A proposta de lei para a segunda alteração ao Código Geral Tributário, que é de 2013, foi aprovada na generalidade com 41 votos a favor, sendo 37 dos deputados dos Movimento para a Democracia (MpD, no poder) e quatro dos parlamentares da União Cabo-verdiana Independente e Democrática (UCID, oposição).
Por outro lado, houve 29 votos contra dos deputados do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição), e nenhuma abstenção a um diploma que carecia de maioria absoluta normal para ser aprovada, conforme explicou o presidente da Assembleia Nacional, Austelino Correia.
A proposta de lei define que “as instituições financeiras e as instituições auxiliares do sistema financeiro” passam a estar “sujeitas a obrigação de comunicação automática relativamente à abertura ou manutenção de contas por contribuintes cuja situação tributária não se encontre regularizada, integrados nas listas a aprovar pela Direcção Nacional das Receitas do Estado”.
“Bem como relativamente a movimentos com origem ou destino em entidades sujeitas a regime de tributação privilegiada, dentro ou fora do país”, lê-se na proposta.
Passa a definir, igualmente, que os sujeitos passivos do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRPS) “são obrigados a mencionar na correspondente declaração de rendimentos a existência e a identificação de contas de depósitos ou de títulos abertas em instituição financeira não residente em território cabo-verdiano ou em sucursal localizada fora do território cabo-verdiano de instituição financeira residente, de que sejam titulares, beneficiários ou que estejam autorizados a movimentar”.
Ao apresentar o diploma aos deputados, na quinta-feira, o vice-primeiro-ministro e ministro das Finanças, Olavo Correia, explicou que esta excepção vai permitir ao país alinhar com as boas práticas e cumprir com acordos internacionais, nomeadamente o FACTA (Foreign Account Tax Compliance Act), um acordo com os Estados Unidos.
Por isso disse que essa alteração vai permitir ao país combater actividades ilícitas, como a fuga, fraude e evasão fiscal, o financiamento do terrorismo e o branqueamento de capital, bem como aumentar a base tributária do país.
“Cabo Verde tem de ser cooperante, alinhado com as melhores práticas e num processo de convergência normativa”, frisou Olavo Correia, lembrando que a regra é o sigilo bancário, mas que a excepção é a derrogação.
E neste caso, a lei aponta que a autorização pode ser dada em três situações, nomeadamente quando se verifique a existência comprovada de dívidas à Administração Fiscal ou à Previdência Social e quando se trate de informações solicitadas nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal a que o Estado cabo-verdiano esteja vinculado.
Também pode acontecer em sede de procedimento administrativo de inspeção tributária, a comunicação de operações suspeitas, remetidas à Direção Nacional de Receitas do Estado, pela Procuradoria-Geral da República e pela Unidade de Informação Financeira (UIF), no âmbito da legislação relativa à prevenção e repressão do branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo.
Para o vice-primeiro-ministro, o Estado precisa cobrar atempadamente os impostos. “Os contribuintes não podem brincar com a administração tributária. O Estado tem de ter elementos para cobrar dívidas, em protecção e defesa da colectividade”, vincou, dizendo que o país não está a inventar nada, mas sim a alinhar e a internalizar as melhores práticas internacionais.
“Daremos um sinal positivo ao mundo e àquele que está a tentar fugir aos impostos e a fazer outras coisas que não é do interesse de Cabo Verde e do mundo”, entendeu ainda Olavo Correia, ao apresentar o diploma perante os deputados.
Durante a discussão, o deputado do MpD Armindo Luz disse que se trata de uma “boa iniciativa”, para criar ordenamento jurídico forte e alinhado com boas práticas internacionais.
“Estamos a dar um passo importante e a alinhar os normativos internos com aquilo que se faz, e bem, a nível internacional”, sustentou o parlamentar.
Por sua vez, o deputado do PAICV Démis Lobo Almeida disse que a derrogação é admissível, tendo em conta que sigilo não é direito absoluto, mas entendeu que deve acontecer num quadro pelo estrito respeito pelos direitos fundamentais das pessoas e protecção dos direitos em conflito.
Neste sentido, considerou que essa autorização para quebra do sigilo bancário seja seguida de um pronunciamento de um magistrado judicial, mediante processo sumaríssimo, para não ser usado de forma indevida.
O deputado e presidente da UCID, João Santos Luís, disse que o seu partido também concorda com o teor do diploma e com o reforço da transparência, o combate à evasão fiscal e o alinhamento com instâncias internacionais, mas também considerou que deve passar “obrigatoriamente” pelas instâncias judiciais.
O Governo cabo-verdiano pretende elevar o peso da cobrança de receitas fiscais para 30% do Produto Interno Bruto (PIB), face aos actuais 20%, afirmou em março passado o vice-primeiro-ministro, garantindo que pode ser feito sem aumentar a incidência.
A Lusa noticiou anteriormente que as receitas do Estado aumentaram 1,8% em 2021, face ao ano anterior, para 44.525 milhões de escudos.
Em 2019, antes da pandemia de covid-19, as receitas totais do Estado tinham crescido para um recorde de 57.389 milhões de escudos, caindo fortemente nos dois anos seguintes.