Chama-se “Funanight”, entre outras razões, porque é um disco de música “tradicional” que afinal se poderá ouvir nas discotecas. E porque permite um trocadilho engraçado Fú (doido) na Night (noite). Mas o 5.º álbum a solo de Mário Lúcio, que nos chega este mês, tem também este título porque é uma homenagem ao género e aos seus pioneiros e inovadores.
De Mário Lúcio, a solo, já tínhamos “Mar e Luz” (2004), “Ao Vivo e Aos Outros” (2006), “Badyo” (2008) e “Kreol” (2010). Antes, com a banda Simentera, plantou e colheu “Raiz” (1995), “Barro e Voz” (1997), “Simentera” (1999) e “Tr’aditional”(2002).
O regresso, sete anos depois, traz uma revisitação histórica deste património musical nacional que é o género forte de Santiago, onde nasceu no século XIX. Uma recolha das variações e mutações que o funaná foi ganhando ao longo dos tempos e que resulta de uma aturada pesquisa ao género levada a cabo pelo músico ao longo da sua existência.
“Este disco é a minha memória do Funaná, o meu percurso, desde a minha infância no Tarrafal, até ao bairro de Achada Mato, onde hoje moro, um autêntico laboratório dessa música”, escreve o músico e compositor num texto em que desvenda o seu novo trabalho, gravado entre o Brasil, a África do Sul, Cuba e outras tantas paragens.
Diz de “Funanight” que é um disco sobre memórias do funaná. As memórias pessoais, como a sua aprendizagem do acordeão, ainda criança no seu Tarrafal natal, e as memórias que a história imprimou ao colectivo, como a revolução da adaptação do funaná aos instrumentos electrónicos, em 1978. Reminiscências onde se destacam as figuras de Codé di Dona, Txóta Suari, Bitóri Nha Bibinha, Sema Lópi, os Bulimundo e os Finaçon, até aos mais actuais Orlando Pantera e Ferro Gaita.
“Quando o mundo se des- velou para mim, fiquei surpreso e feliz ao perceber o quanto o funaná partilhava com o reggae e o ska, com seus baixos lânguidos e longos, com as suas guitarras de efeito slap back dobrando a linha do baixo. Senti as similitudes do funaná com os espíritos do poprock e do jazz, compreendido e exteriorizado por tais grupos, na modernidade das guitarras, substituindo o acordeão, e nos espaços de improvisos, para a espontaneidade”, diz o texto assinado por Mário Lúcio.
Nos 16 temas que compõem o CD, há funaná lento e rapicado, electrónico e “cru”, só a ferro e gaita, há cótxi pó e há ainda funaná que se mescla com forró, com raggae e até heavy metal, num casamento com estes e outros ritmos do mundo.
O tema cartão-de-visita do álbum já se ouve nas rádios. Um três-em-um que, com diferentes nomes, apresenta-se em diversas misturas e interpretações. Abre o disco à capella com o nome “Onti”, e fecha-o em toada disco remix com o título “oxi”. E a meio do CD chama-se “Tema de Minis Funaná”. O vídeo do single chega já a seguir.
Com data já marcada, o primeiro encontro ao vivo de “Funanight” com o público: 24 de Março, no Auditório Nacional Jorge Barbosa. Uns dias antes, chega o disco.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 797 de 08 de Março de 2017.