Cabo Verde com aumento no número de infectados por VIH

PorChissana Magalhães,29 jul 2018 7:12

​Em relatório divulgado na semana passada em Paris, a UNAIDS – agência das Nações Unidas – alerta para o aumento no número de infecções com HIV em 50 países. Cabo Verde é um deles. O secretário executivo do Comité de Coordenação e Combate ao VIH/SIDA (CCS-SIDA), Artur Correia, diz que esse aumento é apenas o reflexo da melhoria registada nas condições de diagnóstico.

Cabo Verde e a Guiné Equatorial são os dois países de língua oficial portuguesa que se encontram na lista de 50 onde se registaram aumentos entre os 5% a 25% referentes ao número de novos casos de infecções com o vírus VIH (completam a lista Argentina, Austrália, Azerbaijão, Bangladesh, Belize, Benin, Botsuana, Congo, Cote d’Ivoire, Djibouti, Eslovênia, Honduras, Libéria, Malásia, Mali, México, Panamá, Papua, Nova Guiné, Sudão e Tunísia).

Entre os países lusófonos que conseguiram redução no número de novas contaminações estão Portugal (com uma queda de 25% a 50%), Guiné-Bissau e Moçambique (com quedas de 5% a 25%), e Angola e Brasil que obtiveram diminuição de mais ou menos 5% no número de novas infecções com o VIH.

Os números foram divulgados no relatório “Um longo caminho a percorrer – fechando brechas, quebrando barreiras e corrigindo injustiças”, que traz os dados mais recentes no que se refere à resposta mundial ao VIH, com dados consolidados a partir do volume massivo de informação recolhida, analisada e filtrada pela instituição ao longo dos anos, e focam dados de 2010 a 2017 em pessoas acima de 15 anos.

Com a meta de reduzir significativamente a incidência da infecção até 2020 a UNAIDS lançou o alerta de que mais esforços precisam ser empreendidos para o conseguir dentro da janela de tempo ainda disponível.

Para Artur Correia, actual secretário executivo da CCS-Sida, os dados referentes a Cabo Verde “não são um retrocesso, mas sim [resultado de] um grande ganho: a capacidade de diagnosticar”.

“Não são casos novos, mas sim casos que só agora estão a ser detectados graças à evolução do diagnóstico. Portanto, há uma melhoria no processo de diagnóstico o que pensamos ser positivo”, esclarece.

Artur Correia sublinha que a partir de inquéritos realizados periodicamente a CCS-Sida está na posse de dados claros e que dão conta que a epidemia continua concentrada em certas franjas da população, nomeadamente profissionais do sexo, homossexuais e “homens que têm sexo com outros homens” e usuários de drogas.

“Nesses grupos, em finais de 2016 fizemos um estudo e quando comparamos com os dados de 2013 registamos que houve claramente uma descida na prevalência do VIH. Entre os profissionais do sexo o número passou de 7% para 4,9%. Entre os usuários de droga passou de 3,9% para 3,1%. E no que se refere aos homens que fazem sexo com homens desceu de 15% para 7%”.

Conforme faz lembrar, no final deste mês deverão ser divulgados os dados do IDSR III (Inquérito Demográfico e de Saúde Reprodutiva) que deverão actualizar estes e outros dados referentes à população em geral, cujos últimos dados são já de 2005.

Os dados de 2005 apontam que 70% dos casos diagnosticados de VIH encontram-se na ilha de Santiago, com 50% a concentrarem-se na cidade da Praia. Com um padrão de infecções diferente do resto de África, Cabo Verde regista uma maior concentração de infectados entre a população adulta activa: 83% das infecções são entre a população de 25 a 64 anos; 9% entre a população de 15 a 24 anos (essa faixa em que se registou o aumento no número de infecções ou de diagnósticos, conforme a leitura do CCS-SIDA); e apenas 5% de infectados na faixa etária a partir dos 65 anos.

Quanto ao género, as mulheres continuam a ser as mais notificadas embora o número de homens infectados seja 3 vezes maior. A contradição explica-se pelo facto de os homens recorrerem menos aos serviços de saúde e serem maioritariamente diagnosticados quando a doença já se encontra em fase avançada. Ou seja, morrem mais porque procuram os serviços de saúde quando já é tarde.

O CCS-SIDA, na posse desses dados que confirmam a concentração da epidemia entre os grupos de risco, vem apostando desde há alguns anos numa estratégia de proximidade. Através da estratégia de educação de pares foram identificados elementos desses grupos que receberam formação para agirem como pares educadores.

“Esses pares educadores têm um trabalho não só preventivo como também de encaminhamento de eventuais casos que detectem para diagnóstico e tratamento e seguimento. Penso que esta estratégia tem dado resultado porque entre o estudo feito em 2013 e o de 2016 registamos uma descida importante nesse grupo”, diz Artur Correia que regista ainda o acelerar no processo de acesso ao tratamento, ou seja, a melhoria de acesso clínico.

A leitura do documento da agência das Nações Unidas mostra que Cabo Verde tem a maior taxa de cobertura da terapia anti-retroviral na África Ocidental, tanto entre crianças dos 0 aos 14 anos (92%) quanto na população infectada de 15 ou mais anos (74%). A transmissão mãe-criança está também praticamente eliminada graças a esta cobertura de anti-retrovirais que alcança, em 2017, mais de 95% das mulheres grávidas que vivem com o VIH.

A nível mundial, o número de novas infecções baixou 18% nos últimos sete anos. A redução é mais forte na região mais afectada pelo VIH: o Leste e o Sul da África, com uma queda de 30%. Mas em outras partes do mundo, como o Leste europeu e a Ásia Central, a incidência de novos casos dobrou. Já o Médio Oriente e o Norte da África registaram subida de mais de 25% nos últimos 20 anos.

O relatório da UNAIDS chama também atenção para o facto de alguns progressos até aqui obtidos na luta contra o vírus estarem ameaçados pela estagnação de recursos disponibilizados, isto é, os compromissos políticos assumidos não estão a ser financiados.

Neste momento, e até ao dia 27, decorre em Amesterdão (Holanda) a 22ª Conferência sobre a SIDA com um apelo à juventude para “zerar” o número de novas infecções com VIH no mundo. Actualmente, são 36,9 milhões de pessoas que vivem com o VIH.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 869 de 25 de Julho de 2018.

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Autoria:Chissana Magalhães,29 jul 2018 7:12

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  30 jul 2018 10:25

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