector no PIB, na ordem dos 3%, quando comparada com outras realidades próximas, aponte no sentido de que temos e devemos ser mais ousados e ambiciosos, não obstante a dimensão exígua do mercado nacional.

Dentro desse contexto, qual tem sido o desenvolvimento institucional e o posicionamento da Garantia no mercado?

A Garantia, enquanto seguradora líder do mercado, de há bastantes anos a esta parte, tem assumido o seu papel e as responsabilidades inerentes a esta condição, procurando levar os seus serviços e produtos aos cabo-verdianos de todas as ilhas e concelhos, através da sua rede comercial, constituída por 14 agências e 5 lojas de mediação exclusiva, e da aposta nas TIC’s, para segmentos específicos como os emigrantes; assegurando uma oferta de seguros diversificada em resposta às necessidades das famílias e empresas; e investindo, de forma contínua e sustentada, na criação das melhores condições laborais para os seus colaboradores. Até porque as organizações são, acima de tudo, as suas gentes!

Em que alicerces assenta a liderança de mercado da Garantia?

Esta liderança é o resultado de um percurso de 26 anos, que se alicerça nas estratégias e opções que foram sendo tomadas ao longo da história pelas diferentes Administrações, que podem ser sintetizadas nos seguintes factores: experiência e qualificação dos quadros da Companhia; posicionamento no mercado derivado do conhecimento profundo do sector; diversificação e qualidade dos serviços e produtos; aposta na inovação e na modernização tecnológica; certificação internacional para a gestão orientada para a Qualidade; e a pertença a Grupos Internacionais de relevo, desde 1999, com a Caixa Geral de Depósitos (CGD), na sequência do processo de privatização e, a partir de 2014, com o Grupo Fidelidade, com os ganhos que isso representa em termos de gestão corporativa.

Que balanço se pode fazer da gestão corporativa no quadro do Grupo Fidelidade (maior acionista)? Não há qualquer diferença de tratamento apesar do facto de Cabo Verde ser um mercado muito mais pequeno do que os em que se encontra o Grupo Fidelidade?

Para nós, seguramente, mas mesmo para o sector segurador nacional e a própria entidade reguladora – o Banco de Cabo Verde (BCV) – atrever-me-ia a dizer que é uma grande mais-valia poder ter a presença de um Grupo com o prestígio da Fidelidade, em Cabo Verde, através da Garantia. Não só pela projecção internacional e credibilidade que isto confere ao mercado, induzindo potenciais investidores a fazerem negócios no país com maior segurança, como fundamentalmente pela convergência que obriga na adopção das melhores práticas de gestão, designadamente em termos normativos e de processos e no desenvolvimento tecnológico e de produtos, que apesar de serem de âmbito corporativo, acabam, necessariamente, por aportar ganhos ao mercado. Se a isso acrescermos o facto de estarmos perante um Grupo, cujo principal accionista é o maior conglomerado privado chinês, a FOSUN, que para além dos investimentos no sector financeiro, tem como outras prioridades as áreas de Saúde e do Lazer, na procura da felicidade das pessoas, o balanço não poderia ser melhor. Respondendo, concretamente, à 2ª parte da questão, diria que o Grupo, sem perder de vista os seus princípios corporativos, respeita e procura adaptar-se às diferentes realidades em que opera – Europa, África, Ásia e América Latina – pelo que nos sentimos parte de uma grande família internacional, no qual se vai aprendendo com a experiência dos outros, independentemente da dimensão de cada um.

Quais são, neste momento, os principais desafios do sector e da Garantia?

Em relação ao sector, há desafios estruturais que precisam ser ultrapassados a começar pela actualização da legislação, em alguns casos muito antiga, mas que está em curso, neste momento, graças ao Banco de Cabo Verde e à intervenção decisiva do Governo, na pessoa do Vice Primeiro-ministro e Ministro das Finanças; a criação de uma cultura de segurança em Cabo Verde e do reconhecimento da importância dos seguros; o combate à iliteracia financeira; o crescimento do peso do sector segurador no PIB, através do alargamento do mercado e da exploração dos grandes riscos, que tendem a ser segurados no estrangeiro; a extensão dos seguros obrigatórios para outros ramos, acompanhado de uma maior fiscalização. No caso específico da Garantia, o grande desafio passa por reforçar a liderança do mercado segurador nacional pela melhoria contínua da sua oferta, por via de uma clara aposta na inovação dos seus serviços e produtos e uma política de maior proximidade aos clientes, por forma a realizar permanentemente a sua missão e visão de ser “a marca de confiança e referência dos cabo-verdianos em todo o mundo e, através do exercício de uma liderança para o desenvolvimento, contribuir para um mundo mais estável e seguro”.

E quais considera os principais riscos? Como se podem evitar esses riscos?

Desde logo, a escala e a dimensão do mercado, já de si reduzida, mas que pode e deve ser alargada com o aproveitamento do desenvolvimento do País e dos grandes investimentos, desde que sejam criados os mecanismos necessários, do ponto de vista legal, para a retenção pelas seguradoras nacionais dos riscos associados, dentro de certos limites, o que não acontece de momento. A forte dependência externa do crescimento da economia nacional, no que concerne à saúde financeira das empresas e do nível de vida dos particulares para a contratação de seguros e, por último, mas não menos importante, a habilidade do Regulador em conseguir acompanhar, com as devidas adaptações à nossa realidade, a inevitável implementação do Solvência II, que veio corporizar um novo paradigma no quadro de regulação e supervisão da actividade seguradora e resseguradora na União Europeia, com exigências que não serão de aplicação fácil sem os necessários ajustamentos à dimensão do sector.

Os cabo-verdianos estão a procurar mais seguros? De que tipo e com que objectivos?

Efectivamente, tem havido uma maior procura de seguros por parte dos cabo-verdianos e das empresas sediadas no País, mas ainda longe do que seria desejável, se consideramos a relevância social da actividade seguradora e a sua importância como mecanismo de protecção e segurança pessoais e dos bens, fonte de previdência e de prevenção, factor de investimentos e crescimento económico ou ainda instrumento de crédito e/ou de estímulo para a poupança. Aliás, os dados são elucidativos, quando apontam no sentido de mais de metade da carteira das seguradoras ser constituída por seguros obrigatórios, automóvel à cabeça, ou que os seguros do ramo vida, que são maioritariamente comercializados em outras latitudes, no nosso mercado não chegam aos 10%. Contudo, estamos esperançosos de que com o trabalho de consciencialização que as seguradoras estão a fazer junto da sociedade – que deve contar com o apoio de outras entidades públicas e privadas, inclusivamente das Universidades – e o desenvolvimento da bancassurance e de outras iniciativas em curso, possa haver um incremento da procura. Refiro-me, mais especificamente, aos seguros de vida associados a créditos bancários, os PPR/E (Planos de Poupança Reforma/Educação) ou, a outro nível, os seguros de incêndio, multirrisco profissional e de responsabilidade civil, como consequência da sua obrigatoriedade para determinadas actividades e/ou do enraizamento da cultura de segurança e dos benefícios da sua contratualização. É o caso do Seguro de Saúde da Garantia, o único existente no mercado.

O seguro de saúde (lançado em 2017) é uma das apostas fortes mais recentes da Garantia. Porquê este produto? Qual tem sido a resposta?

O seguro de saúde resultou de uma profunda análise feita ao mercado e da constatação de que havia espaço e necessidade para oferecer um produto que fosse alternativo e, simultaneamente, complementar às prestações do INPS em matéria de assistência médica. Neste contexto, aproveitando o suporte e a experiência da Multicare – empresa do Grupo Fidelidade, líder do mercado português em seguros de saúde – lançou-se o produto, tendo por base 3 pacotes (Base, Extra e VIP) com coberturas diferenciadas, de modo a poder ser subscrito por vários segmentos da sociedade. Associado a este seguro, uma aposta que se enquadra, igualmente, no nosso pilar de inovação e diversificação de produtos, vem sendo criada uma rede privada de prestadores, que conta neste momento com cerca de 20 prestadores nos principais centros urbanos, entre clínicas e consultórios de diferentes especialidades, para além da possibilidade que confere para a realização de consultas e outros actos médicos no estrangeiro, designadamente em todas as estruturas de saúde de Portugal, públicas e privadas, convencionadas com a Multicare. A resposta está dentro daquilo que é o normal para estes tipos de seguros, principalmente para mercados como o nosso, pelo que nesta fase a sua penetração ainda é incipiente, em termos de contratualização, muito em particular no segmento empresarial/grupo, no qual fomos condicionados pelo timing entre o lançamento do produto e toda a campanha de divulgação feita, no 1º semestre de 2017, e a elaboração e aprovação dos respectivos orçamentos. No entanto, acreditamos que pelos contactos já feitos e pela receptividade que temos encontrado em relação à abrangência das coberturas do referido seguro, até o final de 2018, chegaremos a acordo com uma ou duas grandes empresas e instituições, o que poderá levar a que outras concretizem a sua adesão após interesse já manifestado. Em época de Copa do Mundo, podemos fazer a analogia com o avançado que tarda em marcar, mas que desbloqueado o primeiro, os golos aparecem com naturalidade. Resumindo, diríamos que este primeiro ano tem servido como uma importante experiência e aprendizado em relação ao produto, único no mercado, o que nos tem permitido fazer alguns ajustamentos e estarmos em condições de anunciar algumas novidades, a breve trecho.

Têm adaptado produtos e serviços ao mercado e ao estilo de vida das pessoas? Por exemplo, lançando produtos adaptados a nichos de mercado específicos?

Exactamente. Um dos pilares estratégicos do nosso posicionamento no mercado é a forte aposta na inovação. Fazemo-lo, através de plataformas tecnológicas, como é o caso do Site Institucional, em que facultamos aos nossos clientes a possibilidade de pagamentos online, recebendo de imediato o recibo, ou do Garantia Mobile, um aplicativo que está a ser replicado pelo Grupo Fidelidade em outras paragens e que, além das funcionalidades disponibilizadas no Site, permite igualmente comunicar sinistros e enviar fotografias aos nossos serviços, agilizando todo o processo e o tempo de resposta. Mas também, desenhando e lançando produtos para nichos e necessidades específicas do mercado, como são os casos do seguro automóvel AUTO+, a Vida Protecção Garantida ou os PPR/E, para só citar estes.

Acha que esta poderá ser uma tendência futura do sector?

Se os clientes são a razão de ser de qualquer empresa prestadora de serviços, quem não souber interpretar estas necessidades específicas está condenada ao fracasso, assim como as que não tiverem arte e engenho em facilitar o acesso aos serviços através das novas tecnologias. A Garantia tem procurado percorrer este caminho e, de certa forma, tem estado na vanguarda do mercado nesta matéria, com os vários exemplos já citados.

O que diferencia a Garantia da concorrência?

É uma questão que deveria ser colocada aos cabo-verdianos, mas que pode ser respondida com objectividade, mais do que mera percepção ou opinião pessoais. São factuais as seguintes evidências: a liderança indiscutível do mercado; a marca GARANTIA, galardoada 6 vezes com o selo Morabeza (seguradora de confiança dos cabo-verdianos) e eleita, em 2016, como a melhor seguradora em Cabo Verde, pela Global Banking Finance Review; o comprometimento dos colaboradores com a Companhia e a sua missão; a certificação internacional nos termos da ISO 9001:2015 – Gestão Orientada para a Qualidade; a gestão corporativa no âmbito do Grupo Fidelidade; e, propositadamente deixada para o fim, a política de responsabilidade e consciência social.

Qual a política de responsabilidade social da Garantia?

Aguardava esta questão (risos). A Garantia, dentro das suas possibilidades, é uma das empresas cabo-verdianas que se diferencia, positivamente, em matéria de Responsabilidade Social, internamente dividida entre Patrocínios & Mecenato e o que denominamos de Responsabilidade Social e Ambiental. No primeiro caso, respondemos a pedidos e iniciativas de agentes externos que se enquadram na política de apoios direccionada para as áreas consideradas pilares da nossa actuação: Cultura, Desporto, Educação, Solidariedade Social e Ambiente. No segundo caso, as iniciativas obedecem a inputs internos alicerçados na nossa visão de responsabilidade social e ambiental, enquanto seguradora preocupada com o conceito amplo de Segurança: das pessoas e dos bens, no trabalho, na segurança e prevenção rodoviárias. Conjugando estas duas dimensões e os seus pilares, procuramos marcar presença em grandes eventos culturais e desportivos, cofinanciamos as Mediatecas na Praia e no Mindelo, engajamonos na Luta contra o Alcoolismo, tentamos acudir a algumas necessidades de índole social, a par de outras parcerias com entidades públicas e privadas ou de âmbito corporativo.


Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 865 de 27 de Junho de 2018.

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Autoria:Jorge Montezinho,1 jul 2018 7:04

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  1 jul 2018 20:54

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