Tambra. A marca das mulheres do Norte da Boa Vista

PorChissana Magalhães,21 abr 2019 9:36

​“Tambra” é o nome da marca de produtos resultantes de transformação alimentar e de matérias-primas naturais criada por uma cooperativa de mulheres da região Norte da Boa Vista. Presente nesta edição da feira da Atlantic Music Expo (AME), o colectivo revelou as suas aspirações a novos caminhos que passam pela certificação das suas criações.

Dizem os dados históricos que, há mais de 2100 anos, a Rainha Cleópatra VII do Egipto tinha como um dos seus rituais de beleza o banho com leite de burra. Agora, no século XXI, revistas especializadas elegeram em 2017 o leite deste animal equídeo como o produto sensação na indústria da cosmética pelos seus poderes na atenuação de rugas e hidratação da pele.

Em Cabo Verde, Boa Vista é (a par de Maio) a ilha onde a população de burros é ainda expressiva por isso nada mais natural do que deitar mão ao recurso natural oferecido por estes mamíferos para a manufactura de produtos que resultem em rendimento para as famílias. De facto, “Dunas”, um dos sabonetes do catálogo da marca de produtos naturais “Tambra” é composto de leite de burra, azeite virgem, carité, óleo de côco e óleo de rícino, sendo apresentado como regenerador e reparador para a pele.

A “Tambra” – nome derivado de tâmara, fruto originário do norte de África e abundante na ilha – é a marca de produtos artesanais resultantes da transformação de alimentos e de matérias-primas naturais, criada por uma cooperativa de mulheres da região Norte da Boa Vista: João Galego, Fundo de Figueiras e Cabeça de Tarafes. O colectivo de 15 elementos surgiu o ano passado, integrado no Programa de Desenvolvimento Comunitário, uma das três componentes do Projecto Tartaruga Boa Vista (ver caixa). Até aqui, têm produzido duas linhas de produtos artesanais: os sabonetes e as conservas.

Babosa (aloé vera), cacto (cactus), argila, leite de cabra, tâmaras e o já referido leite de burra são os ingredientes-chave na composição dos dez tipos de sabonetes que fazem o catálogo da marca e que, criteriosamente combinados com ingredientes como óleos essências de amêndoa, canela, menta, rosa mosqueta, e ainda mel de cana, alecrim ou figueira-da-índia, prometem hidratação e regeneração da pele, combate ao acne e outros efeitos sobre peles normais, secas, sensíveis (bebés, por ex.) e mistas.

Quanto às conservas alimentares, a oferta da Tambra inclui chutneys e compotas com tomates, cebolas e tâmaras como principais ingredientes.

“Trabalhamos de perto com os agricultores do Norte que têm tido problemas com os excedentes de produção. Eles fornecem-nos os produtos que não escoam e fazemos a transformação”, conta Maria Margarida Costa, um dos elementos da cooperativa presente no stand da marca na feira promovida pela Câmara Municipal da Praia e inserida na programação do AME.

As mulheres que compõem o grupo foram indicadas por organizações da sociedade civil do Norte da Boa Vista dentre elementos das respectivas comunidades. São mulheres desempregadas ou que têm no projecto uma oportunidade de reforço da sua renda e consequente empoderamento financeiro e não só.

Para arrancar com esta iniciativa, o Projecto Tartaruga investiu numa série de formações às 15 mulheres que formam a Tambra. “A primeira teve como facilitadora Lúcia Cardoso, criadora da marca Badia Natural Cosmetics que orientou um workshop em saboaria artesanal. Seguiram-se Gabriela Bezerra da Silva, da TAMBAKE - mercearia & oficina biológica que facilitou um workshop em transformação agro-alimentar e Carlos Morais, a orientar uma capacitação tanto às mulheres integrantes da cooperativa como a outros membros de organizações de sociedade civil (Olaria do Rabil, Associação de Pescadores e Peixeiras, Associação de Agricultores do Norte,..), e Zuleika Rodrigues com “Boas Práticas de Manipulação de Alimentos”.

Quem nos avançava estas informações, em Janeiro passado, foi Carla Corsino, coordenadora do Projecto Tartaruga. Nessa altura o grupo estava a colher os frutos do sucesso da sua primeira feira – onde a marca foi lançada – e preparava novo estoque de produtos para abastecer lojas da Boa Vista e também da ilha do Sal, já que a procura estava a correr bem.

“A feira correu muito bem. As pessoas gostaram, vendemos bastante. E recebemos muitas encomendas. Não só de várias lojas aqui da ilha mas também da ilha do Sal”, disse ao Expresso das Ilhas Isaurinda Almeida, assistente da coordenação do projecto e um dos elementos de Tambra.

A feira de apresentação da marca e do projecto realizou-se na capital, Sal Rei. Já no início deste mês foi a vez do norte da ilha receber uma mostra dos produtos, com uma feira realizada em Fundo Figueiras. Antes, em Março, o grupo já tinha estado na cidade da Praia para a feira promovida pelo Ministério da Agricultura e Ambiente no âmbito do fórum WASAG.

O empenho em fazer crescer e visibilizar a marca e os produtos que criam é grande e por isso aceitaram o convite da Câmara Municipal da Boa Vista para estarem presentes no stand a representar a ilha no AME, juntamente com outros artesãos e criadores da ilha das dunas.

“Muitas pessoas da ilha têm passado pelo nosso stand mas também turistas e pessoas de outras ilhas. Está a ser muito bom. Queremos que cada vez mais pessoas conheçam a marca”, afirma Maria Margarida Costa.

Entretanto, Isaurinda Almeida avança que o colectivo tem agora como metas a cumprir brevemente a formalização da cooperativa em associação – e respectivo registo burocrático - para que possam então avançar para a certificação dos seus produtos junto de entidades competentes.

“Também queremos estar em condições de melhorar o espaço onde estamos instaladas e onde produzimos e que apresenta algumas carências. Pretendemos ter um espaço maior e onde seja possível ter uma área que permita aumentar a confecção dos produtos, e uma área para venda e degustação”, explica a assistente do projecto que aponta a meta de fazer chegar os produtos aos grandes hotéis da ilha.

Outro passo rumo à sustentabilidade da iniciativa serão novas formações, nomeadamente em Língua Inglesa, de modo a facilitar o contacto com os turistas. Contactos recentes com um parceiro da cooperativa deixaram sinais positivos de que estas formações vão ser realidade dentro em breve.


Projecto Tartaruga Boa Vista

image

O Projecto Tartaruga Boa Vista, financiado pela Fundação MAVA, é implementado pelas três ONG que trabalham na conservação das tartarugas marinhas na ilha da Boa Vista, a saber a Fundação Tartaruga Cabo Verde, a Natura 2000 e a Bios.CV, juntamente com o Ministério da Agricultura e Ambiente. São quatro as principais áreas de actuação do projecto: Educação Ambiental, Desenvolvimento Comunitário, Pesquisa Científica, e Fiscalização e Implementação da Legislação.

“O principal objetivo é o trabalho em prol das comunidades e da preservação dos recursos naturais da Ilha da Boa Vista, com grande ênfase nas tartarugas marinhas”, aponta Carla Corsino, coordenadora do projecto que tem na Polícia Nacional e nas associações comunitárias outros dos seus parceiros.

“Neste cenário de seca nacional e numa tentativa de buscar alternativas sustentáveis e biológicas de agricultura, o Projecto Tartaruga Boa Vista contratou um consultor internacional que veio dar apoio em trabalhos e tecnologias a partir da Agroecologia aos/as agricultores da Ilha e reforço de capacidades das mulheres que trabalham no viveiro do centro de extensão rural”, explica Corsino num resumo do Projecto Tartaruga Boa Vista.

Para além da Tambra, o projecto tem outros programas em curso, como as obras de reabilitação da escola de Fundo das Figueiras que incluem a horta escolar, vedação, e trabalhos de carpintaria. Alguns dos alunos dessa escola que se deslocam diariamente da localidade vizinha de Cabeça de Tarafes receberam do projecto bicicletas para se deslocarem entre as duas localidades.

“O plano de trabalho é para um período de dois anos, já levamos 9 meses no terreno e além das actividades aqui descritas temos trabalhado em várias vertentes”, acrescenta.

Uma dessas vertentes é a pintura de coloridos murais nas diversas localidades da ilha. Outra, que arrancou por estes dias, é a primeira Gincana Ambiental em comemoração ao Dia Mundial da Terra, que se assinala a 22 de Abril.

Tendo como público-alvo alunos do 6º ano do ensino Básico a gincana irá permitir aos participantes, através actividades lúdica-educativas, conhecer espécies emblemáticas existentes na ilha da Boa Vista.

A primeira fase, que se realizou ontem (16), traduziu-se nas respostas a um questionário de múltipla escolha sobre o meio ambiente e espécies emblemáticas, resultando na triagem dos cinco melhores alunos de cada escola da ilha. O prémio para o vencedor será um passeio de barco para visualizar as baleias que por esta época concentram-se nas costas da ilha.

Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 907 de 17 de Abril de 2019.

Concorda? Discorda? Dê-nos a sua opinião. Comente ou partilhe este artigo.

Autoria:Chissana Magalhães,21 abr 2019 9:36

Editado porDulcina Mendes  em  22 abr 2019 7:08

pub.

pub.

pub
pub.

Últimas no site

    Últimas na secção

      Populares na secção

        Populares no site

          pub.