Em entrevista ao Observador, Abraão Vicente disse que a Guiné Equatorial não é um país que fale português, “não cumpre as regras democráticas, por algum motivo nós aceitámos mas não podemos admitir elementos que estejam eternamente em transição”.
“Temos de ser mais pragmáticos, ou cumpre ou não cumpre”, disse.
As declarações foram feitas este domingo, à margem do festival Literatura em Viagem, em Matosinhos. O governante considerou que falta o debate, porque, segundo diz, a questão é muito mais profunda do que ser a favor ou contra.
“Mas quando percebemos que nitidamente pode não haver alterações…”, disse, lamentando a inércia da organização.
Abraão Vicente, que esteve no início do mês em São Salvador, no Brasil, reunido com os restantes ministros da Cultura da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), onde a situação da Guiné Equatorial não foi discutida, adiantou que se trata de uma posição pessoal e que a decisão pertence aos chefes de Estado.
“É o exemplo de que precisávamos para a própria organização mostrar que está disposta a negociar valores que sempre foram inegociáveis dentro da CPLP”, afirmou.
A CPLP, fundada em 1996, é formada por Portugal, Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste. A integração da Guiné Equatorial não tem sido pacífica. Uma das posições é que a Guiné Equatorial devia abolir a pena de morte “de forma imediata”, sob pena de a sua integração na comunidade ser ilegítima. O país tem ainda de ratificar os estatutos da CPLP e de disseminar, de forma abrangente, o ensino da língua portuguesa no país.
“Ninguém tem um acesso tão profundo à Guiné Equatorial para dizer que não estão a fazer a reforma no ensino da língua portuguesa”, sublinhou.
O ministro defendeu que a CPLP tem de ser um espaço de partilha de bens e produtos culturais, que têm de circular livremente pelos países da comunidade. Por isso, o governante cabo-verdiano quer ainda medidas concretas para que a CPLP deixe de ser uma organização de chefes de Estado e de ministros para ser uma organização de cidadãos.
“Sem isso, não se concretiza a CPLP. “Sinto algum afastamento dos cidadãos dos países em relação à CPLP”, alertou.
A propósito da crise dos refugiados e da ascensão de movimentos nacionalistas como Marine Le Pen em França e o Brexit, Abraão Vicente criticou a passividade do velho continente e considerou que a Europa merece um tempo para repensar as suas instituições supranacionais porque já não representam os seus cidadãos”.
Abraão Vicente foi mais longe e comparou a falta de uma posição forte da CPLP com o processo de adesão da Turquia à União Europeia. “Está num processo de negociação, mas é ela que tem de renunciar, a Europa não toma essa iniciativa. É como o Brexit: vão ter um acordo favorável aos interesses deles. Neste momento a Europa não negoceia, faz cedências.”