Histórias de paternidade responsável

PorEdisângela Tavares,24 mar 2024 9:58

No espírito do Dia do Pai, o Expresso das Ilhas apresenta relatos inspiradores de pais em Cabo Verde que desafiam as normas sociais e abraçam uma jornada desafiadora da paternidade responsável. De lidar com os altos e baixos da criação dos filhos como pais solteiros até equilibrar a carreira profissional com as responsabilidades parentais, esses homens destacam-se como exemplos de amor, dedicação e compromisso com o bem-estar de suas famílias.

Entre as histórias inspiradoras da paternidade, destaca-se a jornada de Paulo Almeida, um pai singular que abraça sua responsabilidade com total dedicação e amor.

Paulo Almeida partilha a sua história com um sorriso no rosto e brilho nos olhos. Pai de uma menina, ele conta que desde o início assumiu seu papel com um compromisso inabalável.

“Para mim, foi tão bom, claro, com sacrifício, mas é uma sensação de responsabilidade muito gratificante. Poderia fazer várias coisas, poderia deixar a responsabilidade da educação da minha filha para a minha mãe, mas faço questão de ser pai presente e amigo”, diz ele, refletindo sobre sua jornada.

Assumindo a responsabilidade pela criação de sua filha quando ela tinha apenas 4 meses de vida, Paulo não hesitou em mergulhar de cabeça na paternidade. Com o apoio incondicional de seus pais, que foram seus pilares na educação da menina, ele enfrentou os desafios com coragem e determinação. No entanto, Paulo Almeida é rápido em ressaltar que a paternidade solteira não é romantizada por ele. Ele enfatiza que o suporte e a atenção devem ser redobrados. “No nosso relacionamento, busco sempre mostrar que além de pai, posso ser amigo dela”, explica.

Com o avanço das redes sociais, Paulo reconhece os desafios adicionais que surgem na criação de sua filha adolescente. Ele admite que o TikTok, em particular, tem gerado debates entre os dois , destacando que a influência nem sempre é positiva. No entanto, ao invés de impor regras de forma radical, ele prefere acompanhar e instruir, conscientizando-a sobre a natureza ilusória das redes sociais.

“A minha filha hoje é uma adolescente, e é claro que assim como os outros colegas da mesma idade, ela quer seguir tendências. Ao invés de ser um pai radical, procuro acompanhar e instruir, deixando claro que no mundo virtual as pessoas querem que acreditemos na perfeição, quando na verdade é apenas um personagem.”

Com uma mistura de compreensão, apoio e orientação, Paulo Almeida personifica o verdadeiro espírito da paternidade moderna. Como pai de uma adolescente, Paulo ressalta a importância de cultivar relações autênticas e significativas com os filhos, independentemente dos desafios que possam surgir.

Paternidade e carreira

José (nome fictício), residente no interior da ilha de Santiago, é um exemplo de dedicação paterna. Professor e formador de profissão, José encontra-se constantemente dividido entre suas responsabilidades profissionais e o cuidado com os três filhos.

Pai de duas crianças menores de 10 anos e de uma adolescente de 17 anos, José enfrenta os desafios da paternidade com determinação. Ele afirma: “Os desafios são árduos, mas faria tudo novamente, sem hesitação, para proporcionar um ambiente saudável para os meus filhos crescerem.”

A dinâmica familiar de José mudou em 2019, quando assumiu a paternidade solteira das duas crianças mais novas, devido à necessidade da mãe em buscar melhores condições de vida fora do país. Sua filha mais velha já vivia com ele desde os três anos de idade. José compartilha: “Desde então, tenho sido o único responsável pela criação deles.”

Nos fins-de-semana, José dedica-se integralmente ao cuidado dos filhos, desde a rotina de higiene até à organização das tarefas domésticas. Ele enfatiza o apoio fundamental de sua filha mais velha e da sua mãe na orientação da irmã e do irmão mais novos.

«Minha filha mais velha tem sido uma grande aliada na organização e cuidado com os mais novos. Os menores frequentam um ATL ( Atividades de Tempos Livres) depois da escola onde desenvolvem várias actividades. A minha filha de 17 anos ajuda a controlar as roupas, os materiais e qualquer outra necessidade que surja. Às crianças menores de 10 anos, procuro sempre dar tarefas para bem cedo poderem praticar a responsabilidade. Lavam as mochilas das escolas, fazem uma ou outra afazer doméstico, claro, sob a supervisão da filha maior. Apesar de frequentar aulas de explicação, procuro sempre acompanhar os deveres de casa e as actividades em geral”.

A relação de José com os filhos é marcada pela confiança e pela abertura para o diálogo. Ele declara: “Nós não temos tabus. Sempre incentivei os meus filhos a falarem abertamente sobre qualquer assunto. Quero que saibam que podem contar comigo para qualquer coisa. Explico-as que devem ser selectivas e que não precisam ter pressa em pular as etapas. Digo sempre para elas que as minhas escolhas que eu poderia fazer na vida, eu já fiz, e hoje procuro orientá-las para que possam fazer boas escolhas que vão contribuir para o seu desenvolvimento pessoal e para o futuro. Deixo bem claro o quanto as amo e o quão importante são para mim”.

José conta que também tem uma rotina constante como professor formador. Sai cedo, mas quando volta procura saber como foi o dia delas, e muitas vezes ele deixa suas tarefas profissionais para a madrugada.

Quanto ao relacionamento com as mães de suas filhas, José destaca a importância do respeito e da colaboração mútua. Mesmo enfrentando desafios, José encara a paternidade com naturalidade e determinação, procurando acompanhar todas as fases do desenvolvimento das filhas. Parte superior do formulário

“Sei que a minha filha de 17 anos está na fase de descoberta, mas mostrou que tanto ela como eu temos de trabalhar para estarmos preparados para cada fase. Vai chegar a hora de ela ter um namorado e de fazer certas coisas e está tudo bem. Em relação ao relacionamento com as mães das minhas filhas, temos pontos de vista diferentes, temos opiniões diferentes. Já houve situações de discussões acaloradas, mas converso com elas, mostro que mesmo que a mãe esteja a viver longe, ela vai estar sempre presente e que a opinião dela sempre vai ter peso na vida das meninas. Tenho boa relação com as mães das minhas filhas. Apesar de estarem longe, elas contribuem em tudo em relação às meninas”.

Pai aos 18 anos

Zito, de 26 anos, foi pai aos 18 anos, altura em que estava a estudar o último ano do liceu. O jovem conta que, mesmo sentindo muito receio das responsabilidades, manteve-se forte diante dos outros.

“De início tive medo, eu era estudante do liceu e morava ainda com a minha mãe. Então as dificuldades que eram eminentes começaram a me apavorar. Sou órfão de pai, então desde muito cedo fazia biscaites em oficinas para ajudar em casa, mas o meu maior medo era não poder suprir as necessidades da criança”.

image

O jovem conta que inicialmente todos questionavam : o quê que uma criança vai fazer ao ser pai de uma outra criança?

“Por ter sido criado num ambiente dominado por mulheres, já tinha experiência com a minha irmã e a minha sobrinha. Então decidi que tudo faria para provar que seria capaz. Acompanhei todas as consultas do pré-natal. Como já trabalhava numa oficina, comecei a me dedicar mais e a jogar totocaixa. Com o tempo conheci uma empresa que vendia móveis a prestações, eu adquiri alguns e daí mudei o meu quarto para receber a minha filha”.

Determinado a oferecer um ambiente acolhedor para sua filha, Zito investiu em móveis e transformou seu próprio quarto para criar um espaço adequado. Além disso, mesmo enfrentando suas próprias dificuldades, ele apoiou a mãe de sua filha, permitindo que ela fosse morar com ele na casa de sua mãe. No entanto, um ano após o nascimento da criança, sua companheira embarcou em uma jornada para outro país em busca de formação universitária.

“Hoje tenho a guarda compartilhada da minha filha, apesar de morar com a minha mãe. Faço questão de fazer tudo para a minha filha. Eu preparo-a para a escola, faço-lhe penteados, vou à reunião dos pais, faço tudo que uma mãe faz e dedico-me o máximo a ela”.

Conflitos

Zito conta que apesar de considerar que tem hoje uma boa relação com a mãe da sua filha, há questões que causam desentendimentos, mas procura fazer a sua gestão da melhor maneira possível para não afectar a filha.

“Chegou uma certa altura em que a mãe da minha filha queria que a menina fosse viver com ela fora do país e por não ter aceite, aconteceram conflitos, alguns deles na presença da menina. Pensei em desistir do processo de guarda para proteger a minha filha e não a expor com as idas e vindas do tribunal. Quando aconteciam esses conflitos, procurava sempre conversar com a minha filha e explicá-la que não tinha que escolher nenhum lado. Chegou um tempo em que ela comentou com a monitora do jardim que não gostava da sua mãe e que sempre que a vinha a ver era para brigar com ela”.

“Eu como pai procuro conversar sempre, tenho um laço com a minha filha muito forte. É claro que ela sempre soube da existência da sua mãe e sempre se mantiveram em contacto, mas é diferente quando se está presente fisicamente, ser o porto seguro e ser o suporte no dia-a-dia. Eu tive a oportunidade de viajar, mas optei por ficar, optei por ser mais que um simples pai, e não quero reconhecimento por isso. É meu dever, e o meu propósito de vida é ser o melhor pai do mundo para a minha filha”.

Sociólogo

O sociólogo Henrique Varela explica que a família é a primeira e a principal responsável pela educação moral e social do indivíduo e que os pais devem servir de modelo ou referência a ser seguido e devem cultivar sobretudo o amor, porque quem ama, cuida, acompanha, aconselha, corrige e está sempre presente e assume a responsabilidade na plenitude. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1164 de 20 de Março de 2024.

Concorda? Discorda? Dê-nos a sua opinião. Comente ou partilhe este artigo.

Autoria:Edisângela Tavares,24 mar 2024 9:58

Editado porDulcina Mendes  em  25 mar 2024 9:27

pub.

pub.

pub
pub.

Últimas no site

    Últimas na secção

      Populares na secção

        Populares no site

          pub.