O autor foi buscar o título do livro ao nome da primeira morna que dedicou à sua ilha São Nicolau, quando era ainda estudante de direito em Portugal, obra simbolicamente datada do ano em que a morna foi declarada património cultural da humanidade.
“Como é praticamente a primeira morna e como é também uma relação especial minha com a minha ilha, eu entendi que era suficientemente justificativo do título”.
Miquinha que compõe também em outros géneros musicais, como a coladeira e marchas para Carnaval, optou por fazer um registo só de mornas, como sua forma pessoal de contribuir para a candidatura da morna a património da humanidade, no ano de 2019, como o próprio revelou ao Expresso das Ilhas. Entretanto, o livro que devia ser publicado no ano passado, por motivos alheios à vontade do autor e da sua editora, só agora vai ser lançado.
“Perdoem-me esta imodéstia, mas eu acho que esse reconhecimento da morna é um trabalho de várias gerações de cabo-verdianos e de várias gerações de músicos e compositores e que nós todos devíamos pôr a nossa pedrinha. Eu fiquei contente e acho que todos ficaram contentes, porque é o reconhecimento da alma cabo-verdiana expressa na nossa morna. Daí a ideia dessa colectânea”.
O livro, além das letras, incorpora partituras de todas as dezanove mornas e traz uma agradável novidade que são os acordes para violão.
Foi elaborado em parceria com o compositor, pianista, professor e orquestrador Humberto Ramos que vive em Portugal desde os anos de 1990. “Aliás, ele é que me desafiou, oferecendo-se para escrever as partituras. Devo dizer que eu tinha algumas partituras escritas anteriormente pelo Jotamont, pelo falecido Luís Morais e pelo Morgadinho, mas estavam dispersas e Humberto Ramos acabou por fazer uma coisa uniforme, que é o que está no livro”.
As dezanove mornas agora compiladas em livro abordam vários temas com destaque para a sua ilha, São Nicolau “o meu país, pessoas das minhas relações, como a minha mãe, o mar que é um tema presente, a amizade, os amigos, o amor e a paixão”.
A obra, como nos dá conta o autor, tem também uma preocupação didáctica.”Da minha parte, eu acho que nós devemos começar a ter essa preocupação de registar as palavras e as melodias para que não haja depois deturpações. Do ponto de vista do Humberto [Ramos], ele quer que este caderno sirva aos estudantes de música de uma forma geral e particularmente aos aprendizes de violão. E é por isso que, para além das partituras que acompanham as mornas, no fim vem uma separata com os acordes para violão”.
A apresentação da obra estará a cargo dos músicos Zeca Couto e Jotacê. Segue-se uma demostração musical com o autor a ser acompanhado por um grupo amigos.
Amílcar Fernandes Spencer Lopes nasceu na Vila da Ribeira Brava. Fez os estudos secundários, em Mindelo, e universitários, em Lisboa, cidades, onde, como escreve nas notas biográficas, se relacionou com quase todos os grandes nomes da música nacional, de então.
Não obstante, considera-se um “tocador de serenata” e como já não se fazem serenatas, diz, ficou musicalmente “desocupado”.
Em Lisboa, pertenceu ao conjunto “Quês Moce” com o qual gravou um LP com quatro composições suas. No Mindelo, integrou o conjunto “Diapasão”, um dos grupos selecionados, a nível nacional, para participar na abertura do Parque 5 de Julho, na Praia, por ocasião das comemorações do Xº Aniversário da Independência Nacional.
Amílcar Spencer Lopes é autor da letra do Hino Nacional e tem composto vários temas em parceria com Paulino Vieira, Dany Silva, Humberto Évora e Nhelas Spencer.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 954 de 11 de Março de 2020.