Instituições desresponsabilizadas nos casos Monte Tchota e navio Vicente

PorExpresso das Ilhas,7 ago 2016 6:00

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Um total de 26 mortos. Duas tragédias. Dois culpados. No Monte Tchota foram assassinados 8 militares e 3 civis, o único responsável é o soldado Antany Silva. O naufrágio do Vicente fez 15 vítimas, o incriminado exclusivo é o capitão do navio. As instituições passam intactas pelas averiguações.

 

No final de Julho e no início de Agosto foram reveladas as conclusões do inquérito ao massacre de Monte Tchota e do processo-crime instaurado na sequência do naufrágio do navio Vicente. Ambos os documentos afirmam que só há responsáveis individuais – Antany Silva, militar preso no seguimento do homicídio de 8 soldados e três civis – e o comandante do Vicente – uma das 15 vítimas do afundamento ao largo da ilha do Fogo.

A primeira conclusão a ser conhecida, no passado dia 29 de Julho, foi a do inquérito de averiguação feito pelas forças armadas. A comissão, formada por três militares, tinha como missão de apurar eventuais irregularidades no funcionamento do destacamento de Monte Tchota, “que poderiam ter contribuído para a tragédia em causa e possíveis responsabilidades”. Concluiu-se que o ocorrido se deveu “a motivações de foro pessoal” por parte do soldado.

No entanto, a referida comissão não deixou de chamar a atenção para aspectos de procedimentos, principalmente de controlo, que “não foram escrupulosamente cumpridos” e para a necessidade de garantir à instituição militar “mais meios de transporte e de comunicação, assim como garantir por parte destes a melhor gestão e utilização, de forma a assegurar o bom uso, a sustentabilidade e a sua boa operacionalidade”.

 

Monte Tchota, Abril de 2016

Na madrugada de domingo para segunda, o soldado Manuel António Silva Ribeiro, mais conhecido por Antany, matou os 8 militares que completavam o destacamento estacionado na zona das antenas de telecomunicações que cobrem a ilha de Santiago. Na manhã de segunda-feira, o militar assassinou os três técnicos de telecomunicações (dois espanhóis e um cabo-verdiano) que se deslocaram para trabalhos de manutenção num dos radares instalados no local. Depois, fugiu na viatura destes últimos.

Os militares em Monte Tchota ficam aquartelados durante uma semana. Tinham entrado numa quarta-feira e sairiam na seguinte, dia 27. No Sábado, o comandante da 3º Região Militar, Carlos Monteiro, fez uma visita surpresa aos soldados e constatou que nada de anormal se passava. Nenhuma situação anómala foi registada igualmente no domingo, pelo guarda operativo.

Na segunda-feira, por volta das 18h (já depois do crime), o oficial de dia, não conseguiu estabelecer comunicação com Monte Tchota. Não era a primeira vez. Ainda recentemente, devido à humidade, a ligação deixou de funcionar. Em conferência de imprensa o próprio comandante da 3º região militar, Carlos Monteiro, corroborou que às vezes há problemas de comunicação.

Na terça-feira de manhã, 26,uma equipa da CVTelecom chegou a Monte Tchota e deparou-se com o destacamento militar abandonado, sem militares à vista. As Forças Armadas foram avisadas e enviaram uma força para o local que descobriu o cenário macabro: onze vítimas no total: uma degolada, as outras mortas com tiros de uma espingarda automática AKM e de uma pistola Makarov.

Entretanto, Antany Silva já foi ouvido e o processo está praticamente concluído. “Só faltam alguns exames que foram feitos no exterior e também o relatório do exame psicológico e psiquiátrico” a que o suspeito foi submetido, disse o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas (CEMFA), Major-General Anildo  Morais, no mesmo dia em que foi apresentada a conclusão do inquérito.

No dia 1 deste mês ficou também a saber-se que o Ministério Público mandou arquivar o processo-crime instaurado na sequência do afundamento do Navio Vicente depois de considerar o comandante como o autor material e singular de crimes de homicídio negligente. Para a Procuradoria, não existe qualquer outro responsável criminal pelo afundamento do navio.

 

Mar de Cabo Verde, Janeiro 2015

O Vicente zarpou de São Vicente pelas 21h horas do dia 5 de Janeiro de 2015 com destino ao Porto de Vale dos Cavaleiros, Fogo. Teve uma escala no Porto de Palmeira, Sal, onde o navio foi multado por não ter comunicado à autoridade marítima local que saíra com avaria numa máquina.

No percurso entre o Porto de Palmeira e o Porto da Praia, a 7 de Janeiro, houve duas avarias no navio, uma delas provocou a paralisação das máquinas principais e a deriva do barco. O Vicente só saiu no dia 8 de Janeiro para a Ilha do Fogo, devido aos trabalhos de reparação das avarias, com oito passageiros a bordo. Quando partiu do Porto da Praia, o navio tinha um adorno de mais ou menos cinco graus e os embornais de saída de água do navio e as marcas de bordo livre submersos, e 280 toneladas de carga, contra as 203 toneladas fixados como limite máximo.

No Porto de Vale dos Cavaleiros, o Vicente é informado que o navio Ostrea estava no cais e que ia sair de imediato. Por volta das 20h35 horas, iniciou-se a operação que conduziria ao afundamento do navio, o Comandante ordenou ao Segundo Oficial que manobrasse para bombordo. Este alertou o Comandante que seria aconselhável manobrar para estibordo devido ao estado do vento e do mar e por causa do ângulo de adornamento que o navio tinha.

O Imediato confirmou ao Comandante que estibordo seria aconselhável, mas o Comandante não aceitou as sugestões dos outros oficiais de bordo. Reafirmou ao Segundo Oficial para manobrar o navio a bombordo. Após a guinada e face à força do vento e ondulação de 4 a 5 metros de altura o navio virou-se de imediato.

A operação de buscas e salvamento foi coordenada pelo Capitão dos Portos de Barlavento com recurso a meios privados, uma vez que os meios da Guarda Costeira estavam em manutenção.

O Navio Vicente afundou a 8 de Janeiro de 2015 a poucas milhas do Porto de Vale dos Cavaleiros com 26 passageiros a bordo. Onze pessoas foram resgatadas com vida, o corpo de uma das vítimas foi recuperado. Catorze corpos nunca foram encontrados.

 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 766 de 03 de Agosto de 2016.

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Autoria:Expresso das Ilhas,7 ago 2016 6:00

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  8 ago 2016 14:13

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