Neuza, em pouco tempo, tanta música e um mundo traçado pelo destino

PorPaulo Lobo Linhares,20 nov 2021 8:22

Turbilhão de produção sem perda de qualidade, talvez seja a frase que realmente mais traduz Neuza nos últimos meses.

Ainda não tinha descansado do sucesso que tinha feito com o dueto “conbersu ku distinu” com o jovem Mureno, Neuza já pensava em futuros projetos e duetos – na verdade os duetos marcam intensa presença da carreira da Neuza, talvez pelo sentido que eles representam – a partilha – característica fundamental da música, e como à frente veremos, também da própria Neuza, que se rege pelo coração.

Conforme dizia, no rescaldo de “conbersu ku distinu” a artista é selecionada para WOMEX – a maior feira de música do mundo. Onde fez um dos showscases do Womex21.

Adiou assim os lançamentos dos singles. Lança agora este “Margos di bida” e é convidada para participar num dueto com outra voz que muito admiro pela diferença e alegria que incute quando canta – Mário Marta. Grava “Pé di Campo” onde explode com o seu “kriolu di Fogo”, para três dias depois estrear então “Magos di bida”.

Vi-a no palco da WOMEX. Na verdade, a expressão facial de Neuza traduz a maioria das músicas que canta e compõe. Normalmente estórias de vida, ora brincalhonas, mas na sua maioria, de quem luta com adversidades, mas que acaba por ultrapassá-las pela força interior que traz consigo. O resultado final dessa vitória sobre as tais adversidades que são passadas para o papel nas suas letras, são espelhadas no seu sorriso, que começa nos olhos.

Não teve vida fácil. Lembra-se de ouvir a mãe a cantar em bares. Ouvia as músicas que definiu emocionalmente como uma melodia “sabi” mas de tristeza e vazio, que a fazia viajar para um tempo que ela desconhecia, um tipo de tempo ausente.

Entretanto, perde a mãe cedo e, apesar de “culpar a música” pela partida da mãe, ao mesmo tempo a facilidade de ser líder – desde falar para a classe escolar, com o público – era visível. Começa a cantar e um dia num bar de um restaurante alguém a viu e pediu-lhe que cantasse mais uma música, mas do Fogo. A pessoa gostou. Chamava-se José da Silva – o caminho de Neuza estava traçado, ora bem, o “Destino”.

E Neuza começa a galgar palcos. A energia que consegue passar com a sua presença em palco adivinha-se facilmente uma frontman que cativa. Atrevia-me, inclusive, a dizer que Neuza é assim na vida , no se dia-a-dia – tem uma forte veia humorística que também é de certa forma passada ao público. Na verdade, quando a “flor di bila” está em palco a alegria e a emoção melancólica misturam-se e o resultado é artisticamente muito forte.

Em “Margos di bida” numa produção da label com quem mais trabalhou - a Harmonia- também são personagens o destino, as pedras do caminho, mas a vitória acaba por acontecer pela luta e pela bênção da proteção. Na verdade, é sempre bom as bênçãos por perto.

Questionada sobre o que é o destino que tanto canta nos seus temas, após ter pensado diz ser praticamente o exemplo da vida dela, onde muita coisa que aconteceu, teria de acontecer para que assim se tornasse mais forte e nunca perder o que o tal “destino” lhe punha no caminho para aprendizagem.

A voz de Neuza é especial, pela dicção – clara e com tempos certos. Percorre ambientes musicais que vão da “Kizomba” a Talaia-Baxu mas sempre absolutamente dominadas pelo tradicional. Passeia pela morna, koladera e pelo Talaia-Baxu com a mesma facilidade. Talvez exactamente por amar o que faz – cantar.

Nos palcos é igual. Assim como está à vontade em festivais mais descontraídos do nosso Cabo Verde, também conquista plateias como fez na WOMEX21 este ano no Porto. Já participou em vários mercados da música com José da Silva, mas a WOMEX foi sempre o sonho agora concretizado. Mostrou-se ao mundo e mostrou Cabo Verde. Não esperava que acontecesse e, atribuiu o facto ao tal “destino”.

Seria impossível não terminar o artigo sem falar da parte de líder associativa e de imensas associações sociais, desde sempre. Actualmente cuida da Associação Isilda – nome da mãe que perdeu aos 6 anos com câncer – e que se dedica a crianças órfãs que perderem os pais por causa da referida doença.

Neuza já era grande, Neuza é grande, Neuza vai ser certamente grande. Precisamos de mais Neusas.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1042 de 17 de Novembro de 2021. 

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Autoria:Paulo Lobo Linhares,20 nov 2021 8:22

Editado pormaria Fortes  em  21 nov 2021 8:36

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