Nos últimos tempos aumentava a frequência dos desabafos quanto à inexistência de uma homenagem oficial ao poeta e escritor falecido em 2007, aos 70 anos. Mas porque homenagens podem também partir da sociedade civil, a editora Rosa de Porcelana fez a vontade ao grupo que assim vinha se manifestando e prepara para o próximo dia 01 de Setembro um evento de homenagem ao também médico e professor.
Há seis anos, numa iniciativa do músico Vasco Martins e do artista plástico Tchalê Figueira, foi colocada uma placa a identificar a casa onde nasceu o poeta e cientista, em Mindelo.
Desta vez o programa é mais vasto e inclui performances poéticas, testemunhos de amigos e familiares, uma palestra sobre a vida e obra do homenageado e discurso do Presidente da República, convidado para encerrar o acto.
O investigador Manuel Brito-Semedo, que irá proferir a palestra sobre o homenageado, escreve no seu blogue Esquina do Tempo o percurso biográfico e bibliográfico de João Varela, nascido em Mindelo a 07 de Junho de 1937. Nessa mesma cidade faleceu a 07 de Agosto de 2007, depois de cerca de 42 anos a viver fora do país, sobretudo na Bélgica onde fez o seu doutoramento na Universidade de Antuérpia e desenvolveu a sua investigação cientifica em neurociência tendo, entre outros feitos, identificado uma síndrome que acabou baptizada com o seu nome. O cientista foi também professor de Citologia e Fisiologia no Instituto Superior de Engenharia e Ciências do Mar (ISECMAR), em São Vicente.
Á semelhança do poeta português Fernando Pessoa, João Manuel Varela viu surgir três heterónimos, cada um com as suas características autorais: João Vário, o mais marcante, terá nascido em 1959 e desenvolvido uma poesia de ontologia; Tomóteo Tio Tiofe, que surgiu em 1961, trazia uma poesia mais cabo-verdiana; e por fim já na década de 80 chegava G. T. Didial, que introduziu uma ficção tida por filosófica e metafísica.
“Escrevo assim porque não posso escrever doutra maneira. A estrutura da minha inteligência, da minha memória e da minha sensibilidade […] fazem-me uma leitura do mundo e de mim que não é simples” escreveu certa vez sobre a sua própria escrita, através da pena do heterónimo T. T. Tiofe.
Este é o autor de d’”Os Livros de Notcha”. Os dois volumes poéticos foram publicados com intervalo de mais de 25 anos (o primeiro em 1975, o segundo em 2001) e aguarda-se a publicação de um terceiro volume.
“Exemplos”, assinados por João Vário, multiplica-se até aqui, em 9 livros. Em 2000 foram reunidos num único volume, estando por publicar os livros 10 (“European Example2), 11 (“American Example”) e 12 (“Exemplo Cheio”).
Já a G. T. Didial coube a autoria de “O Estado Impenitente da Fragilidade” (1989) e “Contos de Macaronésia” (vol. I, 1992; vol. II, 1999).
Caso singular na literatura cabo-verdiana, por já à época afastar-se da cabo-verdianidade e telurismo típicos da claridade e também indiferente à temática da luta anti-colonial, são vários os intelectuais a considerarem ter sido João Varela e a sua obra discriminados e ostracizados.