Encorajada por muitas vozes da população praiense, figuras da sociedade civil e apoiada de forma unânime pelo Partido Africado da Independência de Cabo Verde, Cristina Fontes Lima é o nome escolhido para concorrer à câmara da Praia nas autárquicas de Setembro. Garante liderar um projecto renovado, federador e ambicioso, que quer construir, sobre o que já foi feito, “uma cidade muito melhor”.
Nada intimidada com as vitórias recentes do MpD, como afirmou com um sorriso, Cristina Fontes Lima deu o pontapé de saída da sua candidatura à câmara da Praia num local escolhido estrategicamente: o terraço do restaurante Poeta, com o Djéu de um lado – “onde vai nascer um projecto estruturante” – e o farol Maria Pia do outro – “para indicar o caminho”.
“Uma coisa que não me sinto é intimidada quando enfrento desafios”, disse aos jornalistas, “não tenho nada, por isso não vou perder nada. Mas estou a partir convencida que tenho condições de vitória, ou não me meteria nisso, nem sairia de zonas de conforto. Posso pôr o que aprendi ao serviço de uma Praia. Que pode ser muito melhor”.
Como explicou, é exactamente por não acreditar em soluções únicas que resolveu avançar. “A Praia tem massa crítica para favorecer várias propostas. para que os eleitores possam escolher. Não faz sentido dizer que existe apenas uma proposta. Temos uma visão, temos entusiasticamente projectos e por isso, e como gosto de fazer coisas, disponho-me. Porque penso que posso fazer melhor para além do que já foi feito”.
Se é certo que a câmara da capital é considerada rampa de lançamento para outros voos políticos: Jacinto Santos esteve perto de ser ministro, Felisberto Vieira chegou a ser ministro e Ulisses Correia e Silva é o actual Primeiro-Ministro, também é verdade que Cristina Fontes Lima já não tem certo tipo de ambições. Como sublinhou ao Expresso das Ilhas, “é verdade que há quem veja a Praia nessa perspectiva. Eu estou focada neste projecto, acreditando que posso fazer mais e muito melhor. Mas, a óptica é de garantir que quero fazer o mandato e quero contribuir para a Praia. Porque os voos já os fiz, já fui ministra, já tenho destaque”.
Do outro lado está um partido que venceu tudo o que havia para vencer nas últimas eleições, mas que deu mostras de não ter saído muito unido da pré-selecção de candidatos autárquicos. Enfrentar, ou não, um MpD diminuído é algo que não preocupa Cristina Fontes Lima. Como sublinhou ao Expresso das Ilhas, “eu estou a contar com as minhas forças. Naturalmente, acompanharei com atenção o que for acontecendo, mas conto fundamentalmente com as minhas forças e com as minhas propostas”.
Qual é o projecto de Cristina Fontes para a Praia? A candidata do PAICV não revelou pormenores, mas apontou pistas. Uma Praia com mais qualidade de vida, geradora de riqueza, atractiva para viver e trabalhar. Uma Praia com mais inclusão social, mais ordenada e com mais integração. Uma Praia inovadora e empreendedora. Mais bonita e segura. Uma Praia cada vez mais à altura de um Cabo Verde moderno e competitivo.
Em que se traduzem estes objectivos? “Defendo e acredito numa Praia com um caminho a longo prazo bem planeado e definido”, disse Cristina Fontes Lima no discurso de lançamento da sua candidatura, “e sobretudo uma Praia inclusiva onde todos podem, e devem, ser felizes”.
Uma visão e um projecto para a Praia do futuro, é outra das garantias que deixou. “Estão ao virar da esquina impactos enormes de obras e actividades estruturantes já lançadas que trarão à Praia milhares de turistas e poderão catapultar negócios e desenvolvimento para gerar mais emprego e rendimento para os praienses. O projecto para o ilhéu de Santa Maria e para a Gamboa, os hotéis de grande capacidade a construir, as perspectivas do desenvolvimento de um parque tecnológico, a expansão do porto e do aeroporto, exigem uma gestão planificada e sustentada da Praia. Não podemos pensar projecto a projecto e sobretudo não vamos ficar por esses projectos, uma vez que queremos e vamos ter uma forte intervenção no desenvolvimento económico do município em articulação com o governo”.
Cristina Fontes Lima defende uma gestão estratégica “eficiente e criteriosa”, muito para além de projectos “úteis, mas desgarrados”, que faça acontecer “de imediato” um efectivo ordenamento do território. “Também preconizamos planos de desenvolvimento económico local das grandes zonas urbanas a norte, centro, sul, este e oeste, e no seio dessas zonas urbanas de cada bairro, com destaque para os que têm menos consolidação e coesão urbana, incluindo as zonas periurbanas e rurais”.
Mais tarde, explicou melhor esta ideia aos jornalistas. “Temos de conseguir aproveitar as oportunidades para termos mais emprego, mais rendimento. Para isso é preciso integrar a Praia, para que todos beneficiem desse desenvolvimento. Se tivermos um norte que não tem ainda coesão urbana, que não tem inclusão social, vamos ter Praia a várias velocidades e não teremos o ambiente favorecedor do desenvolvimento”.
O objectivo, sublinhou, é uma planificação que permita gerir da base para o topo. “Termos gestores de bairro, inclusive o próprio presidente da câmara tem, de forma descentralizada, gabinetes e presença nesses bairros que precisam de mais inclusão. Só assim teremos um tecido social atractivo e que torne a capital ainda mais competitiva. Não há muito trabalho de gestão nos bairros: a autoridade, a fiscalização, não podemos falar apenas em grandes e bonitos projectos – estamos todos de acordo com isso – mas onde está a perspectiva de ordenamento de território, de desenvolvimento municipal? A ideia é termos gestores com os quais se contratualizem cartas de missão: o que é preciso fazer bairro a bairro, zona urbana a zona urbana, fazer o mapeamento dos problemas. Dou os exemplos concretos da segurança e da saúde: não há segurança e saúde apenas com a intervenção do governo, se não houver uma intervenção da câmara no Fonton, para eliminar os poços, não terminaremos jamais com os mosquitos e continuaremos a ter zika e paludismo. Na área da segurança, polícia sim senhora, mas e o trabalho com a família, com a comunidade, onde está a inclusão social, o mapeamento dos riscos para antecipar? Sabemos, por exemplo, que facadas e homicídios acontecem à porta dos bailes quando terminam. Eu ainda não vi esta abordagem e acredito nela, por isso é que estou a apresentar uma ideia diferente para a Praia”.
Figuras do partido fora da apresentação
Antero Veiga, que chegou a ser apontado como possível candidato autárquico, e Fernando Moeda, candidato nas últimas autárquicas, foram as únicas figuras de peso do partido presentes na apresentação e não passou despercebida a ausência da responsável máxima Janira Hopffer Almada. “A presidente do partido não esteve em nenhuma apresentação, mas foi a própria comissão politica nacional que aprovou o meu nome”, explicou Cristina Fontes Lima.
Há aqui ainda resquícios das eleições internas de Dezembro do ano passado? “Nunca os problemas e as divisões são insanáveis, não podem ser. Há diferenças pontuais. Naturalmente que as pessoas depois retiram as conclusões e juntam-se por boas causas. Acho que neste momento tenho claramente os militantes e um movimento da sociedade civil que acha que deve haver uma alternativa e que devemos apresentar ideias e projectos diferentes para que o eleitorado escolha”.
“Vão ver que todos estarão comigo na campanha. Vai ser muito bonito de ver”, disse ainda Cristina Fontes Lima.
Nunca uma mulher dirigiu a câmara municipal da Praia, a candidata do PAICV acredita que poderá ser desta vez. “Se o facto de ser mulher puder ajudar, melhor ainda, mas acho que as pessoas conhecem-me por um registo de trabalho”
Cristina Fontes Lima nasceu em 1958 na Praia, filha de pai de Santa Catarina e mãe de São Vicente, avós paternos do Fogo e avós maternos de São Nicolau.
Viveu a adolescência em Angola, para onde os pais foram trabalhar no final dos anos 70, onde despertou para a política.
Em 1975, quando termina o ensino secundário, recebe como prenda dos pais uma viagem a Cabo Verde, onde assiste, no dia 5 de Julho, no Estádio da Várzea, ao hastear da bandeira nacional. Decide, nessa altura, que voltaria para Cabo Verde.
Concluído o ensino secundário, seguiu estudos superiores, em Direito em Portugal, onde participou nas lutas e movimentos estudantis do pós 25 de Abril.
Regressa a Cabo Verde nos inícios de oitenta, integra-se na Função Pública, onde fez carreira como jurista e dirigente no Ministério dos Negócios Estrangeiros. Entra nas fileiras do PAICV em 1984, como militante de base, e mais tarde torna-se dirigente do Sector Urbano da Praia.
Com a abertura política, participa no processo de transição democrática dos anos 90 e é a primeira mulher a entrar na Comissão Política do PAICV, em 1991. Foi porta-voz do partido nas primeiras eleições multipartidárias e deputada da Nação pela lista do PAICV.
Em 1994, ausenta-se do país para fazer o mestrado em Administração Publica nos Estados Unidos da América e em 1996 junta-se ao marido, que já se encontra no Togo desde 1992, a trabalhar na CEDEAO.
Em 2001 é convidada, pelo então Presidente do Partido, José Maria Neves, para integrar o seu primeiro governo, assumindo pastas como a da Justiça, da Defesa Nacional, da Reforma do Estado. No último executivo, Cristina Fontes Lima foi Ministra-adjunta e da Saúde e substituta do Primeiro-ministro.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 761 de 29 de Junho de 2016.